O acordo entre a Vale e o governo de Minas para reparar os danos causados pelo rompimento da barragem da mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho, na região metropolitana, foi firmado nesta quinta-feira (4) após dois anos da tragédia e quatro meses de negociação. O valor acertado entre as partes foi de R$ 37,68 bilhões, como antecipado por O TEMPO com exclusividade na segunda-feira. Cerca de 30% dos recursos previstos têm como objetivo beneficiar o município e a população da cidade, onde a barragem se rompeu em 2019, deixando 270 mortos.
O restante do montante, de acordo com o acordo, será direcionado em benefício da população do Estado. Entre os investimentos estão R$ 4,95 bilhões em mobilidade, distribuídos em projetos como o rodoanel em Belo Horizonte e melhorias no metrô, além de R$ 4,37 bilhões em hospitais, nos orgãos de segurança e de resposta a emergência no Estado em programas de combate a doenças como a dengue. O termo prevê ainda o aprimoramento do sistema que integra as bacias dos rios Paraopeba e das Velhas.
"Nós estamos usando essa indenização para o povo mineiro, não para caixa do Estado. Continuaremos sendo um estado com terríveis dificuldades financeiras (...) o recurso será usado em prol do povo mineiro, não do governo", destacou o governador Romeu Zema (Novo).
Segundo com o governo de Minas, este é o maior acordo já realizado na história do país. "'É o maior, em valor, da história do Brasil e o segundo do mundo", afirmou o secretário de governo, Mateus Simões. O procurador-geral do Ministério Público de Minas, Jarbas Soares Júnior, também destacou que "este é maior acordo judicial da história do Brasil". "O acordo apresenta 40 anos dos atuais investimentos governo mineiro, 200 anos do orçamento da prefeitura de Brumadinho e quase 20 anos do orçamento do Ministério Público", disse.
A partir da próxima semana serão abertos editais para diversas obras, que devem ser concluídas em dez anos. "Não podemos mudar o passado, que muitas vezes foi triste e trágico, mas podemos fazer um futuro melhor, e é exatamente isso que nós estamos concretizando neste momento. É um acordo inédito em muitos pontos. Nunca no Brasil se fez um acordo dessa magnitude. Iniciamos agora um novo desafio de darmos início a essas obras", afirmou Zema, que destacou o papel da Assembleia Legislativa.
"Nossas secretarias envolvidas já estavam preparadas para tal, e vamos ter a ajuda da Assembleia Legislativa na questão da priorização. Vamos escutar os parlamentares. Os prefeitos também terão opinião sobre o que é prioritário”, explicou.
Além da Assembleia, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) e a Controladoria-Geral do Estado (CGE) também vão acompanhar e fiscalizar a aplicação do dinheiro.
Os valores do acordo foram calculados pela Fundação João Pinheiro e pelo Ministério Público de Minas Gerais. Segundo o Estado, o termo trata dos danos coletivos e não interferemem ações sobre indenizações de danos individuais e processos criminais, que seguem tramitando na justiça.
Entenda
O montante de R$ 37,68 bilhões do acordo entre a Vale e o governo de Minas Gerais não será pago de imediato e de uma só vez pela mineradora. Os recursos serão depositados judicialmente ao longo do tempo: cada grupo de despesas tem um cronograma de repasses definido. Os R$ 4,9 bilhões destinados aos projetos de mobilidade, por exemplo, serão quitados em 12 parcelas, sendo a primeira em até 60 dias após o trânsito em julgado da decisão homologatória do acordo, a segunda em até 210 dias após o pagamento da primeira parcela, e as demais, a cada 6 seis meses após o pagamento da parcela anterior.
Parte do total acordado já foi paga. De acordo com o governo, R$ 4,39 bilhões foram investidos em ações de reparação, pagamento de moradias provisórias aos atingidos, fornecimento de água para consumo humano e irrigação, dentre outras finalidades.
Os termos estabelecem mais de 300 projetos. Parte deles será executada pela própria Vale, como os para a bacia do Paraopeba, com fiscalização dos órgãos técnicos do Estado, os compromitentes do acordo e uma auditoria permanente.
Outras obras, como as reformas nos hospitais e a construção do Rodoanel, serão realizadas pelo Estado, por meio de licitação. Neste caso, o dinheiro vai para uma fonte específica no Orçamento e não poderá ser utilizado para fluxo de caixa ou pagamento de servidores. A fiscalização será feita pelo Tribunal de Contas do Estado, a Controladoria Geral do Estado e a Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
De acordo com o governador Romeu Zema, o valor do acordo não é um teto e nem um ponto final nas reparações dos danos causados pela tragédia. "Com relação à reparação socioeconômica para o Estado, o valor está definido. Mas, se amanhã for detectado um novo dano ambiental, a empresa terá que arcar com ele. Se amanhã nascer uma criança com um problema, que for efeito dessa tragédia, a empresa vai ter que arcar. Esse valor é um teto, poderá ir além, mas não a menos", explicou.
O acordo terá vigência de dez anos e, em caso de descumprimento de obrigação a fazer, a Vale poderá pagar multa diária de R$ 100 mil. A mineradora terá quatro anos para pagar o acordo. Eventuais descumprimentos de obrigação de pagar sujeitarão a empresa à multa de 2% sobreo valor em atraso e juros moratórios de 1% ao mês.
Outro lado
Na audiência, o vice-presidente executivo da Vale, Luiz Eduardo Osório, reforçou os esforços realizados pela mineradora e destacou que o acordo será um "catalisador para o desenvolvimento sustentável de Brumadinho e região e todas as pessoas que vivem no estado Minas Gerais". "Desde o primeiro dia, deixamos claro que estávamos determinados a reparar integralmente e compensar os danos causados pela tragédia de forma célere. Temos a convicção que o acordo firmado hoje é um passo importante nessa direção", pontuou.
A reunião desta sexta-feira (4) foi a sexta audiência de conciliação desde outubro do ano passado. Em Mariana, somente cinco anos após o rompimento da barragem de Fundão, a Advocacia-Geral da União, a Advocacia-Geral do Estado e a Procuradoria do Espírito Santo conseguiram definir na destinação dos quase R$ 1 bilhão para reparação dos danos provocados pela tragédia