Atualmente restrito aos grandes consumidores como as indústrias, o mercado livre de energia elétrica deve ser expandido para todos no país com a aprovação de uma legislação para o setor. É o que promete o relator da comissão que discute o Código Brasileiro de Energia Elétrica, deputado federal Lafayette Andrada (Republicanos), que foi o entrevistado desta sexta-feira (11) na Live do Tempo. O parlamentar declarou ainda que a expectativa é que o texto seja votado no início do ano que vem. O principal objetivo é organizar as atuais normas para o setor e dar segurança jurídica para destravar em até três vezes os investimentos na área. Confira abaixo o conteúdo na íntegra:
Qual é o principal objetivo da criação do Código Brasileiro de Energia Elétrica?
O setor energia movimenta o país, todo mundo precisa da eletricidade nas atividades diária. O microondas precisa de energia, vai para o hospital e é preciso da energia. Ela está na nossa vida e o setor é crucial para a existência do país. É uma confusão imensa a quantidade de normas que regem as empresas de energia, às vezes um mesmo tema é assunto de uma lei, decreto, mas posteriormente foi modificado, revogou uma parte do anterior, saiu algo novo para tratar de um mesmo assunto. Há um conjunto enorme de normas. Não temos segurança jurídica, clareza. Como consequência, o sistema elétrico é uma dos que mais tem processos judiciais, sendo que muitas vezes os próprios juízes têm dificuldade de julgar. O novo código vem para sistematizar esse conjunto de leis, capítulo por capítulo. Com isso, vamos poder ter transparência e segurança jurídica, que é tudo que não temos hoje no setor. Quando tivermos, muitos vão investir. E finalmente conseguiremos baratear a conta de luz. O Brasil é um país rico em energia, tanto do sol, vento, rios, gás, biomassa. Temos todas as fontes de energia e mesmo assim possuímos uma das contas mais caras do mundo.
Como relator do código, qual o principal ponto defendido no texto e a mudança mais profunda que será trazida?
O projeto ainda vai sofrer modificações, mas ele têm 407 artigos. E desse total, 70% é uma simples organização do que já existe, retirando os pontos conflitantes da legislação. Os demais 30% são novidades na lei. A principal delas é a modernização do setor, buscando que as pessoas migrem para o mercado livre. Existe um mercado regulado e o livre. A nossa conta residencial de luz é a do mercado regulado, não temos opção de escolher uma outra empresa. O consumo acontece e, no fim do mês, vem a conta da Cemig, por exemplo. Atualmente, o mercado livre é só para grandes consumidores, que podem comprar a energia de onde quiserem, olham onde está mais barato e compram em leilão. Tem um projeto no Senado que trata muito sobre isso, incorporado no código, que é fazer essa migração das pessoas do mercado regular para o livre. Esse é o fundamento do outro projeto, incorporado. Tem novidades, um capítulo que trata da recarga de bateria, já prevendo o carro elétrico que virá, com as norma definidas. Também estamos colocando uma parte que normatiza a minigeração distribuída. São os painéis solares nas casas. Hoje,não há uma lei que regula isso. O outro é a geração de renda através da venda de energia. Vem substituir parcialmente o Bolsa Família através da produção de energia.
Quase metade do preço das contas de luz é relativo aos encargos, tributos, perdas, subsídios e investimentos. Como tornar o mercado livre com o peso dessa lista?
O Brasil é um país que domina a energia barata, mas tem uma conta muito cara. O conjunto de encargos, subsídios e tributos pode chegar a quase 60%. É preciso cortar esses subsídios e encargos para baratear a conta de luz. Estamos tratando de reduzir o peso desses valores. Quanto aos impostos, isso será discutido na reforma tributária. Sobre os encargos, estamos reduzindo muito. O objetivo é baratear a conta de luz. Quando oferece uma boa legislação e segurança jurídica, naturalmente a conta vai dimunuir.
Como alinhar a concorrência de preços com a carga tributária elevada e o maior custo de fontes complementares, sobretudo eólica e fotovoltaica?
