Após celebrar a conquista da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), em 2013, Josiane Souza Reis, então com 30 anos, passou a lidar com a ansiedade. Recém-aprovada em exames técnicos, ela se via imobilizada ante o volante. “Eu sentia medo. Medo que o carro morresse, medo de bater em algum outro carro, medo de atropelar alguém”, lembra, dizendo que, algumas vezes, não conseguia nem dar a partida no automóvel. 

Josiane sofria com a amaxofobia, distúrbio que impede que mesmo pessoas aptas não consigam dirigir. “Em geral, essa queixa é manifestada por mulheres adultas ou idosas. É esse o público que atendemos na maioria das vezes”, expõe o instrutor de trânsito Graziani Tavares, que há seis anos está à frente da clínica-escola Dirigindo Bem, no bairro Caiçara, na região Noroeste de Belo Horizonte. 

O empresário estima que, a cada dez pessoas que buscam ajuda para superar o transtorno, apenas dois sejam homens. “Noto que alguns podem até manifestar, em alguma medida, o receio da direção, preferindo pegar carona ou recorrer a motoristas de aplicativo ou ao transporte público. Mas, mesmo assim, muitos evitam buscar ajuda porque podem se sentir envergonhados, porque ainda está enraizada aquela ideia de que o homem ‘tem no DNA’ a capacidade de dirigir, como se fosse um processo natural, o que não é verdade”, sublinha Tavares. 

A terapeuta Fernanda Costa, autora do e-book e do curso virtual “O Segredo de Dirigir”, expõe que, também em sua experiência, a maioria dos alunos é de mulheres. Em parte, ela atribui o fenômeno a um componente cultural. “Enquanto eles são estimulados desde criança a dirigir, elas escutam que o lugar delas não é esse”, comenta. Algumas, portanto, acabam introjetando falsas crenças de uma suposta imperícia feminina natural ao volante.  

E também nas atividades online, a presença masculina aparece mais timidamente. “Os homens, além de minoria, são os que menos interagem. Percebo que há uma vergonha de estar naquela posição”, avalia. 

Curiosamente, Fernanda expõe que grande parte das mulheres costuma buscar ajuda para superar a amaxofobia quando sente a necessidade de prestar assistência para alguém. “Normalmente, estamos falando de mães que, aos 35 anos, querem dar melhor suporte para os filhos e ter condições de os levar para a escola e para outras atividades”, detalha. Ela própria conta que evitou dirigir por 22 anos. “Eu inventava todas as desculpas para evitar a direção e tinha muita vergonha de ter esse medo. Quando comecei a estudar desenvolvimento pessoal, entendi que estava me sabotando e que o problema não era o carro em si, que o problema era anterior a sentar no banco do motorista”, lembra. 

Como é exposto no relato de Fernanda, o problema, para além do entrave funcional, se desdobra em sofrimento e impacta a autoestima. Foi também o que sentiu Josiane. “Nesse período, eu dependia do meu marido para tudo, para ir a algum lugar ou para levar meu filho para os compromissos dele”, comenta a analista financeira. Em 2019, ela iniciou tratamento para superar a fobia de estar ao volante. “Hoje, eu vou para todos lugares, dirijo qualquer carro – e não somente o meu – e, no volante, viajo com minha família”, comemora. “É mais do que dirigir, sabe? Isso fez que eu me sentisse mais capaz, mais dona de mim”, reforça. 

Técnicas ajudam a superar temor 

Foi a partir da própria vivência e de outras histórias compartilhadas com ela que a coach Fernanda Costa desenvolveu uma técnica para a superação da amaxofobia. 

“Eu entendi que esse medo é uma resposta fisiológica do corpo. Isto é, se acreditamos que estamos em perigo, o cérebro vai emitir comandos, e o corpo vai liberar substâncias que vão fazer com que a gente fuja daquilo. É um mecanismo de sobrevivência, que é irracional”, detalha. A solução, portanto, passa pela racionalização daquela situação. “É importante que a pessoa mude de postura, pois, se ela já parte do pressuposto que estará em perigo, qualquer pequena falha ou qualquer buzinada ganha grandes proporções”, diz. 

Na mesma linha do que indica a terapeuta, Graziani Tavares pontua que a pessoa que tem medo de dirigir deve buscar superar esse obstáculo paulatinamente. “Na clínica-escola, primeiro levamos o sujeito para aulas em um circuito, para que a pessoa aprimore a técnica e desenvolva mais autoconfiança. Depois, aos poucos, vamos indo para as regiões mais movimentadas da cidade”, informa, lembrando que as aulas não dispensam o acompanhamento psicológico para o tratamento da fobia. “Uma profissional que segue a abordagem cognitivo-comportamental atende nossos alunos para os ajudar a entender a raiz desse receio e a superá-lo”, diz. 

Tavares lembra ainda que o medo de dirigir pode ter múltiplas origens. Pode ter sido desencadeado por um trauma, como ter vivenciado ou presenciado um acidente de trânsito. A fobia também pode aparecer como uma resposta à sensação de perigo constante e à percepção de que estar em trânsito é sinônimo de estar em um ambiente amplamente agressivo. 

Características de personalidade também podem contribuir para o desenvolvimento do distúrbio. “As pessoas perfeccionistas podem ter muitas dificuldades. No caso delas, o que é um simples erro de marcha pode virar uma tragédia pessoal. E aquelas pessoas que se doam muito ao outro também podem ficar paralisadas pelo medo de atropelar algo ou alguém”, analisa Fernanda. 

Dicas 

A terapeuta Fernanda Costa sugere que pessoas com amaxofobia busquem criar, no interior do veículo, uma atmosfera segura. “Podemos colocar uma foto ou uns penduricalhos que possam deixar aquele espaço mais aconchegante e, com isso, nos deixar mais seguras”, opina.

Outra estratégia é dar nome ao carro. “Pode parecer uma coisa boba, mas é algo que ajuda muito porque, então, aquilo deixa de ser um bicho de sete cabeças e se torna algo mais pessoal”, sugere.

“E, por fim, é importante substituir aquela pergunta do ‘por que eu sou assim?’, que nos coloca em posição de vítimas, pelo ‘como posso mudar esse comportamento?’, que nos empurra a buscar uma solução”, conclui.