Para a reabertura do Glouton, restaurante do chef mineiro Leo Paixão, eleito recentemente um dos cem melhores da América Latina, louças foram criadas exclusivamente para receber o novo menu-degustação lançado em setembro desse ano.
Em parceria com a ceramista mineira Léa, o chef desenvolveu todas as louças para carregar cada etapa do seu novo menu – e elas estão disponíveis para comércio. Algumas peças já viraram hit entre os comensais que conferem o novo menu. Para acomodar o camarão-tigre fresco, servido com ravióli de foie gras, conhaque e bisque au poivre, um prato feito em porcelana simula ondas do mar.
A incursão de Leo Paixão no mundo de pratos, vasilhas e potes mostra que a louça é, sim, parte fundamental da experiência gastronômica. Mais do que um simples receptáculo para a comida, ela tem o poder de elevar uma receita visualmente, fazendo com que a apresentação ganhe força e seduza o cliente assim que chega à mesa – o famoso “comer com os olhos”.
Mas se engana quem acredita que só louças personalizadíssimas cumprem bem essa função. A chef Bruna Martins, proprietária do BiroscaS2, no Santa Tereza, garimpou boa parte dos pratos e vasilhas que usa no seu restaurante, focado na comida afetiva, em antiquários e topa-tudos da Lagoinha, antiga região boêmia de Belo Horizonte.
De jeito “antiguinho”, elas casam perfeitamente com as receitas extraídas de cadernos da mãe e da avó dela, reproduzidas com técnica apurada.
O cliente chega à mesa, e o prato que ele recebe é geralmente escolhido de antiquários ou, os mais coloridos e estampados, em lojas diversas que encontro pela cidade”, contou ela. Os pratos principais são geralmente servidos em louças brancas, simples e ovais, para deixar que a comida seja protagonista. Alguns petiscos, como a barquete de salpicão, são acomodados em réguas que, na verdade, são azulejos hidráulicos antigos encontrados no Cemitério dos Azulejo, em BH.
Combinar a comida e a louça é um dos desafios dos chefs ao apresentar um menu. Felipe Oliveira, do restaurante Ora, em Tiradentes, escolheu a Casagrande, referência na fabricação de vasilhames artesanais na cidade histórica – e que assina peças para muitos restaurantes.
Pratos de diversas cores, formatos e profundidades foram criados para acomodar cada receita pensada pelo chef – um bom exemplo é uma cerâmica que simula um pente de ovos para acomodar as coxinhas feitas de rabada. “Sempre acreditei que a cerâmica valoriza ainda mais o prato”, disse o chef, que desenvolveu os moldes dos primeiros vasilhames em 2019. “Por mais que a gente tente ter uma forma para todos os pratos, produzir de forma artesanal faz com um nunca fique igual ao outro, e eu adoro isso. As cores da comida também precisam contrastar com a da louça em questão”, acredita.
De fato, o investimento dos chefs na cerâmica artesanal reconfigurou os menus espalhados pela cidade. Muitos são assinados pel’O Ateliê da Cerâmica, que fica em Contagem, região metropolitana de BH. Utilitários são produzidos por Flávia Soares e os filhos Luíza Soares e Daniel Romeiro, com cuidado e qualidade para produzir peças seguras – isso inclui até a escolha atenciosa de pigmentos para cada criação, que é feita cuidadosamente em pequena escala.
“Nosso foco inicial sempre foi mudar a relação das louças com as pessoas, a ter uma relação mais íntima e responsável com os objetos e a comida”, relembra Daniel Romeiro. Em 2016, as peças do ateliê conquistaram o próprio Leo Paixão, que, imediatamente, incluiu amostras para receber os pratos dos seus restaurantes Glouton e Ninita.
A relação das peças e a gastronomia foi crescendo. Atualmente, a cafeteria OOP usa as peças para estimular os sentidos. Em São Paulo, as peças foram para o restaurante do chef paraibano Onildo Rocha, aberto em São Paulo em outubro deste ano – o Priceless.
“O prato tem um valor muito importante na cultura da alimentação. Quando chefs e cozinheiros se apropriam dessa ideia, a relação fica mais enriquecedora. O interessante é que cada um reconheça sua identidade e procure criar em cima disso”, disse Daniel.
O chef André de Melo, do Bravo Catering, concorda. Seu menu sempre é feito em harmoniza com as peças da Marble Design Pieces, da designer Raquel Guerra. “Tudo envolve uma montagem que conversa com a decoração do evento, com a proposta do cliente, para que ele sinta que pensamos exclusivamente nele”, disse o chef. “A experiência gastronômica envolve também nosso olhar, é a primeira impressão, que pode também ser muito marcante e prazerosa”, emenda Raquel Guerra.