O principal ponto é essa parte de encargo e subsídio. Estamos trabalhando em uma ferramenta que propomos no Código. O Brasil tem várias matrizes energéticas, como o gás, sol, vento, os rios. É preciso separar as fontes de energia, aquelas chamadas renováveis, como a eólica, biomassa e solar, das ditas não renováveis, que são as hidráulicas, termelétricas, nuclear. E no mercado livre, todas as pessoas podem adquirir energia é que quiser, mas que seja obrigada a adquirir desse mix, que seria composto da seguinte maneira. O Ministério de Minas e Energia sabe quanto de energia cada fonte gera. Cerca de 25% de toda a energia gerada são dessas renováveis e 75% das grandes hidrelétricas e termelétricas. E subsídios e encargos existem para tornar as fontes competitivas entre si. No mercado livre, vai olhar o preço da energia, independente de qual seja. Acontece que as fontes têm custos diferentes e não é interessante deixar de ter um fone ou trocar por outra. Poderia acontecer das fontes disputarem entre si, engolindo uma com a outra. Um exemplo é a termoelétrica, que é mais cara que a fotovoltaica, mas tem atributos que uma não tem, não pode deixar de ter todas. Vai estimular a concorrência, mas preservando todas as fontes, a nossa própria matriz. São poucos os países que tem variedade de fontes de energia como a nossa e temos que preservar isso. Quando separa esses núcleos, dá para tirar subsídios e encargos, estimular a competição e conseguir diminuir a conta de energia. Para estimular o setor, tem que diluir o custo. 40% da conta é relativa à energia, e o restante são encargos e tributos. A parte dos tributos, que corresponde a 25% da sua conta, vai ser tratados na reforma tributária. Na parte dos encargos, consegue mexer dentro do próprio código. Os tributos são os isótopos, é assunto da reforma tributária. Só de encargos e subsídios é possível diminuir mais de 30% do valor da conta. Tem muito espaço para mexer.
Um coisa que encarece é a revisão tarifária, que compensa problemas que afetaram os resultados das empresas, como a seca ou redução do consumo, acima da inflação. Esse tipo de compensação vai ser alterado?
A maior parte da conta de luz não fica com a concessionária. No caso da Cemig, ela é apenas o arrecadador, não fica para ela esse dinheiro. As distribuidoras são forçadas, em função da Aneel, a comprarem a quantidade de energia que vão distribuir, não é ela que vende. Quando acontece uma seca ou mesmo a pandemia, que refletiu no consumo, não é distribuidora que vende a energia, ela que leva a energia. Só que ela que é responsável por cobrar. Isso não está aumentando o caixa da distribuidora, ela faz o grande mix da arrecadação, que vem com o ICMS, os tributos, tudo misturado. Só que ela transfere esse valor. Quando acontece o aumento, não é necessariamente a Cemig que aumentou. E no Brasil, temos sistema nacional integrado, que é uma vitória que poucos países têm. E com isso, todo mundo arca com tudo. Se faltou energia no Rio Grande do Sul, todos os brasileiros pagam por isso. É um balanço que acontece porque o sistema é todo integrado. Caso ocorra um problema no Amazonas, todos pagam por isso. Todos os anos, há esses reajustes para fazer o ajuste fino do que aconteceu no Mato Grosso, Paraná e que influenciou no todo. É uma regra Inteligente que tem, se nao fosse assim a conta aumentaria 40%, mas vai para 4%. Nisso não pretendemos mexer.
Com o mercado livre, vamos poder comprar energia diretamente dos geradores?
A tendência é essa, migração de todos para o mercado livre. Vai ter a figura dos comercializadores de energia. Não é possível você comprar diretamente de Itaipu, por exemplo, o que seria complexo. Por isso, vai surgir com força a figura do comercializador, como se fosse um corretor, que conhece bastante do sistema. Poderia juntar 40 e 50 pessoas e faz o mix de energia para conseguir pagar menos. Vai ter essa figura, só que isso vai acontecer em um processo lento, que gastará alguns anos. Vai começar primeiro com os grandes consumidores, diminuindo até chegar ao residencial. Mas antes, é preciso adquirir musculatura, porque são mais de 70 milhões de residências no Brasil. É preciso funcionar de uma maneira organizada para abrir totalmente o mercado livre às residências, que poderão comprar de quem quiser e a distribuidora fica com o que é o negócio dela, a infraestrutura da fiação e o caminho para elevar a energia até você. Vai cobrar um pedágio, já que ela tem todo um sistema de fios e transformadores para elevar energia até sua casa. Para uso dessas estruturas, é preciso pagar para que a energia chegue até o consumidor. É como se fosse um pedágio, a energia dos carros e o fio a rodovia. A Cemig em Minas Gerais tem todo o sistema que está à disposição dos consumidores para ser usado quando quiser. Agora a energia vai poder comprar de quem quiser, cada comercializador vai fazer o seu mix, com um pouco de eólica, térmica, solar, hidrelétrica. A tendência é a gente mergulhar para essa configuração.
