Leis

Terceirização tem controle constante em vários países

OIT aprova relação de trabalho, mas pede que governos limitem

Por Queila Ariadne
Publicado em 02 de abril de 2017 | 03:00
 
 
 
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A terceirização já era permitida no Brasil, mas apenas para funções que não faziam parte da atividade-fim da empresa. Para justificar a lei sancionada na última sexta-feira, que vai permitir a empresa terceirizar empregados para qualquer setor, o governo federal argumenta que outros países já permitem essa flexibilização. Entretanto, de acordo com o professor de direito do trabalho do Ibmec/MG Flávio Carvalho Monteiro de Andrade, em grande parte dos países, há limites. Nos Estados Unidos, por exemplo, segundo ele, a estrutura era semelhante ao que era no Brasil antes da sanção da nova lei, com limitação da contratação por setores e atividades.

Para o presidente da Associação Mineira dos Advogados Trabalhistas (Amat) Marco Antônio Oliveira Freitas, é difícil comparar o Brasil com países desenvolvidos. “Alemanha, Japão e Estados Unidos permitem terceirização, mas lá eles oferecem condições de trabalho e salários mais dignos aos trabalhadores”, reforça.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT), em um documento chamado “A experiência internacional e a perspectiva das normas internacionais do trabalho sobre terceirização”, reconhece que o trabalho pode ser revestido de formas contratuais variadas, como a terceirização (enquadrada pela organização como uma forma atípica de emprego), mas defende a regulamentação por parte das empresas e do governo.

“O objetivo não é que todo o trabalho se ajuste ao modelo típico, mas que todos estejam no conceito do trabalho decente. É preciso, portanto, que as formas atípicas de emprego sejam regulamentadas com o objetivo de equilibrar as necessidades dos trabalhadores, das empresas e dos governos”, diz o documento, assinado pelo diretor do escritório da OIT no Brasil, Peter Poschen.

A OIT entende que a presença de política públicas é fundamental para a proteção do trabalhador, pois, em caso de crise, os terceirizados estão mais sujeitos à demissão, por exemplo. No relatório, Poschen lembra o que aconteceu na crise dos Estados Unidos, há nove anos. “Nas flutuações ou crises econômicas, os contratos atípicos são os primeiros a serem afetados. Por exemplo, na recessão de 2008 e 2009 nos Estados Unidos, apesar de ser menos de 2% da força de trabalho, os trabalhadores temporários contratados através de agência representaram 10,6% da perda dos empregos”, lembra o diretor da OIT.

Poschen ressalta ainda que a insegurança existe também no emprego típico, mas é menor que no emprego atípico (subcontratações). “Para que os trabalhadores nas formas atípicas de emprego, dentre elas a terceirização, não enfrentem a insegurança, é preciso uma série de medidas garantidoras que perpassem pelos trabalhadores, empresas e governos”, enfatiza.

Como exemplo, Poschen destaca que o Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico e Trabalho na África do Sul desenvolveu um Código de Boas Práticas tripartite em 2006, com princípios claros para determinar o status de emprego.

“As políticas de contratações públicas podem constituir um instrumento útil para garantir o respeito aos direitos laborais na subcontratação. Os países que dispõem de tais disposições, especialmente para evitar um aumento dos acidentes de trabalho e doenças relacionadas, incluem Israel, Austrália, numerosos Estados dos Estados Unidos e membros da União Europeia”, diz o documento da OIT.

Garantia. O ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, disse que o terceirizado terá garantias de seus direitos: carteira assinada, salário básico estabelecido em convenção coletiva, FGTS e 13º.


OIT recomenda

Medidas para garantir trabalho decente na terceirização: 

Regulamentação legislativa, evitando vazios legais. Incluir igualdade de tratamento, regular horas de trabalho, limitar a utilização das formas atípicas de emprego e garantir acesso à liberdade sindical e ao direito de negociação coletiva;
Formular políticas sociais ;
Responsabilidade compartilhada: distribuir deveres e obrigações de trabalho e de emprego entre as diferentes partes envolvidas


Reforma deve gerar dúvidas

O governo federal sancionou a reforma trabalhista sem salvaguardas para o trabalhador, com o argumento de que a flexibilização da terceirização vai aumentar a segurança jurídica e fomentar novas contratações. Entretanto, alguns especialistas acreditam que acontecerá exatamente o contrário. “Mesmo com a aprovação da nova lei que permite terceirizar a atividade-fim, as outras leis previstas na CLT e na Constituição não serão revogadas e, portanto, teremos mais questionamentos e mais processos trabalhistas e a Justiça do Trabalho é quem vai decidir”, avalia o professor de direito do trabalho do Ibmec/MG Flávio Carvalho Monteiro de Andrade.

O presidente da Associação Mineira dos Advogados Trabalhistas (Amat) Marco Antônio Oliveira Freitas ressalta que a reforma trabalhista que deve ser votada este mês não anula as leis que já vigoram. “Esse projeto da reforma é originalmente de 1998. Lá atrás, ele tratava apenas de contratos temporários, aí embutiram a terceirização. Se realmente for sancionado, vai ter muita polêmica. Ele traria segurança jurídica se viesse regulamentar a terceirização e definir o que pode e o que não pode. Entretanto, se uma empresa puder demitir um setor inteiro e terceirizar a mão-de-obra, ele vai contratar uma empresa que vai oferecer o emprego para os mesmos trabalhadores demitidos, só que pagando menos, ou seja, vai precarizar as condições de trabalho”, observa.

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