O Secretário de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais (Secult), Leônidas Oliveira, anunciou, em entrevista exclusiva ao Magazine, que a pasta vai lançar um pacote de medidas emergenciais para auxiliar profissionais dos dois setores em tempos de pandemia. Desde a formação até o fomento da cadeia produtiva da arte e do turismo, a Secult aposta em editais, cursos de capacitação, estudos de conjuntura e a criação de um centro de operações, em local a ser definido, para concentrar as articulações.
Algumas ações já entram em vigor na semana que vem, como o lançamento de um edital no valor de R$ 2,5 milhões para a realização de lives com artistas apresentando seus trabalhos nas mais diversas expressões. “A verdade sobre esse projeto é que ele é uma construção coletiva e já está acontecendo. O que estou fazendo como poder público é organizar as demandas e impulsioná-las”, ele diz.
Abaixo, Oliveira fala, entre outros assuntos, sobre parcerias para implementar as ações, comenta as dificuldades em se trabalhar com orçamentos reduzidos e o motivo pelo qual aceitou o convite de Romeu Zema para chefiar a Secult.
Na próxima semana, o senhor vai lançar um pacote de medidas emergenciais para dar aporte aos setores da cultura e do turismo em tempos de pandemia. Como foi a elaboração do projeto?
Esse projeto nasceu a partir das conversas que tenho mantido com a classe artística, com o Fórum de Cultura. Fiz reuniões com várias entidades, coletivos que estavam fazendo trabalhos de atendimentos emergenciais aos artistas. O objetivo é dar assistência, neste primeiro momento da crise da Covid-19, ao público do circo, aos artistas, aos guias de turismo... É bom frisar que essa ideia já estava acontecendo com os coletivos da cultura e as associações de turismo.
Quais serão as ações?
Vamos lançar, na próxima semana, um edital no valor de R$ 2,5 milhões para premiar artistas. É um edital emergencial da Secult. Vamos pagar mil lives de R$ 2.500 para bandas, artistas de todo o Estado, desde circos, violeiros, artesãos, enfim, todo o espectro da cultura, para que eles possam apresentar seus trabalhos. Acredito que é um pontapé. Estamos montando um centro de operações em parceria com o Mineirão, pela Minas Arena, e várias outras empresas da cidade e fazedores de cultura, artistas, para realizarmos outras 200 lives. Ainda não sabemos se esse centro vai funcionar no próprio Mineirão ou na Serraria Souza Pinto, mas ele será usado para auxiliar o projeto, articular doações, centralizar as operações. Na próxima semana, já pretendemos lançar esse local central nessa articulação para ajudar os dois setores nesse momento dificultoso. Em outro momento, vamos fazer um edital de manutenção de espaços culturais, pontos de cultura. Já estamos trabalhando nesse mapeamento e na simplificação do edital. Conseguimos a liberação de R$ 19 milhões do Fundo Estadual de Cultura e, paralelo a isso, vamos lançar outro edital na próxima semana.
Será disponibilizada uma linha de crédito para o turismo?
Sim. E também vamos levar formação, sobretudo para essa cadeia produtiva, para que eles possam entender melhor a linha de crédito de R$ 5 bilhões que foi disponibilizada pelo governo federal. O Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) vai estar conosco nessa empreitada, ensinando as pessoas como acessar os fundos. O momento é realmente de emergência, e é obrigação do Estado intervir nessa situação. Reunimos parte dessas demandas da sociedade civil e começamos a estruturar um programa de governo com três objetivos. (O primeiro é) atender emergencialmente, junto com as demais secretarias do Estado e junto com a sociedade civil, para criar um movimento de assistência de alimentação. Num segundo momento teremos a capacitação – estamos desenvolvendo plataformas de formação com universidades para oferecer cursos para os dois setores. E, depois que tivermos essa questão emergencial equalizada, começaremos a estudar especificamente procedimentos para a abertura gradual do turismo e da cultura.
Como viabilizar essas medidas tendo um cenário de cortes de orçamentos no Estado e um caixa que enfrenta sérias dificuldades?
