Pânico total. Este foi o sentimento que tomou conta do fotógrafo Samarone Alcântara Soares, 36, ao perder o emprego no começo do ano passado, em meio a um dos piores cenários financeiros de todos os tempos.
“Ficar sem trabalho logo no início da pandemia foi muito complicado. Eu tinha acabado de voltar de férias e não estava preparado para sofrer esse baque. Fiquei muito preocupado e inseguro sobre como iria pagar minhas contas”, recorda.
Com anos de experiência em gestão e operação de eventos, Soares precisou arrumar uma solução imediata para não deixar a falta de dinheiro influenciar sua saúde mental e vida familiar. A salvação foi apostar em seu instinto empreendedor.
“Eu comecei a fazer pães e bolos por encomenda, mas vi que precisava de algo a mais. Foi quando decidi cuidar de plantas e fazer kokedamas para vender online”, conta ele.
O negócio deu certo e ajudou Soares a mudar sua realidade financeira. “Não tenho nenhum lucro exorbitante, mas já consigo honrar meus compromissos e contribuir dentro de casa. E isso me deixa muito aliviado”, confessa.
Segundo especialistas, a incerteza financeira é uma das principais causas de depressão e estresse, especialmente em um momento de pandemia global.
“A falta de dinheiro para algumas pessoas pode ser o início de crises de depressão e até pode levar à síndrome do pânico”, alerta a psicóloga Gislene Maria Dias da Rocha. “Por isso, é preciso viver dentro do que se ganha e de preferência guardando uma reserva para os tempos ruins”, aconselha.
Entretanto, muitos brasileiros têm dificuldades para manter o orçamento em ordem e só resolvem cuidar da vida financeira quando estão no sufoco.
“As famílias deveriam criar mecanismos de controle orçamentário como se estivessem administrando uma pequena empresa e ter como foco o seguinte: gastar menos do que ganham”, salienta Mauro Henriques, mestre em economia e políticas públicas pelo Instituto Universitário de Lisboa.
Educação financeira é essencial
Henriques destaca também que a pandemia do novo coronavírus escancarou de vez a importância da educação financeira no dia a dia das pessoas.
“A pandemia criou um alerta em grande parte das famílias brasileiras – principalmente as que conviveram e convivem de perto com o desemprego –, de que é necessário constituir reservas e se programar para enfrentar qualquer situação orçamentária. Para isso, é preciso ter um conhecimento básico de como administrar as rendas para evitar transtornos em horas extremas”, prega.
Jornalista e mestre em ciências econômicas pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Priscilla Mundim concorda e diz que o ensino financeiro deveria ser uma realidade nas salas de aula do Brasil.
“Esta é uma temática que nunca foi ensinada nas escolas do país. A gente teve aula de tudo: português, matemática, química, física e várias outras disciplinas, menos as noções básicas de administração do nosso dinheiro”, lamenta ela.
“Infelizmente, tem gente que só percebe a necessidade de buscar conhecimento nessa área quando está enfrentando alguma crise financeira, desempregado ou dependendo da ajuda de outras pessoas para honrar seus compromissos”, expõe a especialista, acrescentando que a escola poderia, de fato, ensinar as pessoas a verem o dinheiro como uma questão de cidadania e não apenas como problema.
“Quem tem educação financeira conhece o próprio orçamento de forma detalhada, realiza mais sonhos e tem ferramentas para enfrentar os imprevistos da vida”, complementa.
Mas Priscilla diz que é possível aprender princípios de educação financeira também fora do ambiente escolar.
“Hoje se encontra informação em toda parte. Não tem porque não se investir em conhecimento. O caminho para vencer a ignorância financeira é trabalhar o autoconhecimento e ter vontade de aprender. Só assim as pessoas vão poder lidar com suas finanças de maneira sóbria”, orienta.
Emprego x felicidade
Se por um lado a pandemia exacerbou alguns conflitos financeiros para muita gente, ela também expôs outra realidade: a do excesso de trabalho, sofrimento e falta de reconhecimento de muitos profissionais.
Impulsionados por crises depressivas causadas pelo estresse no emprego, muitos têm ignorado o momento de instabilidade econômica global e considerado até pedir demissão.
“O cenário atual de pandemia, somado ao desequilíbrio monetário e político, tem afetado muito a saúde da população”, ilustra a psicóloga e psicanalista Andrea Libanio.
Ela explica que a nova realidade profissional imposta pelo isolamento social tem levado muita gente a enxergar o trabalho como uma fonte de angústia.
“Está sendo muito comum ver pessoas com problemas de hipertensão, angústia, crises de pânico, ansiedade e depressão buscarem ajuda psicológica. Vivemos um momento de insegurança, e é praticamente impossível nos blindarmos dele. Para muitos, uma crise pode ser oportunidade, momento de se ver e crescer, mas para outros, um fator de adoecimento”, acrescenta Libanio.
O professor e analista comportamental Leopoldo Guzmán menciona que, embora o problema de desequilíbrio mental e ansiedade no meio profissional atual seja preocupante, é preciso ter calma antes de se tomar qualquer decisão importante.
“É fato que o isolamento social está trazendo à tona muitas emoções e que muita gente está infeliz no trabalho. Porém, é necessário avaliar com cuidado sua realidade para descobrir o que realmente está causando esses sentimentos”, sugere o educador.
Para ele, a pandemia tem feito as pessoas viverem as situações do cotidiano de forma mais intensa do que de costume, e isso pode influenciar nossas percepções sobre tudo ao nosso redor, inclusive o trabalho.
“Todos temos dias ruins, e muitas vezes até ficamos frustrados com nossos chefes e colegas de trabalho. Mas é necessário manter a cabeça fria sempre, pois ficar desempregado também tem efeitos negativos, que podem acentuar ainda mais nossas crises”, aponta Guzmán.
Ele enfatiza que o segredo é buscar ajuda de um profissional em casos de esgotamento mental e tentar avaliar a situação com cuidado antes de pedir demissão.
“Se fizermos tudo de forma racional e com um plano bem-estabelecido, é possível evitarmos qualquer desgaste emocional”, aconselha. “O importante é estar feliz com as suas escolhas”, arremata.
Confira algumas dicas para fugir da crise financeira e depressão
* Gaste menos do que você ganha. Parece óbvio, mas tudo começa nesse fundamento.
* Conheça seus gastos. Relacione todas as suas despesas e tenha controle do seu dinheiro.
* Cuidado com o cartão de crédito. Lembre-se de que cartão não é uma renda complementar, por isso é importante entender como usá-lo. Anote todas as despesas realizadas no cartão para controlar a qualidade dos seus gastos.
* Relacione todas as suas dívidas para saber se estão em dia. Parcelas atrasadas? Renegocie com as empresas credoras e estabeleça um plano de pagamento.
* Crie uma reserva de emergência. Guarde mensalmente entre 5% e 10% do seu salário.
* Estabeleça metas de curto, médio e longo prazo.
* Coloque tudo na ponta do lápis. A crise financeira e a depressão também têm relação com a pandemia. Para evitar se afundar em problemas com dinheiro, é essencial ter um controle completo sobre suas finanças. Por isso, tome nota de todos os seus ganhos e gastos (fixos e variáveis).