Quais os prazos para votação do Código de Energia Elétrica?
Apresentados o anteprojeto, o rascunho, agora no final de julho e estão abertos até o início de outubro para contribuições do setor, especialistas e economistas. Estamos abertos para quem quiser fazer contribuições e emendas. A partir de outubro, faço uma nova configuração do Código com as contribuições pertinentes e pretendemos colocar em votação na comissão no final deste ano. Estando aprovado, no início do ano que vem já está pronto para ser votado no plenário.
Como vai funcionar o Bolsa Energia?
É como se fosse Bolsa Família, de geração de renda, só que funciona de uma forma diferente. Um município pequeno do Norte de Minas, por exemplo, pode se cadastrar no programa. Depois, a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) autoriza a fazer uma planta de energia de geração de energia limpa na cidade, que pode ser solar, eólica, biomassa, PCH, que são as pequenas hidrelétricas. A concessionária fica obrigada a comprar a energia dessa planta e o dinheiro da venda será utilizado para pagar Bolsa Energia. Fizemos várias simulações. Hoje o Bolsa Família paga, em média, R$ 209. Já o Bolsa Energia pode pagar R$ 330. A família que vai receber é a do cadastro único do governo federal. Quando ela migra para o Bolsa Energia, deixa de configurar no Bolsa Família e passa a aliviar os cofres públicos de uma família a menos no programa. Para participar do Bolsa Energia, a família tem que estar conectada à rede de energia. Sabemos que muitas delas têm o famoso gato, só que para poder fazer parte do programa, tem que estar conectado na rede. Uma das coisas que pagamos também nas contas são as perdas, entre eles esses gatos. E isso é 15% do valor. Quando obriga a estar conectada na rede, também é reduzida as perdas e a conta de energia de todos vai ficar mais barata. A família vai ganhar mais que no atual programa, gera economia aos cofres públicos e diminui as perda. Também deixa de existir um subsídio social na conta de energia daquela família. As casas pequenas conectadas fazem jus à tarifa social, a conta delas gira em torno de R$ 89, mas dá um desconto de R$ 30, que todos pagamos. Com o Bolsa Energia, vai pagar a tarifa toda e deixar de fazer parte desse benefício. É um programa auto sustentável, através de energia renovável, pode ajuda no desenvolvimento das pequenas cidades.
A taxação sobre a energia solar vai ser iniciada no Brasil. Isso não pode inibir os investimentos?
A energia solar é recente, de cinco anos para cá que ganhou corpo. Antes, tinham os painéis solares para esquentar a água do chuveiro. Já a geração de energia é mais recente. Quando começou a geração fotovoltaica, soltou uma resolução, 482, que dava muitos incentivos para a geração desses painéis solares. Quem tem hoje não paga nenhum tipo de tributo, e a própria Aneel previa que no final de 2019 fazer uma revisão. Acontece que quando chegou nessa época, a agência disse que ia rever e fazer estudo de cenários. De uma maneira muito técnica, vislumbrou cinco cenários diferentes de tributação dessa energia solar. Eram cenários com uma cobrança de tributos entre 22% e 62% de tributação. Mas depois ela própria, na ponto de vista dela, falou que o cenário mais justo era o da taxação de 62%. O setor se revoltou, o Brasil já é tido como um dos países com maior carga tributária do planeta. Gerou uma grande confusão, conflito, tamanha dimensão que no final do ano o presidente Bolsonaro falou para parar com isso, que seria o próprio congresso que decidiria. A partir de então, eu que era o relator, cai nessa confusão. Como vai agora? Comecei a conversar com os setores, ap própria Aneel, ministérios, produtores e distribuidores. Quem tem energia solar não paga o pedágio do fio, então é um conflito de interesses. Fiz uma solução mediana, que não matou ninguém, mas não é o melhor dos mundos. Só que todos concordaram e dá pra aliviar. É uma transição de 10 anos. Hoje quem tem energia solar não paga o fio B, que é essa taxa cobrada para o uso, quem tem solar não paga