O diálogo e a busca de parcerias é a receita para todos os momentos. Ouvir as pessoas também é muito importante. Quando 70% do povo está falando a mesma coisa, é hora de intervir para atender, e o diálogo tem que ser uma constante nessas parcerias com artistas, empresas, coletivos, ONGs e municípios. Para essas medidas, temos mais de 20 parceiros, entre secretarias, a Minas Arena, a Cruz Vermelha, a UFMG, que trabalhou junto com a UFRJ na plataforma de cursos de formação, que deve ser lançada também na próxima semana. Estamos buscando patrocínios e parceiros também na iniciativa privada, colocando nossa estrutura à disposição, abrindo editais. A ideia é que a gente junte forças, a coisa estava muito desconectada. Posso te afirmar que temos mais de 20 parceiros. Junto com os Conselhos de cultura e turismo, buscamos parceiros na iniciativa privada, estamos conseguindo adesão. São vários parceiros, não vou nem citar porque não lembro de todos, mas vários estão abraçando o projeto. Já conseguimos 15 mil cestas básicas. Acredito que até segunda-feira (25) vamos ter tudo isso montado. No turismo, nossa equipe está debruçada no protocolo de abertura. São 1.600 guias turísticos, e estamos elaborando políticas para essa retomada.
Recentemente, o senhor ocupou os cargos de presidente interino da Empresa Brasileira de Turismo (Embratur) e de diretor executivo da Fundação Nacional de Artes (Funarte), ambas autarquias do governo federal. Em que medida esse trânsito em Brasília e o fato de o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, ser mineiro podem ajudar a Secult no que diz respeito a conseguir recursos para o Estado nas áreas da cultura e do turismo?
Tenho duas reuniões marcadas para esta semana: uma com o Secretário de Promoção ao Turismo e outra com a Funarte. São contatos, ambos ligados ao Ministério do Turismo. Quando eu estava na Fundação Municipal de Cultura, não entendia como Brasília funcionava, achava tudo muito diferente. Passar pelo governo federal me deu a possibilidade de conhecer pessoas e o funcionalismo público. Tive essa experiência de olhar Minas por fora. Quanto ao Marcelo Álvaro Antônio, as questões que pedi ao ministério não foram negadas, existe um ótimo diálogo, estamos tendo um apoio muito bacana. Essas reuniões que mencionei são para vir recursos para Minas. Saí do governo federal com uma experiência fundamental. Hoje, vejo coisas de uma forma muito mais clara de como funcionam os financiamentos. Estou pensando em um modelo junto com a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) para criamos uma espécie de rede nacional de restaurantes de comida mineira e usar esses lugares como promoção da nossa gastronomia. São mais de 3.000 restaurantes de comida mineira em todo o país. Estamos pensando também em um aplicativo, uma plataforma e-commerce para que produtos mineiros ganhem o mercado nacional. Aposto muito na economia criativa. E já pedi ao Observatório do Turismo que começasse uma pesquisa e analisasse o que outros Estados e países estão fazendo pensando na reabertura gradual.
Em tempos de crise e com os cofres do Estado em extrema dificuldade de investimentos, por que o senhor aceitou o convite do governador Romeu Zema para chefiar a cultura e o turismo de Minas?
Quando cheguei a BH, na pandemia, as pessoas e vários coletivos começaram a me chamar para conversar. Quando fui conversar com o governo, o Paulo Brant me disse que o diálogo da Secult com todos os setores seria amplo e aberto, ele disse que eu poderia conversar e escutar todo mundo. Mesmo em um tempo difícil, fiquei animado. Se a gente puder conversar com todo mundo, a gente constrói. Tenho uma paixão profunda por Minas Gerais, fui diretor do Museu Histórico Abílio Barreto, sou do interior, sei que o interior precisa da presença do governo. Não é segredo que o Estado está em recuperação, mas existem mecanismos conquistados ao longo do tempo, como o Fundo Estadual de Cultura. O governador tem essa sensibilidade, ele sabe e me disse que as áreas mais afetadas foram o turismo e a cultura. Não vi nenhuma coisa dentro do governo que não fosse objetiva e técnica, pensando nos resultados, além da possibilidade de ter uma conversa ampla com a sociedade e fazer parcerias sem discriminação ideológica. É uma honra para a minha alma e o meu coração poder contribuir nesse momento. E ter um ministro mineiro em uma das áreas ajuda muito na construção de parcerias.
Depois de quase sete meses sem superintendente, o Iphan anunciou a arquiteta, urbanista mineira e especialista em patrimônio, Débora Maria Ramos do Nascimento, para o cargo. Minas Gerais concentra cerca de 60% do patrimônio tombado pelo Iphan no país, muitos deles em Estado precário. O senhor já iniciou diálogos com a superintendente?
