Manifestações

Economia do Brasil ‘desandou’ após atos de 2013? Entenda o que mudou em 4 pontos

Especialistas avaliam que manifestações precederam período turbulento do cenário econômico nacional; Brasil era o 6º país mais rico do mundo na época e caiu para 12º


Publicado em 08 de junho de 2023 | 06:00
 
 
 
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O ano era 2013 e o Brasil era o “país do futuro” de um amanhã que, ao que tudo indicava, estava cada vez mais próximo. Ele era a sexta maior economia do mundo, à frente do Reino Unido, a taxa de desemprego chegou ao menor patamar em uma década no final do ano e, em janeiro, pesquisas apuraram que quase 60% dos brasileiros acreditavam que sua situação econômica iria melhorar. Mas no período de dez anos, desde então, o país atravessou uma recessão econômica, foi derrubado por uma pandemia quando tentava se reerguer e desceu para a décima segunda posição das maiores economias do mundo no fim de 2022, segundo levantamento da Austin Rating.

Em que ponto tudo mudou? Os atos de 2013, também conhecidos como Jornadas de Junho, não explicam e não causaram totalmente os deslizes econômicos do Brasil. Mas economistas concordam que as manifestações, que neste mês completam uma década, precederam um período de transformações econômicas de que o país não conseguiu emergir até hoje. Relembre o período em quatro pontos:

1 - ‘Nova classe média’ vai às ruas

É possível começar a análise olhando o perfil de parte dos manifestantes que tomaram as ruas naquele ano: a nova classe média. O fenômeno da ascensão da classe C durante os anos 2000 abriu as portas do consumo para cerca de 40 milhões de brasileiros, segundo levantamento da Fundação Getulio Vargas (FGV) publicado em 2011.

No calor das manifestações, no final de junho de 2013, o então ministro interino da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República e presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Marcelo Neri, um dos maiores pesquisadores da classe C ascendente, diagnosticou o cenário à “Agência Brasil”. “Uma possibilidade é que essa nova classe média seja a 'velha nova classe média'. Ela vem ascendendo há dez anos, são 40 milhões de pessoas que, talvez, queiram outras coisas além do ganho de renda e do trabalho, como educação de qualidade e de saúde”, declarou.

O coordenador regional da Associação Brasileira de Economistas pela Democracia (Abed), o economista Paulo Bretas, enxerga um ângulo parecido. “As manifestações de junho são típicas da classe média baixa e da classe média, que se sentiram excluídas. Ao mesmo tempo, a nova classe média queria mais. Ela teve conquistas no governo Lula e a Dilma, até então, tinha uma aprovação estupenda. Mas como ela perde em tão pouco tempo esse capital político? Perde pela inflação, pela crise econômica, porque a nova classe média queria mais e o governo foi incapaz de oferecer um projeto novo ao país, que continuasse incorporando-a aos ganhos sociais” resume.

2 - Dólar passa de R$ 2 e não retorna mais

Em 2013, os brasileiros assistiram ao dólar abaixo de R$ 2 pela última vez desde então. A cotação de venda mais baixa naquele ano foi registrada em fevereiro, R$ 1,96. Em junho, a moeda alcançou R$ 2,1367 — mas não teve saltos mensais significativos no restante do ano. A virada da cotação do dólar chegou em 2015, quando ele passou de R$ 3 e não baixou mais desse nível.

No caminho entre 2013 e a década seguinte, episódios de instabilidade se sucederam, o que contribuiu para a alta do dólar: além dos atos naquele ano, o país passou por uma recessão, o impeachment da ex-presidente Dilma, a pandemia e eleições polarizadas em 2022. “Houve percepção do mercado de que a política fiscal no Brasil era extremamente arriscada e vimos a relação da dívida do país e do PIB crescer muito fortemente. O fluxo de capitais estrangeiros diminuiu o dólar escalou para R$ 3, R$ 4”, analisa o coordenador do MBA de Gestão Estratégica e Econômica de Negócios da Fundação Getulio Vargas (FGV), Mauro Rochlin.

3 - Recessão começa em 2014

O Brasil terminou 2013 com o Produto Interno Bruto (PIB) 3% maior do que no final do ano anterior. A inflação ficou abaixo do teto e a taxa de desemprego ficou em 7,4% — em 2022, ela encerrou o ano em 9,3%. Mas logo o cenário mudaria de figura, com uma recessão iniciada no segundo semestre de 2014 e prolongada até o final de 2016.

A pandemia causou mais uma onda de recessão e, ainda agora, a recuperação da economia tem sido um caminho árduo, na visão do coordenador de Mauro Rochlin, da FGV. “A saída está sendo um tanto sofrida e dolorosa. O país não voltou a crescer de maneira mais dinâmica e vigorosa. Em 2021, houve um crescimento mais forte, mas muito devido à recuperação do período inicial de pandemia”, diz.

O especialista avalia que o momento não é um cenário fora da curva na história da economia brasileira. “Nos últimos 40 anos, com exceção do governo Lula [de 2002 a 2010], que teve contribuição decisiva do contexto internacional, não tivemos crescimento sustentado, só voos de galinha”, conclui.

4 - Passagem de ônibus subiu bem mais do que R$ 0,20

O primeiro ato de 2013, no dia 6 de junho, foi contra o aumento de R$ 0,20 da tarifa do transporte coletivo na capital de São Paulo. O então prefeito da cidade, Fernando Haddad (PT), recuou após a pressão e a passagem voltou a ser R$ 3. Ao longo dos dez anos seguintes, reajustes elevaram o preço para os atuais R$ 4,40 e a demanda por “tarifa livre” não foi atendida. Em Belo Horizonte, a passagem de ônibus custava R$ 2,80 em junho de 2013. Atualmente, é R$ 6.

Uma década de indicadores econômicos

Inflação anual medida pelo IPCA/IBGE

  • 2012: 5,84%
  • 2013: 5,91%
  • 2014: 6,41%
  • 2015: 10,67%
  • 2016: 6,29%
  • 2017: 2,95%
  • 2018: 3,75%
  • 2019: 4,31%
  • 2020: 4,52%
  • 2021: 10,06%
  • 2022: 5,79%
  • 2023*: 5,8%

Taxa de desemprego medida pelo IBGE

  • 2012: 7,4%
  • 2013: 7,2%
  • 2014: 6,9%
  • 2015: 8,6%
  • 2016: 11,7%
  • 2017: 12,9%
  • 2018: 12,4%
  • 2019: 12%
  • 2020: 13,8%
  • 2021: 13,2%
  • 2022: 9,3%
  • 2023:** 8,8%

Crescimento anual do Produto Interno Brunto (PIB)  

  • 2012: 1,9%
  • 2013: 3%
  • 2014: 0,5%
  • 2015: -3,5
  • 2016: -3,3
  • 2017: 1,3%
  • 2018: 1,8%
  • 2019: 1,2%
  • 2020: -3,3%
  • 2021: 5%
  • 2022: 2,9%
  • 2023:** 1,9%

*Projeção do Boletim Focus

**Dados parciais do primeiro trimestre do ano

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