Abuso

'Maquiagem de preço' volta a assombrar os consumidores

Leis proíbem a manobra de reduzir peso e quantidade nas embalagens e manter o valor anterior

Por Lucas Negrisoli
Publicado em 23 de dezembro de 2019 | 08:11
 
 
 
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Há meses, o aposentado Paulo César Meyer vem anotando preços e quantidades de produto contidos nas embalagens do que costuma comprar nos supermercados de Carrancas, no Campo das Vertentes, onde mora. O motivo, explica, é que elas vêm diminuindo sistematicamente de tamanho, mas o valor cobrado se mantém. A caixa de bombom, que há alguns anos pesava 500 g, agora embala 251 g. O sabão para lavar roupa, que antes vinha em uma garrafa de 1 L, hoje é comercializado em embalagens de 900 mL. A barra de chocolate também diminuiu. E tudo isso, conta Meyer, sem redução alguma de preço. “Ninguém tem o hábito de reclamar. É complicado, demanda tempo, demora, e as empresas sabem disso e não estão nem aí”, desabafa Meyer.

A prática, conhecida como “maquiagem de produto”, é uma antiga companheira dos brasileiros e, mesmo após duas medidas no início dos anos 2000, uma portaria do Ministério da Justiça e uma lei estadual em Minas, terem tentado pará-la, continua a ser praticada. No Brasil, para que uma marca diminua a quantidade de produto tradicionalmente comercializado, é necessário que, na embalagem, estejam claros, destacados com letras maiores e cores diferentes, o tamanho original e a redução durante três meses. 

Em Minas, as garantias legislativas são ainda maiores, e há previsão de responsabilização, inclusive, de supermercados como coautores da prática. Se a embalagem de um produto diminui, o varejo mineiro precisa informar isso ao consumidor com placas próximo às embalagens, contendo todas as informações determinadas para o fabricante, por 120 dias corridos. 

Multas. A punição, prevista no Código de Defesa do Consumidor (CDC), é por via de multa, que varia entre R$ 700 e R$ 10,5 milhões, a depender do tamanho da empresa e das condições da prática ilegal. Também há previsão de “antipropaganda”, que ocorre quando a empresa é obrigada a se retratar publicamente ao consumidor com as informações corretas. 

Para Marcelo Barbosa, coordenador do Procon da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), a maquiagem de produto é uma prática abusiva por não passar claramente ao consumidor as informações que ele necessita para fazer a escolha de compra. “Garantir ao consumidor o direito básico à informação clara, precisa e especifica é uma obrigação das empresas. Não se pune a determinação do preço, visto que o mercado é livre, mas a informação ao consumidor é essencial”, diz.

Para não sair no prejuízo, é preciso atenção e acompanhar os preços nos supermercados, explica a economista do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim. “Às vezes, é tão absurdo que você se pergunta qual embalagem é mais mentirosa. É publicidade enganosa, muitas vezes. Notifique na frente do caixa, faça foto no celular e leve para o conhecimento dos Procons. Denuncie”, aconselha. 

Fique atento

Denuncie. O órgão aconselha que, ao se deparar com uma possível maquiagem de produto, você deve registrar e fazer denúncia no Procon. O telefone para contato é 3330-8100.

Transparência. Segundo os órgãos de defesa do consumidor, a proibição não afeta o livre mercado, mas garante informação ao consumidor.

Idec. Redução no volume costuma girar em torno de 20% a 30%

Fornecedor tem o dever de informar 

Os caminhos que levaram à criminalização da prática de maquiagem de produto nasceram em Minas, na virada da década de 1990 para os anos 2000, com o movimento das donas de casas, explica Ricardo Amorim, assessor jurídico do Procon do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). Primeiramente, pela desconfiança com o que era praticado nos supermercados, depois, com uma portaria determinada pelo Ministério da Justiça, passando por uma denúncia do Procon mineiro em 2006 e, finalmente, transformada em jurisprudência por decisão no Supremo Tribunal de Justiça em 2013.

“Se nós, como sociedade, temos o direito de ser informados, o fornecedor tem o dever de nos informar. Informação essa que deve ser diretamente para o consumidor, no sentido de manter a confiança entre os dois. É um movimento que surgiu da mobilização da sociedade e culminou, depois, em uma lei mineira”, ressalta Amorim. A ação, finalizada em 2013, multou em R$ 460 mil a Coca-Cola por a empresa ter diminuído de 600 mL para 500 mL o volume de refrigerante de suas garrafas sem informar corretamente ao consumidor o que havia feito. (LN)

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