PROJETO DE LEI

Cadeirinha para crianças no carro: multa deve cair?

Entenda as mudanças propostas para o Código de Trânsito Brasileiro e confira opinião de especialistas e motoristas sobre o assunto

Sex, 14/06/19 - 03h00

Ouça a notícia

A pequena Antonela Gregório, de um ano e seis meses, anda de cadeirinha mesmo quando a mãe pega carros por aplicativos de transporte. Laura Freitas, de três meses, vai sempre no bebê conforto sob os olhares atentos da mãe ao volante.

 As mães das crianças fazem coro àqueles que acreditam que é importante o uso do equipamento de segurança e que defendem sua obrigatoriedade pela legislação. No dia 4 de junho, o presidente Jair Bolsonaro encaminhou ao Congresso o Projeto de Lei 3267 (leia em bit.ly/2MMPePd), que propõe uma série de mudanças no Código de Trânsito Brasileiro (CTB). 

Entre os pontos polêmicos está o de que condutores não recebam multa – apenas uma advertência por escrito – caso transportem crianças fora dos aparatos de segurança. 

A mãe de Antonela, Lorena Silva, 29, conta que voltou a trabalhar como coordenadora pedagógica assim que acabou a licença-maternidade. 

Habilitada, mas com receio de dirigir, ela se viu obrigada a pegar o carro quando houve a greve dos caminhoneiros, em maio do ano passado. “O transporte público não rodava”, lembra. Além disso, o carro trazia um conforto. “Não é todo motorista de ônibus que espera você passar pela roleta e sentar”, completa. 

Lorena conta que passou recentemente por um trauma na família em relação à acidente de carro e, por isso, redobra a segurança. “Se um adulto, mesmo com cinto de segurança, sofreu um acidente fatal, imagine uma criança. Não tem nem que discutir a necessidade da cadeirinha”, diz. 

Ela acredita que não dá para confiar que todos os pais vão ter consciência de que o uso do equipamento é necessário. “A multa é para garantir o direito de segurança da criança. Por economia, se não tiver legislação obrigando, muitos pais não vão usar a cadeirinha”, frisa. 

Mariana Reis, mãe de Laura, também acredita que “andar sem cadeirinha é um retrocesso” porque pais irresponsáveis podem colocar os filhos em risco. “Eu já ouvi pai falando que é chato ficar carregando. Eu mesma, inclusive, às vezes penso que é pesado. Mas tem que priorizar a segurança”, destaca.

Ela acredita que apenas uma advertência não inibirá motoristas de transportarem crianças sem o equipamento. “No Brasil, tudo funciona se doer no bolso”, opina. 

Mudança no Código de Trânsito Brasileiro

Validade da CNH
Como é:

Vale por cinco anos. Maiores de 65 anos precisam renovar a cada três anos.

Como fica:
Valerá por dez anos. Maiores de 65 anos precisarão renovar a cada cinco anos. Carteiras anteriores à nova regra terão prazo de validade prorrogado.

Pontuação por infrações
Como é:

Carteira Nacional de Habilitação é suspensa ao atingir 20 pontos. 

Como fica:
Carteira Nacional de Habilitação será suspensa ao atingir 40 pontos. 

Crianças no carro
Como é:

Menores de 10 anos devem ir no banco de trás. Multa gravíssima em caso de infração, de acordo com o Contran. 

Como fica:
Crianças devem andar no banco de trás e estabelece o uso de equipamentos de segurança. Não há multa; apenas advertência por escrito. 

Na contramão da segurança

Atualmente, o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) determina que menores de dez anos devem andar no banco de trás, mas não trata sobre os equipamentos de segurança. É a resolução 277/2008 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) que exige a utilização de cadeirinhas, bebês conforto e dispositivos de elevação de acordo com a faixa etária da criança. 

O advogado Evandro Braz Júnior explica que, por pura formalidade, a resolução do Contran não tem a mesma validade das regras do CTB. “Não houve uma votação pelo Congresso Nacional. Sua validade está sendo questionada no Supremo porque realmente não é lei”, diz. “Ela estava sendo aplicada como multa regular, e estudiosos do direito viram essa brecha. Este era o momento para o Governo dar legalidade ao uso da cadeirinha e à aplicação da multa”, considera. 

De acordo com Cíntia Maria de Souza Valadares, especialista em gestão de trânsito e educadora na área, não se pode esquecer que o trânsito no Brasil mata desordenadamente. “Portanto, medidas que favoreçam pessoas que estão acostumadas a desobedecer a legislação não vão nos ajudar”, diz.

Até 2007, o índice de acidentes fatais com crianças era grande. Os pequenos andavam no colo de adultos ou sozinhos no banco de trás. “O cinto tem que passar no meio do peito; não pode ser na região do ventre porque tem órgãos importantes”, explica Cíntia. 

Segundo ela, todo o pacote de mudanças aumenta a violência no trânsito. “O número e a gravidade dos acidentes vão aumentar”, diz.

Ela é contra, por exemplo, a proposta de aumentar o limite de pontos da carteira de motorista de 20 para 40. “É um incentivo para quem gosta de cometer infração”, afirma.

Cíntia também não aprova a mudança da validade da carteira de cinco para dez anos. “De 18 para 28 anos muda pouca coisa. Porém, de 65 para 75 anos muda muita coisa: reflexo, visão, audição e percepção”, analisa. 

Já a exigência do exame toxicológico, ela acha coerente que seja retirada do código. “Não impede que a pessoa dirija drogada. Os caminhoneiros que andam com rebite fumam maconha e usam cocaína, estão lá na rodovia virando madrugadas ao volante”, afirma.

Ela explica que a janela de detecção dessas drogas é de 90 dias. Logo, muitos usuários ficam em um curto período de abstinência para fazer os exames e logo retornam ao hábito. “Deveria haver maior fiscalização nas rodovias”, afirma. 

Para Cíntia, um trânsito seguro deve ser pautado em fiscalização, educação e engenharia. “Esse é o caminho”, finaliza. 

---

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo mineiro, profissional e de qualidade. Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar.

Siga O TEMPO no Facebook, no Twitter e no Instagram. Ajude a aumentar a nossa comunidade.