As escolas estão por conta própria para criação de programas de desenvolvimento de habilidades sociais. O Ministério da Educação (MEC) afirma, por meio da assessoria de imprensa, que não existe nenhuma política voltada a incentivar esse tipo de projeto, que fica a cargo das secretarias de Educação de Estados e municípios. Na opinião do professor de inovação e empreendedorismo da Fundação Getulio Vargas/Faculdade IBS Wagner Cardoso de Pádua Filho, ao não estabelecer diretrizes para algo tão importante, o governo confunde autonomia com estratégia de gestão e eficiência.
“No Brasil, educação é considerado um segmento de tríplice poder entre município, Estado e União. No fim, ninguém manda, e não existe estratégia para definir diretrizes metodológicas educacionais. É um absurdo imaginar que, num país com mais de 5.000 cidades, todas sejam capazes de fazer sua própria política”, critica Pádua Filho.
Segundo a diretora da Tao Coaching, Raquel Couto, programas capazes de estimular habilidades são fundamentais para o mercado de trabalho e, se houvesse uma política pública, o acesso a eles seria mais democrático. “É uma falha do MEC, que deveria aguçar mais a sensibilidade das escolas para formar mentes voltadas para o crescimento, levando as crianças, desde cedo, a desenvolver senso crítico. Porque uma coisa é colocar as pessoas para pensar com respostas prontas, outra é ensinar a fazer as perguntas certas para resolver os problemas”, avalia.
Sem diretrizes unificadas, cada escola vai criando suas próprias estratégias. Em Minas Gerais, a rede estadual de ensino criou neste ano o Meu Primeiro Negócio, uma parceria das secretarias de Educação e de Ciência e Tecnologia. O objetivo é promover a cultura empreendedora ensinando conceitos de mercado, comercialização e livre iniciativa. Por enquanto, apenas 120 escolas adotam o projeto, em 70 das 853 cidades de Minas. A meta é atingir 700 escolas até 2018.
Com essa orientação William Alves, 17, criou um suporte para transportar o celular na bicicleta. “O objetivo é não andar com o celular no bolso, pois tem risco de assalto, ou ele pode cair”, conta o aluno do 3º ano do ensino médio da Escola Estadual Carlos Drummond de Andrade, no bairro Floramar, na região Norte de Belo Horizonte. Ele e outros estudantes da rede pública participaram da Feira Internacional de Negócios, Inovação e Tecnologia, que aconteceu neste mês.
O aluno do 9º ano de uma escola pública em Contagem, Marcelo Neto, 14, também conseguiu desenvolver seu próprio game, chamado “Caverna Amaldiçoada”, a partir de um curso que fez no Uaitec. Tanto Marcelo quanto William esperam vender suas ideias.
“Eu sempre falo que é inevitável a substituição do homem pela máquina. Por isso, inovação é tudo. Se não pensarmos em uma formação melhor, o Brasil terá sérios problemas de empregabilidade”, afirma o professor Pádua Filho.
Projeto
Saiba mais. O Meu Primeiro Negócio conta com 2.600 voluntários e atende 20 mil jovens imersos em uma jornada de educação empreendedora para facilitar o acesso ao mercado de trabalho.
Colégio simula ação das Nações Unidas
Lidar com conflitos e solucionar problemas é uma expectativa básica do mercado de trabalho. Para colaborar com a preparação do futuro profissional e criar uma geração com senso crítico, o Colégio Nossa Senhora das Dores desenvolveu o programa ONU Jovem, em que conflitos são apresentados e debatidos e soluções precisam ser propostas.
“É a simulação de uma reunião das Nações Unidas. Além de aprender sobre questões locais e de outros países, os alunos desenvolvem o senso de responsabilidade. Organizam tudo, desde a escolha dos temas à divisão dos grupos que vão formar os comitês”, explica o coordenador do ensino médio, Marco Aurélio Ferreira. A habilidade do relacionamento também é abordada. “Os alunos defendem a posição do país, mesmo quando não concordam. Então, aprendem a argumentar, sempre mantendo a postura, com muita educação”, afirma.
Autoconhecimento também é habilidade
A vice-reitora da Una, Débora Guerra, afirma que tão importante quanto liderança e empreendedorismo é a promoção do autoconhecimento. Ela destaca que tem sido comum os alunos chegarem à faculdade e acabarem desistindo do curso. Para reduzir a evasão, que, segundo ela, chega a 20% no primeiro ano de curso, o desafio também passa por mudar a cultura das instituições.
“É muito importante investir em capacitação, para que os profissionais estejam preparados para esse novo perfil dos alunos e consigam mudar a postura na sala de aula, mais dinâmica. Assim como é fundamental desenvolver programas que ajudem os alunos a desenvolver projetos de vida, para se engajar naquela profissão, entender bem como ela funciona”, destaca.
Ir além
“Não basta fazer oficina de ideias, pois isso é pontual. Tem que fazer entender o conhecimento e para que ele serve, de forma crítica e analítica. Esse é o caminho para preparar os futuros talentos para inovar lá na frente.”
Wagner Pádua
Professor de inovação e empreendedorismo da FGV/IBS
“Quando se fala em pensamento crítico, é você fazer com que as pessoas se conheçam, se relacionem, aceitem e respeitem as diferenças. Isso é muito importante.”
Fernanda Schroder
Gerente de Carreiras do Ibmec
“Temos trabalhado muito a capacitação dos professores, para que a mudança comece na sala de aula, trazendo problemas reais para desenvolver trabalho em equipe, liderança e resolução de problemas.”
Débora Guerra
Vice Reitora da UNA
“Tem que ter proximidade com o nosso dia a dia. Não deve ser só estudar para o Enem.”
Rafael Câmara
Aluno do Ensino Médio