por isso. Tem que pagar, é justo que se pague, mas não vai ser da noite para o dia. Separei a produção em quatro categorias e tratamentos diferentes. A primeira é a de autoprodução remoto, são as fazendas solares que uma empresa faz para si própria. Outra classificação é chamada autoprodução remota compartilhada, junta 100 pessoas para fazer um consórcio, uma fazenda retomo para gerar energia para nossas casas, que eu dividi em duas: residencial ou comercial. A quarta é microgeração local. Eu dei tratamentos diferentes nessa transição. A partir do ano que vem, as novas plantas de autogeração remota passam a pagar o fio B, que é a taxa, que é 28% da conta de luz. As compartilhadas começam pagando 10% dessa taxa que a distribuidora cobra e vai aumentando em dez anos até pagar integralmente a taxa do fio B. Se for compartilhada comercial, começa pagando 50% do fio B e ao longo de 10 anos vai aumentando. No final, pagará integralmente o fio B. Consenso, todo mundo topou, o pessoal achou razoável, essa é a proposta no código, é um capítulo no código, mas tem a tendência de caminhar sozinha. Há consenso que isso seja votado neste ano, no plenário e no Senado neste ano mesmo esse capítulo da geração distribuída. O restante vai ser votado no final do ano.
Como destravar os investimentos para o setor?
A nossa proposta é essa, o código está tentando destravar os investimentos. É uma chance imensa de destravar os investimentos, muita gente quer investir, mas fica na insegurança, não tem a normalização, não sabe se vai ter retorno ou não. Quando tiver uma ligação clara, destrava para vir uma enxurrada de investimentos. Eles já estão prontos para vir , esperando só a clareza na amortização do setor. Um terço dos investimentos são desse setor, é um capital imenso de empresas querendo investir, mas esperando a regulação. Expectativa de enxurrada grande de investimentos, energia é uma coisa boa. O Brasil gira mais de R$ 100 bilhões nesse setor por ano. Pelo menos uma três vezes esse valor, de R$ 300 bilhões, travados querendo vir. Vamos triplicar o que gosta em um ano. Quase que dobra os investimentos anuais. Energia é uma coisa muito séria e importante. As principais guerras são por fome, água e energia. E a maioria é energia. Os Estados Unidos não foram para Iraque por achavam o Saddam Hussein feio, mas por petróleo. A energia está na nossa vida, se dá uma regulação, clareza e segurança jurídica, destrava um conjunto imenso de investimentos. Esse projeto da geração, criando a questão compartilhada, vai finalmente poder democratizar a energia solar, por conta da própria resolução. As pessoas mais pobre não tem acesso hoje por duas razões: para colar no telhado, é um investimento de R$ 20 mil, não têm como fazer isso. Se fizer a compartilhada, hoje na regulação atual, no final da conta, o preço da conta de luz sai mais caro, o pobre está impedido de ter energia solar e o Brasil é o país do sol. Esse modelo, essa solução, vai democratizar e permitir que as pessoas mais pobres possam ter energia solar através da compartilhada. Posso fazer uma fazenda compartilhada para iluminar 40 casas e essa energia será mais barata que a conta do fim do mês. Acho que a grande virtude desse projeto é esse componente social, permitir que as pessoas mais simples tenham acesso à energia solar. Discussão antiga e precisamos renovar.
O senhor foi escolhido como pré-candidato à Prefeitura de Belo Horizonte pelo Republicanos. Quais são as perspectivas?
Meu nome está sendo colocado para os belo horizontinos. Temos ideias boas, vivemos esse momento da pandemia, impacto prejudicial para todos, os programas são esses, de geração de renda que podemos implantar em BH, programas sociais para que as pessoas possam ter seus empregos. Os pais de famílias querem ter seu emprego, é isso que precisamos trabalhar muito. BH nos último anos investiu muito pouco em mobilidade urbana, é a quarta cidade mais lenta do país. Existem ferramentas de inteligência artificial e podemos ser uma cidade vitrine, admirada pelo resto do Brasil.