Racionamento

Falta de soro antiveneno desabastece municípios

Os três laboratórios produtores estão em reforma para atender as normas da Anvisa

Por Litza Mattos
Publicado em 16 de fevereiro de 2017 | 03:00
 
 
Soros contra veneno começam a faltar em municípios do país Pedro Silveira - 21.8.2009

O atraso nas reformas dos três laboratórios responsáveis pela produção dos soros antivenenos distribuídos no Sistema Único de Saúde (SUS) tem deixado municípios de pelo menos três Estados desabastecidos. A falta do medicamento já levou à morte de uma mulher, picada por cobra no Mato Grosso. Outras duas pessoas, um morador de Minas Gerais e outro do Rio de Janeiro, também passaram por problema semelhante e tiveram que esperar até 24 horas para receber a dose.

A dificuldade de encontrar os soros se agravou depois que os fabricantes – a Fundação Ezequiel Dias (Funed), em Minas Gerais, o Instituto Vital Brazil, no Rio de Janeiro, e o Instituto Butantan, em São Paulo – tiveram que parar a produção para realizar readequações, atendendo as exigências da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Em Minas Gerais, a reforma da Funed começou no dia 17 de janeiro, e a fábrica ficará fechada por seis meses para melhoria no sistema de qualidade da água usada na produção. Nesse período, cerca de 90 mil frascos dos soros antiescorpiônico, antiofídico (contra veneno de cobras), antirrábico (contra raiva) e antitetânico deixarão de ser fabricados – a produção anual é de 180 mil unidades.

Em entrevista a O TEMPO em janeiro deste ano, o Ministério da Saúde, por meio da assessoria de imprensa, e a presidente em exercício da Funed, Cármen Lúcia Soares Gomes, garantiram que não haveria risco de faltar soro nas unidades de saúde. “É uma paralisação programada”, afirmou Carmén na época. Porém, antes de a Funed paralisar sua linha de produção, os dois outros laboratórios deveriam estar com as novas fábricas funcionando para agora suprirem a demanda, mas as reformas ainda não terminaram.

“Nós estamos ainda passando por adequações”, informou por telefone a assessoria de imprensa do Instituto Butantan. Atualmente, o laboratório em São Paulo entrega cerca de 500 mil ampolas ao ano ao Ministério e, segundo reportagem do G1 em agosto de 2015, a previsão era que a fábrica reformada entrasse em funcionamento em fevereiro de 2016, com uma capacidade de produção de soros 75% maior.

Porém, em nota, um dos principais produtores de imunobiológicos do país confirmou que reformou e modernizou sua fábrica de soros hiperimunes (antivenenos, antitoxinas e antiviral), atendendo aos padrões exigidos pela Anvisa, em fevereiro de 2016, mas que atualmente está discutindo com o Ministério da Saúde a necessidade de aumento na produção.

“Para isso, uma série de etapas devem ser cumpridas, sendo necessário dimensionar a capacidade produtiva em cada uma dessas etapas. Além disso, são realizados vários testes de controle de qualidade, que também serão discutidos com o órgão federal para possível expansão”, diz. O Vital Brazil também foi procurado, mas não retornou.

Números. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que 25 mil pessoas morrem por ano vítimas de mordida e serpentes venenosas. No Brasil, são, em média, 22 mil incidentes e cem mortes por ano.


Casos no país

Mato Grosso. Uma servidora pública morreu após ser picada por cobra. A Secretaria de Saúde alegou redução no repasse dos soros.

Rio de Janeiro. Um aposentado foi mordido por uma cascavel, em Resende, e esperou dez horas pelo soro. Ele ficou dois meses em coma.

Minas Gerais. Um trabalhador rural de Conceição da Aparecida (Sul) que foi picado por uma cobra teve que esperar quase 24 horas pelo soro. Ele está internado há mais de 15 dias.


Governo afirma ter solicitado alocação de doses nos Estados

Em nota, o Ministério da Saúde informou que, para que não houvesse interrupção na fabricação dos soros, a Anvisa autorizou a produção compartilhada entre os laboratórios durante as readequações em suas linhas de produção.

“Como estratégia para reduzir o impacto da diminuição da produção dos imunobiológicos, a pasta tem acompanhado os cronogramas de entregas dos soros, atualizou os protocolos clínicos de atendimentos de acidentados e solicitou aos Estados a alocação desses imunobiológicos para áreas de maior risco”, aponta o texto do ministério.

De acordo com a pasta, para a distribuição mensal dos antivenenos, é feita uma análise da situação epidemiológica dos acidentes por animais peçonhentos e das ampolas utilizadas em cada região, mas ressaltou que os Estados são responsáveis pela entrega aos municípios.

Segundo o órgão, Minas Gerais recebeu, neste ano, mais de 6.000 ampolas de soros antivenenos. A Secretaria de Saúde do Estado informou que a medicação foi direcionada para “os municípios polos de cada regional de saúde para melhor atender a população” e que as unidades são encaminhadas de acordo com o número de notificações dos municípios pertencentes a cada regional.

No Brasil. As serpentes que mais causam acidentes com envenenamento são: jararaca, jararacuçu, urutu, caiçaca, comboia, cascavel, surucucu-pico-de-jaca e coral-verdadeira.