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Reajuste em planos de saúde supera inflação e impacta 8 milhões de brasileiros

O aumento anunciado pela ANS ocorre mesmo com as operadoras tendo registrado um incremento de 10,44% nas receitas em 2021, segundo dados da agência

Por Simon Nascimento
Publicado em 26 de maio de 2022 | 18:33
 
 
Gastos com saúde ficaram mais altos Fernando Zhiminaicela - Pixabay

Mais de 8 milhões de brasileiros serão impactados pelo reajuste de 15,5% aprovado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para planos de saúde individuais e familiares. O aumento foi anunciado nesta quinta-feira (26) e vai dificultar o orçamento, já combalido pela inflação, das famílias brasileiras.

“Não é justo, ainda mais pós-pandemia, que estamos com toda essa dificuldade. Sem chance de um aumento deste tamanho”, desabafou Suzie Aparecida, de 54 anos. Na família dela, o peso será duplicado já que o pai, de 74, e a mãe, de 76, pagam cerca de R$ 800 cada para uma assistência médica com co-participação.

“Teriam que fazer algo para ajudar que seria muito bem-vindo, não para piorar”, complementou. O aumento anunciado pela ANS ocorre mesmo com as operadoras tendo registrado um incremento de 10,44% nas receitas em 2021, segundo dados da agência. 

A correção feita é a maior registrada desde 2000, quando a agência iniciou o acompanhamento da série histórica. O percentual mais elevado, desde então, havia ocorrido em 2016, quando os planos subiram 13,57%. A marca aprovada pela ANS para vigorar até abril de 2023 também fica acima da inflação dos últimos 12 meses no Brasil, calculada em 12,13%.

Os 8 milhões de beneficiários impactados representam 16% do total de 49,1 milhões de contratos de assistência médica no Brasil. De acordo com a ANS, o aumento no valor do plano pode ser aplicado pela operadora a partir da "data de aniversário do contrato", ou seja, no mês da contratação da assistência.

Para chegar ao percentual de 2022, a ANS justifica que utilizou a metodologia de cálculo que vem sendo aplicada desde 2019. O formato “combina a variação das despesas assistenciais com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) descontado o subitem Plano de Saúde”.

O cálculo é baseado, explica a ANS, na diferença das despesas assistenciais por beneficiário dos planos de saúde individuais de um ano para o outro. “Dessa forma, o índice de 2022 resulta da variação das despesas assistenciais ocorridas em 2021 em comparação com as despesas assistenciais de 2020”, argumenta. 

Aumento não se justifica, diz especialista

No entanto, a coordenadora do programa de Saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ana Carolina Navarrete, o aumento não se justifica. Na avaliação dela, muitos beneficiários podem acabar tendo de abrir mão da assistência médica com os novos valores.

“Sob a perspectiva do consumidor, se torna insustentável porque a gente vive em um momento de recessão econômica e redução do poder de compra”, explica. Ela lembra que as operadoras vivenciaram cenários favoráveis em 2020 e 2021, com as reduções de uso dos planos e diminuição de despesas. “O impacto é devastador. O mercado de planos de saúde é saudável, com lucros, e repassam um aumento dessas magnitude”, complementa.

Navarrete destacou que o percentual aprovado pela ANS é o teto máximo, deixando aberta a possibilidade de um reajuste menor para cada operadora. O consumidor pode, inclusive, tentar negociar valores mais baixos e pedir um detalhamento dos gastos incluídos no contrato para contestar o reajuste.

“Para o consumidor essa negociação é muito difícil. Se não for bem-sucedida, ele pode avaliar alternativas como migração de plano dentro da própria operadora ou a portabilidade, que é trocar de empresa levando consigo as carências que ele já cumpriu”, aconselha a especialista. 

Empresas alegam aumento de custos 

Em nota, a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), que representa 15 operadoras, justificou que o reajuste reflete o aumento de custos observado em 2021. A organização afirma que houve crescimento de 24% nos gastos e a sinistralidade dos planos de saúde, que mede os acionamentos do plano para qualquer tipo de procedimento, chegou a 86,2%  

No entanto, dados públicos da ANS mostram que as despesas foram elevadas em 20,7%, ao passo em que as receitas receberam um incremento de 10,44%, se comparado com dados de 2020. As receitas foram inflacionadas pelo aumento de mais de 2 milhões de beneficiários que contrataram os planos.

“Na prática, a cada R$ 100 de receita dos planos de saúde no ano passado, cerca de R$ 86 foram repassados pelas operadoras aos prestadores de serviços de saúde para pagar despesas com hospitais, médicos, clínicas e laboratórios, entre outros”, justificou a Fenasaúde. 

A Federação ainda atribuiu culpa ao aumento de preço de medicamentos e insumos médicos, além da retomada intensa de procedimentos eletivos. Outros fatores que impactaram no reajuste foram os tratamentos de Covid longa e a incorporação de novas coberturas obrigatórias aos planos de saúde.

“Além disso, o Brasil enfrenta a maior inflação geral em 19 anos, o que afeta diversos setores de atividade econômica, incluindo o mercado de planos de saúde”, complementa a nota.