Nos primeiros meses do ano, ele surge ainda mais suculento nos hortifrútis. Ou, antes, até nos quintais mineiros, já que o quiabo faz parte da gastronomia regional há séculos, e muitos ainda mantêm o hábito de cultivá-lo em casa. Tanta familiaridade pode levar a um equívoco: a ideia de que o fruto seria natural das Américas. Na verdade, é originário da África e, certamente, chegou por aqui pelas mãos de escravos.
Por esse motivo, talvez, muitas vezes ele foi relegado a segundo plano. No entanto, o panorama mudou, e, com mais chefs defendendo a culinária local, o quiabo tem aparecido com mais frequência nos restaurantes de BH. Logo, não se restringe mais a poucos preparos, como em sua combinação mais célebre, com frango caipira e angu.
Nos restaurantes japoneses, como o Akemi e o Udon, o quiabo surge em robatas, combinado a molhos asiáticos. No OssO – Mind The Bones, o chef Djalma Victor também buscou em uma forma popular da culinária oriental nova opção de fazê-lo: em tempura, ou seja, envolto em uma polme (massa de consistência mole) e frito. Por lá, o fruto também apareceu no arroz preguento de leitão e queijo coalho, misturado ao espaguete e, por último, com um peito de boi defumado. “Já fiz de tudo com o quiabo. Não consigo pensar em algo que não combina com ele: vai bem na salada, na carne de porco, no frango, no boi. Pode-se fazer um picles com peixe, um arroz com suã”, comenta o chef.
O chef da Borracharia Gastrobar, Jaime Solares, também elogia a versatilidade do fruto. “Ele ainda nos dá possibilidade em pratos vegetarianos”, comenta. “Creio que o quiabo ganhou esse destaque em função da atuação da chef Roberta Sudbrack (do Rio de Janeiro). Ela trouxe esse lado mais nobre com o caviar de quiabo, por exemplo”, diz.
Baba. Algo comum tem acontecido ao quiabo ao transpor as barreiras das cozinhas caseiras para as profissionais: sua baba tem sido preterida. “A ausência da baba é hoje uma tendência, já que as pessoas têm repulsa a ela. Um segredinho para cortar a baba é adicionar umas gotinhas de limão ou outro item ácido”, ensina a chef executiva do Patuscada, Juliana Franco.
Outra boa alternativa é grelhá-lo, ensina Djalma Victor. “Quanto mais forte o fogo, melhor para não babar. Eu, particularmente, gosto dele de qualquer jeito. Na verdade, depende muito do prato: se quero engrossar um molho, por exemplo, coloco o quiabo para babar”, comenta. Ao grelhá-lo, o chef explica que o ideal é não deixá-lo muito macio. “Ele precisa ficar ao ponto, senão perde a textura”, diz.
Já n’A Pão de Queijaria, ele também é grelhado antes de ir como recheio em um pão de queijo, ao lado do frango empanado (na farinha de pão de queijo) e do molho picante. “Por mais que seja difundido em Minas, o quiabo é polêmico, muita gente não gosta. Nós fazemos questão de trabalhar não só com o que vende mais, mas com produtos que mostrem o nosso conceito, por isso criamos esta receita”, diz o sócio Mário Santiago. Para garantir a crocância do quiabo, ele é preparado na chapa, mas Santiago explica que dá para montá-lo em casa, em uma panela de ferro. “É só cortá-lo ao meio, colocar um bom azeite e deixar alguns minutos”.
Mercado. Santiago dá outras dicas importantes a quem deseja usar o fruto. “Para escolher o quiabo, é importante que ele não seja fibroso demais. A dica de forçar a ponta é válida: se ela quebrar ou ceder fácil, ele está bom”, explica.
Porém, o chef Rafael Tochetto, do restaurante Campagne, sabe que muitos feirantes não ficam satisfeitos com essa técnica. Por isso, também ensina o método de observação. “Eu prefiro os quiabos menores e mais escuros”, explica. Em seu estabelecimento, um dos pratos onde o fruto é fundamental é no Arroz do Norte, preparo feito com arroz para risoto, feijão andu, carne de sol, pequi e coentro.
Assim como nas receitas de A Pão de Queijaria e do Campagne, a chef executiva Juliana Franco, do Patuscada, também referenciou-se na cozinha mineira. No caso dela, em uma receita específica que sua avó materna fazia, quando ela vivia em São Gotardo, na região do Alto Paranaíba. A sugestão de entrada que está no menu há uma semana é um porquinho prensado com purê e quiabo. “A carne de porco é preparada por longas horas, a baixa temperatura. Minha avó fazia uma mistura parecida, mas refogada. No meu prato, o quiabo, por exemplo, é levado no vapor por três minutos, dou um choque térmico e selo para dar cor e textura”, afirma.
Juliana reforça que dá para inventar com o quiabo, mesmo sem equipamentos modernos à mão. “Você pode ferventá-lo em água e depois dar um choque térmico, cortar e selar na frigideira; fritá-lo em imersão; misturá-lo no arroz branco; assar aberto com azeite e sal – não vai ficar bonito, mas vai ficar uma delícia. O quiabo é nosso, é cheio de vitaminas, e temos que explorá-lo”, resume.
Serviço
A Pão de Queijaria. R. Antônio de Albuquerque, 856, Savassi, (31) 2512-6360.
Borracharia Gastrobar. Av. Afonso Pena, 4.321, Serra, (31) 2127-4321.
Campagne Restaurante. Estrada Fazenda do Engenho, 1.163, São Sebastião das Águas Claras, Nova Lima, (31) 3547-7273.
Olga Nur. R. Curitiba, 2.202, Lourdes, (31) 3566-1851.
OssO – Mind The Bones. R. São Paulo, 1.984, Lourdes, (31) 3292-8235.
Patuscada. Av. Bernardo Monteiro, 1.548, Funcionários, (31) 3213-9296.