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Patrícia Melo fala sobre feminicídio em seu novo romance

O tipo de crime no qual o Brasil insere-se, hoje, no quinto lugar no ranking mundial, é o pano de fundo da história

Por Patrícia Cassese
Publicado em 06 de novembro de 2019 | 03:00
 
 
 
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A temática violência sempre esteve no substrato das narrativas elaboradas pela escritora paulista Patrícia Melo. Mas o recorte sobre o qual ela se debruçou como ponto de partida para seu mais recente romance, “Mulheres Empilhadas” (LeYa), veio de um tipo particular de crime que ela considera que, no Brasil, vem sendo praticado em “escala industrial”: o feminicídio.

Com uma estrutura diferenciada, que alterna a história ficcional propriamente dita a relatos de casos verídicos e a capítulos oníricos inspirados na lenda da tribo amazônica icamiaba, o livro terá lançamento na capital mineira nesta quinta-feira (7).

O romance é protagonizado por uma jovem advogada paulistana que resolve ir para o Acre para atuar em um mutirão de julgamentos de casos de feminícidio. Vale dizer, porém, que a personagem também tem sua história imbricada ao tema. “Queria que fosse uma personagem com uma instrumentalização para lidar com essa realidade. E quando ela leva um tapa na face, sai de um estado de, digamos assim, dormência. É como se despertasse e fosse atrás dessas histórias”, conta. Não bastasse, a personagem também traz um histórico familiar marcado por um episódio traumático ligado à violência e que é pouco falado.

Completando 25 anos de escrita, nos quais lançou livros elogiados pela crítica e consumidos com voracidade pelo público, como “Acqua Toffana”, sua obra de estreia, ou “O Matador”, que lhe rendeu vários prêmios e teve uma adaptação para o cinema, Patrícia Melo, 57, conta que, ao assentir ao convite da editora para dar o start em seu 12º título, recebeu a sugestão de trabalhar com algum tema ligado ao universo feminino.

A própria constatação da necessidade de se realizar mutirões para dar conta do julgamento, dando o número assustador de casos de feminícidio, deu o empurrão para ela cravar sua opção em abordar essa violência que, observa ela, “é das mais democráticas”. “Já que não faz distinção de idade ou classe social, por exemplo”.

Não bastasse, Patrícia lembra que o Brasil ocupa, hoje, o quinto lugar no ranking de feminícidios, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) – El Salvador fica com o primeiro posto.

Questionada sobre se, entre tantas ocorrências que passaram por sua vista, poderia citar alguma que chamou sua atenção em particular por qualquer que fosse o motivo, ela pondera: “Veja, todos os casos são chocantes. No entanto, pode-se dizer que, na essência, é o mesmo crime. Mudam-se as circunstâncias, os cenários, mas estamos falando de um homem que se sente autorizado a praticar violência contra a mulher – seja sua irmã, sua mãe, sua esposa – num processo contínuo cujo final, muitas vezes, é o feminicídio”, explana, fazendo um parênteses para citar uma particularidade de seu ofício. “Algumas pessoas pensam que o autor costuma escrever sobre coisas que o interessam. Eu, ao contrário, escrevo sobre questões que me aterrorizam, como o número de mulheres mortas dentro de seus núcleos familiares”, pontua.

Mas Patrícia Melo não fica chocada apenas com os crimes. “Na verdade, considero ainda mais assustador a normalização desse tipo de crime em nossa sociedade”, diz, lembrando que, a cada dia, uma média de 11 mulheres são mortas em crimes passíveis de se enquadrar no quesito feminicídio. “E isso é o que chega a ser computado”, ressalta.

Agenda

O quê. Sempre um Papo com Patrícia Melo.
Onde. Sala Juvenal Dias do Palácio das Artes (av. Afonso Pena, 1.537, centro).
Quando. Quinta (7), 19h30.
Quanto. Entrada franca.

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