No começo do ano passado, os mercados contavam com o programa de ajustes e privatizações de Jair Bolsonaro e do ministro da Economia, Paulo Guede, para finalmente deixar para trás os dois anos de recessão (2015 e 2016). As apostas iniciais eram de um crescimento do PIB de 2,5%. Mas o salto não aconteceu, apesar das taxas de juros em seu mínimo histórico e da aprovação, em outubro, da Reforma da Previdência, considerada essencial para melhorar as contas públicas. “São três anos de resultados positivos, mas o PIB ainda não anulou a queda de 2015 e 2016 e está no mesmo patamar do primeiro trimestre de 2013”, analisa Rebeca Palis, coordenadora das Contas Nacionais do IBGE.
Em novembro, o leilão de exploração do petróleo em águas profundas foi ignorado pelas maiores empresas do setor. “Foi um toque de realidade. O Brasil está passando por um período de transição. Não é em um ano que você consegue resolver o problema”, afirma Victor Beyrute, economista da Guide Investimentos. Trata-se de uma transição que exige muita paciência aos 11,9 milhões de desempregados e os 4,7 milhões de desalentados (termo usado para os que desistiram de procurar emprego por falta de oportunidades).
Este ano começou com expectativas de aceleração das reformas, com projeções de governo e mercado de um crescimento de pelo menos 2,4%. Contudo, a desaceleração do último ano e a epidemia mundial do novo coronavírus levaram aos consultores revisar suas projeções para o ano de 2020. Vários grupos bancários internacionais trabalham com a hipótese de que possa estar abaixo dos 2%. A consultoria Capital Economics, que já havia revisado a sua projeção de 2% para 1,5%, voltou a reduzi-la nesta terça, chegando a 1,3%. O Banco Central de Brasil afirmou na terça-feira que vai estudar uma nova queda da taxa básica de juros Selic na reunião de 18 de março devido ao impacto da desaceleração global provocada pela crise de saúde com a epidemia mundial do coronavírus.
Saque do FGTS e reforma da Previdência não ajudaram o esperado
O economista André Perfeito, da consultoria Necton, declarou que prevê “dois cortes adicionais (da Selic) este ano, de 0,5 ponto cada”. No quarto trimestre, o PIB cresceu 0,5% em relação ao trimestre anterior (quando havia crescido 0,6%) e 1,7% em relação ao mesmo período de 2018.
A Capital Economics estimou que “o crescimento trimestral relativamente robusto de 0,5% oculta uma forte perda de impulso no quarto trimestre”, durante o qual foram publicados índices ruins da indústria e do comércio. Em 2019 como um todo, a agricultura e os serviços cresceram 1,3%, e a indústria, 0,5%. O setor industrial foi afetado pela tragédia de Brumadinho provocada pelo rompimento da barragem da Vale. Houve uma queda na produção da indústria extrativa, que atrapalho o setor como um todo.
Na demanda, os motores foram investimentos em capital fixo (+2,2%) e consumo das famílias (+1,8%), enquanto as compras do governo caíram 0,4%. Fatores externos, como a guerra comercial entre China e EUA e a crise argentina, e internos, devido à instabilidade política gerada pelo Executivo, contribuíram para o resultado mais fraco em 2019. Também houve frustração em relação aos efeitos esperados com a aprovação da reforma da Previdência e a liberação de recursos do FGTS.
Coronavírus deve atrapalhar PIB de 2020
A redução da taxa básica de juros Selic para o seu mínimo histórico é uma das apostas para fomentar a atividade em 2020, mas os efeitos econômicos da epidemia de coronavírus e o efeito da instabilidade política no Brasil sobre a agenda de reformas aparecem como riscos para o crescimento neste ano.
Conforme análise recente divulgada pelo IBRE/FGV em seu Boletim Macro, os números do PIB mostraram que o consumo das famílias permanece como o principal combustível da recuperação no período pós-recessão, enquanto a carência de demanda no país concentra-se na falta de investimento. Para o instituto, fatores como a falta de uma nova rodada de reformas econômicas no Brasil e as incertezas geradas pela epidemia de coronavírus podem frustrar, mais uma vez, as expectativas de retomada mais forte da economia brasileira.