Michele Almeida, de 45 anos, foi esfaqueada e encontrada morta na última sexta-feira (29) às margens da avenida Tereza Cristina no bairro Vila São Paulo, em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte. Apesar da perda, a morte por si só não foi o único fator que causou indignação da família e de amigos.

Segundo o irmão da vítima, Marcone Almeida, de 45 anos, quando a família começou a procurá-la, já havia três dias de desaparecimento. "Eu fiquei sabendo pela minha mãe que ela havia sumido na quinta, mas só no domingo que ela disse. Então, eu e o meu irmão começamos a procurá-la. Ele ficou com BH, e eu, Contagem", disse.

"Meu irmão, então, foi ao IML, e lá ele descobriu que havia um corpo sem identificação com as mesmas características da Michele. Foi feito todo o trâmite e foi reconhecido o corpo, isso no domingo. Só, que como era um corpo de homem e os documentos de mulher, teve muita burocracia para liberar. Tiveram até que fazer exame de digital", contou o técnico em fibra ótica.

Michele morava no bairro Vila Pinho, na região do Barreiro, em Belo Horizonte. Conforme relatos de pessoas próximas à vítima, ela trabalhava como garota de programa em algumas noites.

A vereadora da capital Duda Salabert (PDT), que também é uma mulher trans, postou nas redes sociais sua indignação com o caso. Segundo ela, o episódio deve ser considerado como transfobia.

"Organizaremos uma reunião com o Ministério Público, Polícia Civil e IML para que episódios transfóbicos não se repitam. Nós transexuais temos que ter sossego e respeito, pelo menos, após morte", afirmou.

Em nota, a Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) informou que o corpo de Michele deu entrada no Instituto Médico Legal Dr. André Roquete (IMLAR), na sexta-feira, sem identificação. "Após a necropsia e o reconhecimento pelos familiares, a única pendência para a liberação do corpo seria a apresentação de um documento original e legível de identificação da vítima", disse.

"A PCMG procura promover a liberação de corpos para os familiares com a maior agilidade possível e se solidariza com os familiares da vítima. Todavia, é necessário seguir os trâmites administrativos legalmente impostos evitando problemas com os procedimentos cartoriais e funerários", completou.

O corpo da mulher foi liberado ainda nessa segunda-feira (1). Ela foi sepultada nesta terça-feira (2) no cemitério da Paz, no bairro Alto Caiçaras, região Noroeste de Belo Horizonte.

IML alega demora por parte da família

Em resposta aos questionamentos da família e da reportagem, Thales Bittencourt de Barcelos, médico legista e superintendente de polícia técnico legista do IML, afirma que não houve discriminação no ocorrido, e diz que "a maior parte do tempo gosto foi aguardando o familiar levar o documento" original da vítima. 

De acordo com ele, o corpo de Michelle chegou ao instituto às 17h55 do último 29 de janeiro, sem identificação ou documentação.

Foi feira a necropsia e impressões digitais da mulher foram coletadas, alega. O irmão de Michelle, identificado pelo superintendente como Alexandre, foi ao IML "na tarde do dia 31 de janeiro".

"Ele fez o reconhecimento do corpo, como familiar, e apresentou, no celular, uma foto da certidão de nascimento da Michelle, que tem o nome oficializado, Michelle Almeida. Foi informado para o irmão dela que ele deveria levar um documento original, e não poderia ser apresentado um documento de celular", narra Barcelos.

No dia seguinte, de acordo com ele, o IML tentou contato com Alexandre para que ele levasse a documentação até o instituto. Às 11h30 do primeiro de janeiro, o homem entregou a documentação original de Michelle, e, conforme o superintendente, só retornou ao local às 8h19 do dia seguinte. 

"Toda essa questão, não tem a ver com ser ou não ser transexual. A questão é que a liberação do corpo precisa ser feita com documentação original da vítima. Esse documento que a família leva serve para preencher uma declaração de óbito, e, no cartório, é emitida a certidão, que permite o enterro. Não tem diferença alguma se a pessoa é, ou não, é transsexual. Não existe tratamento diferenciado. É exatamente o mesmo. Para a segurança das famílias, temos que fazer a conferêrncia", conclui.