Não, mas conversei com o secretário executivo do Ministério do Turismo, Daniel Nepomuceno. O Ministério está lançando uma linha de crédito de R$ 5 bilhões. Nesse pacote vamos ter pessoas do BDMG e da Caixa para ajudar os empreendedores de pousadas em cidades históricas, por exemplo. É uma linha de crédito com juros de 4% ao ano, uma coisa inusitada, não existe no mercado. Isso o Ministério já lançou. A ideia é que a Secult vá às cidades que possuem mais patrimônio histórico e faça capacitação para que elas possam entrar no Fundo Geral de Turismo (Fungetur). Para o patrimônio histórico, há um fundo do Iepha de R$ 12 milhões para soterramento de alguns lugares que estão com a fiação exposta, que não contribui para a visibilidade dos bens históricos. São mais de cem cidades protegidas – 45% do turismo em Minas é um turismo de patrimônio histórico.
O senhor falou sobre o desafio de chegar ao interior do Estado com investimentos de forma eficaz e descentralizada. Como fazer isso?
Pedi um estudo à equipe e a um tributarista, depois quero levar isso para o governo. Nossa equipe já está fazendo um estudo para descentralizar os recursos dos editais. Temos que pensar também numa campanha de conscientização para o empresariado voltar a investir na cultura e na arte, e também temos de refletir sobre o papel do patrocínio das autarquias do Estado. Até faço um apelo para que os empresários voltem a patrocinar a cultura. Se as grandes empresas estão nos grandes centros, uma loja de material de construção em um município de 15 mil habitantes não tem condições de apoiar nada. Tem que analisar as questões tributaristas para que os recursos possam chegar ao município. Também é importante fazer formação para que pessoas possam aprender a fazer projetos de lei. E um terceiro ponto é a simplificação dos editais. O papel do Fundo Estadual de Cultura é de descentralização de recursos, para que eles chegam a quem precisa. Há algumas ideias… editais para municípios de até 25 mil habitantes, por exemplo. Temos que usar mecanismos, alguns estruturantes e outros de direcionamento, para criar critérios para descentralizar os investimentos. Com formação, os municípios que nunca ganham nada vão passar a ganhar. Neste momento, com o Estado em recuperação, não temos muitos recursos, mas tem um Sistema Estadual de Cultura muito vigoroso, temos um Plano Estadual de Cultura aprovado, e ainda se une a ele o turismo.
Em outubro de 2019, Romeu Zema e o então secretário de Cultura e Turismo, Marcelo Matte, lançaram a Marca de Minas, uma série de políticas e ações de posicionamento do Estado nos mercados turísticos nacional e internacional. Como o senhor pretende incrementar esse projeto?
O projeto está vivo, teve uma parada natural, a promoção do turismo parou, chegou a zero, não tem por que promover se não podemos receber turistas. Temos que incrementar esse projeto. Estamos fazendo um raio-x do mercado, já que o contexto que tinha não é o de hoje. A questão da segurança, por exemplo… Minas é um Estado seguro para você conhecer, mas há a segurança em tempos de Covid-19, o que a rede hoteleira pode fazer junto ao governo do Estado, tem também a segurança do turista. Pretendo fazer uma coisa: a Rede Minas e a rádio Inconfidência têm que ser uma luz, que trabalhem para a promoção do turismo interno. A Rede Minas teve um crescimento muito importante e vamos aproveitar esse momento também. Primeiro vamos olhar para o turismo local e do entorno de BH, depois o Estado, o país… Acredito que a promoção do turismo internacional só vamos conseguir fazer em 2021.
Tendo essa experiência em autarquias do governo federal, qual é a sua avaliação sobre a gestão da atriz Regina Duarte à frente da Secretaria Especial da Cultura?
Sinceramente, ainda não entendi qual é a proposta, não percebi da Regina uma proposta clara para o setor. Não sabemos ainda como vai ficar o Fundo Nacional de Cultura, realmente não tenho subsídios para responder porque ainda não vi e não entendi qual é a proposta dela. Mas é importante salientar que a Funarte está fazendo políticas interessantes, tem muita coisa bacana. O Iphan continua fazendo um bom trabalho também, as autarquias vinculadas à secretaria, a Biblioteca Nacional, mas a secretaria em si, que deveria criar políticas públicas, eu realmente não tenho subsídio para avaliar, até porque não sei qual é a proposta dela.