Em agosto de 2018, o escritor, jornalista e roteirista Marçal Aquino, 63, anotou, num caderno, detalhes de uma cena que naquele momento lhe acorreu à mente, chamando sua atenção. Estava ali o ponto de partida de seu recém-lançado "Baixo Esplendor" (Companhia das Letras, 264 páginas, R$ 49,90). O título, vale pontuar, chega às livrarias 16 anos depois de "Eu Receberia as Piores Notícias dos Seus Lindos Lábios", romance que foi adaptado por Beto Brant e Renato Ciasca para o cinema, com Camila Pitanga e ZéCarlos Machado à frente do elenco. Nesta terça-feira, em mais uma edição do projeto Sempre um Papo em Casa, Marçal Aquino conversa com Afonso Borges sobre a obra, contando também com a participação de Tony Bellotto, que, você sabe, além de ser um dos Titãs, também é autor de romances policiais. Marcado para as 19h, o encontro terá acesso gratuito e transmissão no Youtube, Instagram e Facebook do Sempre Um Papo.
Voltando ao dia do citado insight, Aquino conta que aquela cena lhe pareceu de pronto instigante. "E me fez querer saber mais sobre os personagens e as situações que se anunciavam", diz ele, que, à época, tinha acabado de interromper a escrita de um outro livro, um romance satírico cuja ação se situava no final do século 18. "Naquele momento, eu achei interessante 'voltar para o presente' – na verdade, ainda não imaginava que nem seria tão assim ao 'presente', já que a trama acontece em 1973. Nunca sei muito sobre o que estou escrevendo; acho que saber demais, em geral, atrapalha. Prefiro ir descobrindo aos poucos, como se, no processo, eu também fosse apenas um leitor em busca de uma boa história".
"Baixo Esplendor" teve seu ponto final colocado em agosto de 2020. No centro da ação está Miguel, um agente do serviço de inteligência cujo trabalho básico é infiltrar-se nas quadrilhas sob investigação. "Seu pai foi delegado, o que o levou naturalmente à carreira, sem grandes questionamentos - embora, se quisesse, poderia almejar mais dentro da profissão, já que é bacharel em Direito. Miguel gosta do que faz; aproveita para compor personagens. E é vaidoso a ponto de achar que tem sempre o controle da situação. O eixo do livro é o dilema que ele terá de confrontar quando, por paixão, se vê obrigado a colocar em questão de que lado da lei se encontra", resume Marçal. O alvo da citada paixão é Nádia, irmã de Ingo, o chefe de um bando especializado no roubo de cargas no qual ele se infiltra.
Perguntado se há alguma intenção por trás do fato de situar a trama no período em que o país ainda vivia sob a égide do regime militar (num momento em que há pessoas que clamam pelo retorno desta época), Marçal decifra: "É involuntário qualquer paralelo entre a época descrita no livro e os tempos terríveis que vivemos. Não tive essa intenção. Quando comecei a descobrir o livro, e já tinha um bom volume de material escrito, percebi que não aparecia nenhum signo de contemporaneidade – celular, computador etc. E percebi que seria um desafio prazeroso revisitar o passado, a década de 1970, tão definidora na minha vida – entrei nela com 12 anos, saí com 22".
Quanto a eventuais planos de transpor a história para o cinema, como em obras anteriores, ele é enfático: "'Baixo Esplendor' nasceu como livro. Ainda não pensei nessa trama em outra linguagem que não fosse o reino encantado da literatura, único lugar no qual alguém que escreve é de fato livre. Todas as outras instâncias de escrita de que tomei parte na vida, ainda que prazerosas, impõem limites claros - é assim com o jornalismo, a publicidade e os roteiros. Então, quero que o livro tenha seu tempo naquilo que é sua essência. Depois, pode virar filme com a minha benção e, eventualmente, até a colaboração no roteiro, o que vejo como uma decorrência natural para alguém envolvido profissionalmente com a TV e o cinema".
Assunto inevitável, a pandemia tem sido um período por ele vivido em toda sua intensidade. "Estou, há mais de um ano, num isolamento radical. Tenho 63 anos e problemas de saúde crônicos que me colocariam sob sério risco em caso de contaminação. Então, levo a sério o confinamento. Minha companheira é a Tereza, uma bassê temperamental de oito anos e nove quilos". Instado a revelar suas impressões da humanidade neste período, o autor diz que o que mais lhe chocou foi perceber o egoísmo de muita gente, "que faz ignorar princípios básicos quando se trata da luta pela sobrevivência". "Era hora de união, de todo mundo se juntar para combater uma ameaça real, dispensadas quaisquer diferenças neste momento tão crucial na história não do Brasil, mas da humanidade. E o que vemos é, de certo modo, preocupante quanto ao mundo que quem sobreviver terá de reconstruir", finaliza.
Em tempo: Marçal Aquino nasceu em Amparo (SP), em 1958. É jornalista e roteirista de cinema e televisão.Tem obras lançadas na Alemanha, Espanha, França, México, Portugal e Suíça. Autor de vários livros, publicou, dentre outros, o volume de contos, entre outros livros, os volumes de contos "O Amor e Outros Objetos Pontiagudos" (1999), "Faroestes" (2001) e "Famílias Terrivelmente Felizes "(2003), além das novelas "O Invasor" (2011), "Cabeça a Prêmio" (2003) e "Eu Receberia as Piores Notícias dos seus Lindos Lábios" (2005).
#SempreUmPapoEmCasa com Marçal Aquino e Tony Bellotto
Nesta terça-feira, dia 20, às 19h
Local: Youtube, Facebook e Instagram do Sempre Um Papo
Informações: www.sempreumpapo.com.br