Aos 49 anos e com uma carreira consolidada na área de fonoaudiologia, Adriano Neves não pensa em parar de trabalhar tão cedo. “O negócio é estar na ativa”, diz o empresário de Belo Horizonte. Pensando nisso, ele decidiu turbinar a carreira e voltou à sala de aula em 2018 para encarar o desafio de um novo curso superior em uma faculdade de direito. Como ele, milhares de mineiros têm rompido a barreira do preconceito com a idade e iniciado a vida acadêmica depois dos 40 anos, como revelam os dados mais recentes do Ministério da Educação. Entre 2013 e 2017, o número de matrículas dos alunos acima dessa faixa etária em cursos de graduação cresceu 17,9% em Minas Gerais, percentual maior que o registrado no Brasil, que teve alta de 16,5% no mesmo período.
Para retomar os estudos, Neves levou em consideração a possibilidade de agregar conhecimento ao trabalho que executa atualmente, usando conceitos do direito aplicados à medicina do trabalho. Mas ele também pensa na nova faculdade como um plano B. “Descobri com o passar do tempo que ficar focado em apenas um ramo de atividade é uma postura um pouco arriscada”, afirma o estudante, que está no terceiro período do curso.
O empresário José Célio Dorneles, 53, pisou pela primeira vez em uma universidade aos 42 anos. A entrada tardia no ensino superior foi uma forma de se manter como gestor de uma equipe de vendas, e, para isso, ele emendou uma faculdade e a pós-graduação com foco na área de gestão e representação comercial.
E ele não parou por aí. Dorneles planeja agora ingressar em um curso de engenharia civil. Dessa vez, o objetivo é fazer a própria empresa crescer. “Não sei quando eu vou me aposentar, então tenho que trabalhar e procurar algum curso que esteja na minha área para que eu possa assinar projetos”, explica o empreendedor, que é sócio em uma empresa de Betim, na região metropolitana de Belo Horizonte, que fabrica esquadrias de alumínio para o setor da construção civil.
Melhores condições. Para Ângela Costa, professora universitária da Faculdade Presidente Antônio Carlos (Fupac) de Nova Lima, na região metropolitana da capital, a busca crescente de pessoas que passaram dos 40 anos por um curso superior pode ser explicada por alguns fatores: “Percebo que essas pessoas têm melhores condições financeiras para estudar e também uma melhor capacidade de administrar o próprio tempo”. A satisfação pessoal também pode pesar muito na decisão, como aponta a professora. “Às vezes, a pessoa não teve a oportunidade antes e (o curso superior) se torna uma questão de autoestima”, avalia.
E foi movida pelo desejo de entrar em uma universidade que a aposentada Angélica Duarte, 56, concluiu a faculdade de direito no ano passado. “Na minha juventude, eu trabalhava o dia todo e não achava justo deixar minhas filhas à noite para dar sequência aos estudos”, lembra. Com as filhas criadas, veio a concretização do sonho. “Foi uma realização”, comemora.
Dificuldade. O ingresso em um curso superior exige determinação e também a capacidade de enfrentar os próprios medos. Angélica Duarte, por exemplo, teve de lidar com o receio de sofrer preconceito por causa da idade: “Eu tinha vergonha de ser mais velha, então eu sentava lá no fundo e ficava quietinha no meu canto. Quando me enturmei, acabou”.
Foco. A professora universitária Ângela Costa orienta que é preciso traçar metas claras, focar o crescimento profissional e organizar a rotina para não desistir no caminho.
Reciclagem garante lugar no mercado
Não se acomodar por já ter uma profissão e continuar em busca de conhecimento pode garantir a permanência no mercado de trabalho depois dos 40 anos. “Para esse profissional manter a empregabilidade, é de extrema importância que ele tenha um curso superior, uma pós-graduação, que ele busque a qualificação constante”, orienta o conselheiro estratégico da Associação Brasileira de Recursos Humanos em Minas Gerais (ABRH-MG), Vinícius Gomes.
O especialista afirma que as empresas já não encaram a faixa etária como problema e perceberam que a idade pode até ser um trunfo no currículo do candidato. “O mercado vem entendendo que esse profissional tem muito a agregar nas instituições”, afirma. Na avaliação dele, o fato de a pessoa acima dos 40 anos ingressar em um curso superior já demonstra seu interesse em se manter atualizado, o que pode contar pontos em uma seleção.
A professora universitária da Fupac de Nova Lima Ângela Costa explica que mesmo quem já tem uma graduação no currículo pode encarar uma nova faculdade como um meio para se reciclar e abrir novas portas. “Vejo, por exemplo, engenheiros fazendo o curso de direito, porque eles precisam ampliar o conhecimento em outras áreas para atuar na própria profissão”.
Para o empresário Adriano Neves, que está na segunda faculdade aos 49 anos, “a idade não é empecilho para nada”. “A experiência que se acumula deveria ser muito valorizada no nosso país”, diz.
Ensino superior
Universidades mineiras têm alta de alunos com mais de 40 anos
Matrículas de estudantes acima dessa idade cresceram 17,9% entre 2013 e 2017; melhores condições financeiras e de administrar o tempo explicam
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