Uma família com duas crianças pequenas viaja tranquila de carro quando uma poça de óleo na pista faz com que o motorista perca o controle e o automóvel voe até um barranco, onde se espatifa no meio das árvores da Serra das Araras, no Rio de Janeiro. O leitor ainda não se recuperou da surpresa e a trama dá um salto no tempo, avançando até o dia 17 de março de 1964, quando se completam 17 anos daquela tragédia. O que vai acontecer naquela data justifica o novo romance de Edney Silvestre, “O Último Dia da Inocência”.
Trata-se de uma obra em que o autor, também jornalista, se apoia na história do país para criar uma ficção. Dessa vez, Silvestre escolheu um momento decisivo: a sexta-feira em que aconteceu o hoje chamado Comício da Central, no Rio, em que o então presidente brasileiro, João Goulart, anunciou a reforma agrária e a nacionalização de refinarias de petróleo de empresas estrangeiras. Isso apressou a movimentação de grupos contrários e que resultou no golpe militar.
“Nossas vidas são manipuladas pela situação de poder e, seguindo esse raciocínio, eu me interesso mais por determinados fatos históricos”, conta Silvestre, que utiliza sua habilidade para costurar realidade e ficção em tramas com narrativas marcadas por surpresas. É o caso de “O Último Dia da Inocência” – aqui, o protagonista é um jovem rapaz de 19 anos, que se inicia na carreira jornalística.
Naquele 13 de março, enquanto as emissoras de rádio alternam músicas românticas com chamamentos políticos para o comício, fomentando um clima pré-golpe, o rapaz inicia o dia no Instituto Médico Legal, onde o cadáver de um rapaz loiro e de olhos azuis se destaca em meio a corpos de pessoas mais humildes. Ao aceitar a dica de um tarimbado fotógrafo, o jovem sem nome se enrola em uma trama de falsas aparências, na qual nada é o que parece, ninguém é quem diz ser, e crimes vêm sendo encobertos desde a ditadura de Getúlio Vargas. E o fato de a família não ter ainda se pronunciado desperta a atenção do repórter que, ao iniciar uma investigação, acabará envolvido em um violento crime.
“O mais curioso é que o rapaz não se interessa por assuntos políticos, mesmo vivendo um dia tão decisivo na história brasileira”, conta Silvestre que, como de hábito, fez uma intensa pesquisa para ser preciso nas citações.