A qualidade do sexo foi a primeira coisa que chamou a atenção da advogada Manuela*, de 49 anos, quando ela conheceu o último homem com quem se relacionou. À época solteira, ela acabou levando a relação adiante principalmente porque se sentia satisfeita sexualmente. Com o avanço dos meses, porém, o namoro que trazia satisfação na cama se provou completamente diferente fora das quatro paredes. Brigas, manipulação e mentiras eram parte de uma rotina que, entre idas e vindas, durou quatro anos.
“Como a mulher sempre foi mais reprimida sexualmente, ela acha que nunca vai encontrar outro parceiro igual àquele, que a faça se sentir realizada. E, por isso, se submete ao lado horrível de conviver com uma pessoa que é totalmente estranha a seus hábitos, como era a minha relação”, conta a advogada. Em um namoro que hoje enxerga como tóxico, Manuela lembra que constantemente se sentia manipulada. “Ele sabia que eu não gostava dele, mas tinha ciência da minha insegurança enquanto mulher”, diz. A crença de que poderia aprender a gostar do parceiro ou fazê-lo mudar também fez com que a relação se prolongasse.
Mas a satisfação sexual não foi suficiente para que o relacionamento perdurasse. Hoje, quando olha para trás, ela avalia que não existia, de fato, uma relação de amor, mas sim de dependência. “Depois que terminei, consegui observar, através da terapia, que era um relacionamento marcado por um abismo enorme. Éramos totalmente diferentes nos gostos, na idade e tínhamos culturas e valores tão distintos que não existia diálogo entre nós, sendo o sexo a única coisa que realmente me prendia”, confessa.
Embora o relacionamento de Manuela não tenha dado certo, existem possibilidades de reverter a situação mesmo quando o sexo se torna o único momento de união entre o casal. É isso o que explica a sexóloga Enylda Motta. “É preciso que sejam buscados meios para se conectar novamente. Quando o sexo acaba e era o único ponto de prazer e conexão, o ideal é que o casal pare para conversar e perceba que outros pontos existem no relacionamento e que são importantes de serem fortalecidos”, pontua. “Talvez seja uma busca como no início de um namoro, com conquista, sedução, cinema, jantares”, observa.
Conforme a especialista, é importante que o casal desenvolva atitudes, sentimentos, emoções e diálogos para que o relacionamento funcione sem o sexo. “Podemos entender o amor como um afeto e o sexo como algo que não depende do amor”, afirma.
Refletir sobre o que não está dando certo também é outra orientação dada por ela: “Tudo que envolve prazer é bom, saudável. Outras áreas da vida da pessoa – como a social, espiritual, familiar, amorosa e até mesmo o trabalho – podem ser tão prazerosas quanto o sexo. O importante é perceber a entrega para cada um desses campos e, se algo não estiver sendo prazeroso, parar e repensar”.
Mas o sexo pode, também, trazer ensinamentos e potencializar outras áreas da relação. “Ele proporciona o fortalecimento de vínculos, entrega, prazer. Ao vivenciar a relação sexual, existe a entrega do mais íntimo da vida da pessoa, o corpo e o sexo. Além disso, a relação sexual apresenta abertura para o diálogo, seja sexual ou não, e, com isso, o relacionamento se torna saudável, uma vez que, quando surgirem os problemas, o diálogo está fortalecido”, observa Enylda.
(*Nome fictício)
Sexo é importante, mas não é tudo
Um estudo desenvolvido por pesquisadores da Califórnia, nos Estados Unidos, decidiu avaliar, a partir de dados de quase 12 mil casais disponíveis em 43 bancos de dados de 29 laboratórios diferentes, quais fatores fazem com que um relacionamento tenha sucesso.
Publicada em 2022 na revista “Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America” (PNAS), a pesquisa demonstrou que a satisfação sexual é apenas um dos campos que podem ajudar a prever o êxito de uma relação amorosa. Conforme o estudo, a forma como o casal vê o relacionamento é o fator mais importante para o sucesso dele.
Segundo os dados analisados, os julgamentos das pessoas sobre a relação em si, como quão satisfeitas e comprometidas se sentiam com seus parceiros ou quão gratas se sentiam por eles, explicaram cerca de 45% da satisfação gerada pelo relacionamento.
Indicadores sobre o nível de intimidade, gratidão e a própria percepção da satisfação do outro – além da satisfação sexual – também foram fatores encontrados pelo estudo como “preditores específicos do relacionamento”, ou seja, aquelas características que influenciaram o sucesso ou não da relação.