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Gabi Doti lança "Outra Razão"

Álbum traz um time de músicos de respeito e a produção assinada pelo bamba Moogie Canazio, carioca radicado em Los Angeles há mais de quatro décadas, e Daniel Baker

Por Patrícia Cassese
Publicado em 11 de maio de 2020 | 13:46
 
 
 
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A cantora e compositora Gabi Doti nasceu em Montevidéu, no Uruguai, mas muito cedo se mudou, com a família, para Porto Alegre.  No entanto, foi em Brasília, para onde migrou na sequência (ainda mora lá), que se deu o despertar de sua vocação para a música. "A capital federal é um caldeirão sonoro, espelha a diversidade cultural do país sendo um celeiro do jazz, do rock, do chorinho... Da música brasileira em geral e da internacional também. Um sincretismo. Musicalmente falando,  um resumo das várias manifestações que a gente tem no país", entende ela, lembrando que, claro, toda essa miscelânea acabou se refletindo na sua formação musical. "E, curiosamente, foi lá que me reconectei com as minhas raízes. Vitor Ramil, por exemplo, veio com tudo, se tornou uma referência pra mim", conta ela, que acaba de lançar o disco "Outra Razão". 
 
Um trabalho que reflete a personalidade visceral da artista. "Me entendo como uma pessoa muito sonhadora, intensa, determinada - e, como artista, da mesma forma. Ou seja, mergulho muito fundo. E essas características estão traduzidas também na sonoridade que busco e mesmo na minha voz. Para mim, interpretação é algo que vem lá de dentro, não tem como ser diferente. E é essa conexão que busco ter com o público e transmitir nas minhas letras", conta. "A minha música, ela passa pelo rock, passa pelo lounge, pela disco, pela música brasileira... E tem elementos de música latina-americana, claro, apreendidas no período em que vivi no Uruguai, ouvindo muita música, mas não só a de lá, também a do resto da América Latina e Central, de países como o México, ouvindo as cumbias. Por isso não gosto muito de rotular".
 
O novo disco foi sendo delineado por ela e o renomado produtor e engenheiro de som Moogie Canazio (radicado nos EUA), junto a Daniel Baker, que já vinha atuando como diretor musical de Gabi em Brasília. "Comecei a compor para esse disco em 1º de janeiro do ano passado, e terminei duas semanas antes de entrar no estúdio, o que aconteceu em junho. Compus 31 canções, dessas, 15 ganharam arranjo e, depois, selecionamos as dez finais", relembra. 
 
Neste processo, em termos de temática, Gabi diz que procurou se manter livre. "Mas uma coisa eu sabia de pronto. Musicalmente falando, em termos de som e em termos da letra, do que eu estivesse escrevendo, queria estabelecer um discurso mais direto (com o ouvinte). Tanto é que em muitas letras falo diretamente, com um 'você'. 'Nonsense', uma das canções, por exemplo, diz: 'Você, quantas verdades inventou, alguma sensatez ao menos para poder acreditar?'". 
 
Em meio ao processo de feitura das citadas composições, Gabi Doti também percebeu que involuntariamente estava abordando, nas letras, alguns dos vários aspectos que a razão pode assumir no cotidiano. "A razão do amor, de não ter razão, a descontrução da razão, a razão do abraço, a razão de você querer se mostrar, aparecer, o momentismo que a gente vive hoje, a inocência, a diversidade. Exploro muito esses aspectos em cada uma das canções, mas meu processo mesmo começou de modo bem livre", situa. 
 
O tema "a desconstrução da razão", em particular, acabou se conectando, em uma das faixas, a balada "Otra Razón", a um tema bastante delicado: a síndrome de Alzheimer. "Na verdade, é uma música que tinha feito em 2017, para um outro projeto, e que estava numa linha melódica um pouco diferente. Acabei reformatando-a. Aborda um assunto que é super sensível a respeito da história de uma pessoa muito querida, que tem essa síndrome. Tentar encontrar uma abordagem lúdica foi a minha forma de falar principalmente às pessoas que convivem com essa questão, com esse processo que, na verdade, é o de se tornar inocente de novo. E quis mostrar que, apesar de ser um questão muito complexa, difícil de lidar, é possível encontrar, nesse caminho, uma certa suavidade para encará-la e para conviver com ela com um pouco mais de esperança, de carinho".
 
O disco tem uma bônus track, "Good Times", composta em inglês. "Um dia, eu estava correndo num parque, aqui,  em Brasilia, e veio o refrão, já em inglês. Voltei para casa, fui logo ao piano e comecei a brincar com o loop, que vem logo no início, e acabei construindo a estrutura da canção praticamente toda de uma vez. Foi uma inspiração que veio sobre e vontade de expressar o sentir-se bem consigo mesmo, de abordar a razão do simples, dentro de mais um dos aspectos da razão que aparecem no disco". 
 
Já "Verdade ou Mentira" fala muito de uma temática que ela relaciona à atual pandemia. "Uma situação que parece surreal. Obviamente não foi feita para isso, não tinha como antever lá atrás. Mas aborda a questão da honestidade, a razão de ser honesto, pontuando que a gente não é bobo, sabe distinguir o que é verdadeiro ou não".
 
Em tempo: além das influências que ela mencionou, Gabi acrescenta Clube da Esquina e, em particular, Beto Guedes. "Cresci ouvindo 'Amor de Índio'. Ah, sim, e minha mãe escutava muito Clara Nunes". De sua origem sulista, a banda Engenheiros do Hawaí, pautou, claro, sua juventude. Já do Uruguai, ela cita o cantor Jorge Drexler, "que é um supermúsico e cujo trabalho se  baseia muito nas milongas, no candombe". "Mas também trago influências das sonoridades norte-americanas e britânicas, muita coisa de rock, jazz, funk da década de 70, disco... Prince, George Clinton, John Meyer, que venho ouvindo bastante,  Miles Davis... É um caldeirão muito eclético".
 
O álbum, vale dizer, traz um time respeitável de músicos. Caso de Sean Hurley, baixista de John Meyer, ou do percussionista cubano Rafael Padilla, que já trabalho com Diana Ross e Shakira. O guitarrista Tim Pierce, o baterista Jamie Wollam (atualmente integrante do Tears For Fears) e a Orquestra de Saint Petersburg são alguns desses, o que fez o crítico Antônio Carlos Miguel proclamar, sobre Gabi: "a surpresa e a certeza nesse incerto 2020".

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