Ensino superior

Universidades mineiras têm alta de alunos com mais de 40 anos

Matrículas de estudantes acima dessa idade cresceram 17,9% entre 2013 e 2017; melhores condições financeiras e de administrar o tempo explicam

Por Clarisse Souza
Publicado em 14 de janeiro de 2019 | 03:00
 
 
 
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Aos 49 anos e com uma carreira consolidada na área de fonoaudiologia, Adriano Neves não pensa em parar de trabalhar tão cedo. “O negócio é estar na ativa”, diz o empresário de Belo Horizonte. Pensando nisso, ele decidiu turbinar a carreira e voltou à sala de aula em 2018 para encarar o desafio de um novo curso superior em uma faculdade de direito. Como ele, milhares de mineiros têm rompido a barreira do preconceito com a idade e iniciado a vida acadêmica depois dos 40 anos, como revelam os dados mais recentes do Ministério da Educação. Entre 2013 e 2017, o número de matrículas dos alunos acima dessa faixa etária em cursos de graduação cresceu 17,9% em Minas Gerais, percentual maior que o registrado no Brasil, que teve alta de 16,5% no mesmo período.

Para retomar os estudos, Neves levou em consideração a possibilidade de agregar conhecimento ao trabalho que executa atualmente, usando conceitos do direito aplicados à medicina do trabalho. Mas ele também pensa na nova faculdade como um plano B. “Descobri com o passar do tempo que ficar focado em apenas um ramo de atividade é uma postura um pouco arriscada”, afirma o estudante, que está no terceiro período do curso.

O empresário José Célio Dorneles, 53, pisou pela primeira vez em uma universidade aos 42 anos. A entrada tardia no ensino superior foi uma forma de se manter como gestor de uma equipe de vendas, e, para isso, ele emendou uma faculdade e a pós-graduação com foco na área de gestão e representação comercial.

E ele não parou por aí. Dorneles planeja agora ingressar em um curso de engenharia civil. Dessa vez, o objetivo é fazer a própria empresa crescer. “Não sei quando eu vou me aposentar, então tenho que trabalhar e procurar algum curso que esteja na minha área para que eu possa assinar projetos”, explica o empreendedor, que é sócio em uma empresa de Betim, na região metropolitana de Belo Horizonte, que fabrica esquadrias de alumínio para o setor da construção civil.

Melhores condições. Para Ângela Costa, professora universitária da Faculdade Presidente Antônio Carlos (Fupac) de Nova Lima, na região metropolitana da capital, a busca crescente de pessoas que passaram dos 40 anos por um curso superior pode ser explicada por alguns fatores: “Percebo que essas pessoas têm melhores condições financeiras para estudar e também uma melhor capacidade de administrar o próprio tempo”. A satisfação pessoal também pode pesar muito na decisão, como aponta a professora. “Às vezes, a pessoa não teve a oportunidade antes e (o curso superior) se torna uma questão de autoestima”, avalia.

E foi movida pelo desejo de entrar em uma universidade que a aposentada Angélica Duarte, 56, concluiu a faculdade de direito no ano passado. “Na minha juventude, eu trabalhava o dia todo e não achava justo deixar minhas filhas à noite para dar sequência aos estudos”, lembra. Com as filhas criadas, veio a concretização do sonho. “Foi uma realização”, comemora.

Dificuldade. O ingresso em um curso superior exige determinação e também a capacidade de enfrentar os próprios medos. Angélica Duarte, por exemplo, teve de lidar com o receio de sofrer preconceito por causa da idade: “Eu tinha vergonha de ser mais velha, então eu sentava lá no fundo e ficava quietinha no meu canto. Quando me enturmei, acabou”.

Foco. A professora universitária Ângela Costa orienta que é preciso traçar metas claras, focar o crescimento profissional e organizar a rotina para não desistir no caminho.

Reciclagem garante lugar no mercado

Não se acomodar por já ter uma profissão e continuar em busca de conhecimento pode garantir a permanência no mercado de trabalho depois dos 40 anos. “Para esse profissional manter a empregabilidade, é de extrema importância que ele tenha um curso superior, uma pós-graduação, que ele busque a qualificação constante”, orienta o conselheiro estratégico da Associação Brasileira de Recursos Humanos em Minas Gerais (ABRH-MG), Vinícius Gomes.

O especialista afirma que as empresas já não encaram a faixa etária como problema e perceberam que a idade pode até ser um trunfo no currículo do candidato. “O mercado vem entendendo que esse profissional tem muito a agregar nas instituições”, afirma. Na avaliação dele, o fato de a pessoa acima dos 40 anos ingressar em um curso superior já demonstra seu interesse em se manter atualizado, o que pode contar pontos em uma seleção.

A professora universitária da Fupac de Nova Lima Ângela Costa explica que mesmo quem já tem uma graduação no currículo pode encarar uma nova faculdade como um meio para se reciclar e abrir novas portas. “Vejo, por exemplo, engenheiros fazendo o curso de direito, porque eles precisam ampliar o conhecimento em outras áreas para atuar na própria profissão”.

Para o empresário Adriano Neves, que está na segunda faculdade aos 49 anos, “a idade não é empecilho para nada”. “A experiência que se acumula deveria ser muito valorizada no nosso país”, diz.

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