Representatividade

Mineiros participam de festival de poesia surda, que começa neste sábado (10)

Primeira edição do 'Festival Arte como Respiro' neste segmento conta com programação gratuita e online

Por Renato Lombardi
Publicado em 10 de outubro de 2020 | 07:00
 
 
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O sorriso no rosto dos mineiros Helio Alves de Melo Neto e Sandyla Stocler Zonta não tem como passar despercebido. Durante a entrevista, realizada por videoconferência, os dois celebraram mais uma conquista. Toda a alegria e satisfação era transformada em palavras pela intérprete de libras Claudia Ferreira - ela foi a mediadora do bate-papo entre Helio e Sandyla, que são surdos, com a reportagem de O Tempo.

O motivo da felicidade dos dois é que levou a esse encontro online. É que eles foram selecionados para participar do Festival Arte como Respiro – Edição de Poesia Surda, que estreia neste sábado (10), às 17h, no site do Itaú Cultural.

A programação da primeira edição do evento neste segmento vai se entender pelos sábados de outubro - o encerramento será no dia 31, cada dia com uma temática diferente - e é fruto de um edital nacional voltado para poetas surdos de todo o país. Helio e Sandyla são os únicos mineiros selecionados para participar do festival. 

Em suas apresentações individuais, em vídeo, os poetas vão interpretar as próprias poesias na Língua Brasileira de Sinais (Libras) ou em Visual Vernacular, também chamado de Libras 3D, um recurso artístico e poético próprio das línguas de sinais - nesse caso, não há uma tradução direta, pois a imagem equivale ao discurso; somente as apresentações em Libras contam com legenda. 

“O festival tem uma importância por divulgar a literatura surda, por mostrar que nós, surdos, também produzimos arte. As pessoas não conhecem a nossa comunidade, não conhecem nossas produções artísticas; temos muitos atores, humoristas, entre outros, com trabalhos muito interessantes”, afirmou Helio, que apresentará a poesia “A Piscina” no próximo dia 24, em Visual Vernacular. “É legal mostrar que nós, surdos,  estamos aqui. É por isso que eu resolvi me inscrever no edital”, destacou ele, que disse que não acreditava que seria selecionado para o "Festival Arte como Respiro – Edição de Poesia Surda."

Sandyla, que participará do projeto no dia 31, com a poesia “Doença Lúpus”, apresentada em Libras, contou que se surpreendeu por ter sido selecionada.  “Eu escolhi o tema e fiz a poesia. Fiquei surpresa porque é uma poesia muito diferente do que eu costumo fazer. Fiquei muito feliz, é gratificante”, pontuou ela. 

Visibilidade e acessibilidade

Educador com passagem pelo Centro Cultural Banco do Brasil de Belo Horizonte (CCBB BH), Helio conta que a profissão o fez mergulhar ainda mais na arte. “A poesia é algo que está dentro da minha prática artística”, observou. 

Ele pontuou o uso da tecnologia no "Festival Arte como Respiro – Edição de Poesia Surda",  possibilitando que a arte produzida por eles “alcance muitos surdos” pelo país. “A sociedade ouvinte tem muitos espaços para se manifestar, então, porque ainda a gente também não ocupa esses espaços?”, indagou Helio. “Esse projeto é um marco muito importante para nós”, afirmou o poeta, que também fez questão de enaltecer as iniciativas já existentes que ajudam na divulgação dos trabalhos de artistas surdos. “Estou muito feliz com essa abertura para que a gente possa se manifestar por meio da arte”, completou. 

Sandyla, que descobriu a poesia na época da escola, conta que já apresentou os textos de sua autoria em “alguns poucos lugares”. Com o "Festival Arte como Respiro – Edição de Poesia Surda", ela também acredita que é a abertura de um importante espaço para a divulgação da cultura surda. “A literatura surda, por exemplo, é muito rica e temos produções em todo o Brasil. Esse projeto traz visibilidade e é um importante passo na luta pela representatividade”, explicou a poeta mineira. Assim como Helio, ela também destaca que o fato de o festival acontecer via internet vai alcançar muitas pessoas.

O festival

Em conversa com O Tempo, Samara Ferreira, coordenadora do Núcleo de Educação e Relacionamento do Itaú Cultural - setor responsável pela realização do "Festival Arte como Respiro – Edição de Poesia Surda" - explicou que o evento é resultante do edital que a instituição abriu neste ano, com o objetivo de movimentar a economia criativa. Uma das vertentes é a poesia surda.

“O festival traz uma visibilidade para essas pessoas, explorando todas as possibilidades que as linguagens (Libras e Visual Vernacular) trazem”, afirmou ela.

Samara revelou que artistas de todo o Brasil se inscreveram. “Recebemos 247 poesias, muito conteúdo com potencial. Selecionamos 99 poetas de 16 Estados”, contou ela, destacando que a curadoria foi feita por uma comissão interna criada por pessoas que trabalham com ações para surdos dentro do Itaú Cultural.

Em outubro, 35 poemas serão apresentados. Os demais textos selecionados, segundo Samara, serão interpretados na continuação do Festival, que acontecerá em novembro e em dezembro. “Os trabalhos serão apresentados pelo educador, surdo e poeta Edinho Santos”, destacou ela.

A coordenadora também explicou que cada dia de apresentação terá uma temática. A estreia, neste sábado (10), o tema será Empoderamento Feminino; no dia 17, Empoderamento Surdo; no dia 24, Cotidianos; e no dia 31, Reflexões Poéticas. Cada um desses grupos ficará disponível no site do Itaú Cultural por 15 dias.

Segundo Samara, não houve nenhum direcionamento no edital sobre as temáticas. “Os temas das poesias são muito interessantes, por isso resolvemos dividi-los”, disse ela, que não descarta a possibilidade de o "Festival Arte como Respiro – Edição de Poesia Surda" voltar em 2021.

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