Incerteza

Cefart convive com precarização da escola e dúvidas quanto ao futuro

Centro de Formação Artística do Palácio das Artes é referencial para várias gerações, mas convive com a precarização

Por Gustavo Rocha
Publicado em 27 de dezembro de 2018 | 03:00
 
 
 
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O Centro de Formação Artística (Cefart), da Fundação Clóvis Salgado (FCS), é referencial para várias gerações de artistas que se capacitaram por lá para ganhar palcos, galerias e espaços culturais Brasil afora. O Grupo Luna Lunera, por exemplo, foi formado lá. O mesmo acontece com a Trupe Pierrot Lunar e a Miúda Companhia, dentre muitos outros grupos de teatro. Na dança, temos o Ballet Jovem em uma extensa lista.

Recentemente, o Cefart inaugurou um novo espaço, o Cefart Andradas, que, em tese, abrigará todos os cursos oferecidos pela FCS (o custo da readequação do prédio, que já estava pronto, ficou em torno de R$ 50 mil). Porém, o aparente momento de expansão e consolidação das atividades da escola é cercado por dúvidas em relação ao futuro. A principal delas passa pela formação de seu corpo docente. Para se ter uma ideia, no curso de teatro, por exemplo, dos 12 professores, apenas dois são efetivos. Os outros dez são contratados via concurso de designação com validade de um ano.

“Há uma evidente precarização da formação dos alunos, pois o processo (anual) de designação não garante que os mesmos professores continuem. Com o processo de designação, a escola está piorando”, pontua Vilmar Souza, atual diretor do Cefart.

Souza assumiu a direção há cerca de dois anos, quando a questão da formação no Cefart ficou mais evidente com a falta de professores para boa parte dos alunos. Daí, surgiu o movimento Menos Palácio, Mais Arte, que rendeu frutos, já que a escola conseguiu abrir concurso para professores (designados) e normalizou a oferta de disciplinas para alunos de todas as áreas – teatro, dança, música, tecnologia da cena e artes visuais.

“Essa gestão cuidou mal da escola. Vários projetos foram encerrados. O Menos Palácio, Mais Arte foi a busca por melhores condições em todos os níveis”, destaca Cláudio Dias, ator, integrante da Cia. Lunera, que se formou em teatro no Cefart em 2000. A relação dele com a escola teve diversos desdobramentos, incluindo a direção do espetáculo “A Máquina de Fazer Espanhóis”, em 2015, com contribuições do Ballet Jovem.

Na raça. “O Estado precisa abrir concurso para professores efetivos. Os profissionais interessantes da área não querem fazer concurso. Os professores que estão lá estão na raça, na paixão. São ex-alunos dos cursos, fazem pelo amor à escola”, ressalta Rogério Araújo, ex-aluno de teatro do Cefart, integrante do grupo Armatrux e atual professor da escola.

O desejo para que a escola componha um corpo docente efetivo, entretanto, deverá ficar, na melhor das hipóteses, para 2020. Há um novo concurso para professores designados para o Cefart em todas as áreas de formação, exceto artes visuais. “O salário é defasado, inferior ao que recebem os professores da rede estadual”, reclama Araújo. No edital que está aberto, os designados receberão R$ 1.163,24 para 30 horas de dedicação semanal ao Cefart, menos de R$ 10 por hora trabalhada.

O processo de precarização também incide sobre as instalações dos cursos técnicos oferecidos pela Fundação Clóvis Salgado. Araújo revela que as salas de aula andam deterioradas, e as condições para desenvolvimento dos trabalhos criativos andam piores do que no tempo em que foi aluno da escola, no fim dos anos 90. “As salas eram ótimas, com pé-direito alto e piso adequado. As salas, como estão hoje, comprometem a qualidade de ensino dos alunos”, lamenta ele.

“O que movimenta são os alunos, a garra que eles têm. O curso tem história, tem memória de uma boa escola de formação, e os alunos entram comprometidos com essa formação. São jovens que querem mais e entregam mais do que os professores pedem. São muito ativos no seu processo de formação”, pontua o professor.

Novo espaço ainda carece de reformas estruturais

A boa notícia, já em novembro de 2018, foi a abertura do Cefart Andradas. A previsão é que o prédio receba todas as turmas do Cefart, além do enorme acervo de figurinos e cenários que ficavam em Marzagão, Sabará. O espaço recebeu o espetáculos de formatura dos alunos de teatro do Cefart, “Eclipse Solar”, dirigido por Ricardo Alves Júnior.

Aberto a toque de caixa antes do fim do mandato do governador Fernando Pimentel, o espaço ainda carece de reformas. “Potencialmente, é um espaço muito interessante, mas que precisa de investimentos: elevador para ser acessível, fiação, reforma das salas, reformas em geral. Estamos felizes, mas, como o espaço está, ele vai funcionar precariamente”, avalia o professor Rogério Araújo.

Outra preocupação é que a ida da escola para o Cefart Andradas possa isolá-los (não só fisicamente) da Fundação Clóvis Salgado e, paulatinamente, inviabilizar a escola e seu funcionamento. “Estamos apreensivos porque não sabemos se vai ter investimento público. Da minha parte, gosto mais que ela esteja próxima à praça da Estação. A escola fica mais democrática, mais negra, mais diversa”, pondera Araújo.

“Nenhum espaço será desocupado. Não deixaremos de estar no Palácio das Artes. A gente mantém a relação, inclusive, criando uma narrativa da travessia pelo parque municipal, entre os dois prédios”, assegura Vilmar Souza.

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