Supremo

Relator defende que família ajude a bancar medicamento

Parecer de Marco Aurélio valeria para casos em que for comprovada capacidade financeira

Por Da Redação
Publicado em 29 de setembro de 2016 | 03:00
 
 
Doença rara. Menina 12 anos que sofre de mucopolisacaridose, doença metabólica que afeta os sistemas respiratório e cardíaco, além da visão e do crescimento, participa de campanha por remédio arquivo pessoal

BRASÍLIA. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello alterou seu voto no julgamento em que a corte decidirá se o Estado é obrigado a fornecer medicamentos de alto custo a quem não tem poder financeiro para comprá-los.

O julgamento, suspenso no último dia 15 por um pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso, foi retomado nessa quarta-feira (28), mas novamente suspenso após o ministro Teori Zavaski pedir vistas do processo. Até o dia 15, apenas o relator Marco Aurélio Mello havia votado.

Na ocasião, o relator defendeu a obrigatoriedade do fornecimento dos medicamentos, desde que o item seja registrado na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Nessa quarta-feira (28), ele fez um aditamento à sua tese. Mello manteve o entendimento a respeito da necessidade de o Estado custear os tratamentos de alto custo.

Ele acrescentou, porém, que o poder público deve arcar também com a importação de produtos sem o selo da Anvisa, desde que não haja similares no Brasil e que o remédio em questão tenha eficácia comprovada e seja registrado no país em que ele é comercializado. Dessa forma, o paciente deve apresentar um laudo médico para atestar que o acesso a determinado tratamento é indispensável à sua saúde.

Como a “Folha de S.Paulo” adiantou nessa quarta-feira (28), Mello falou sobre a solidariedade familiar no custeio dos tratamentos. Para ele, caso se constate que o paciente tenha parentes com capacidade financeira para bancar o medicamento, o Estado pode requerer o ressarcimento. “O predicado solidariedade está mesmo em falta (...), à margem da vida das pessoas (...) O olhar do homem mostra-se egoísta[...]. Na maioria das vezes, o problema do próximo não é meu”, afirmou o relator.

Já Luís Roberto Barroso, que votou logo após Mello, defendeu que seja feita a diferenciação de duas situações: demandas judiciais por medicamentos já disponíveis ao SUS e aqueles não disponíveis no sistema de saúde.

No primeiro caso, diz, “não há dúvida” de que o Estado deve fornecer o medicamento, desde que comprove sua necessidade e que tentou obter o remédio no SUS, sem sucesso. Já em relação à segunda situação, disse que o poder público não pode ser obrigado a disponibilizar remédios que não estão na lista do SUS, incluindo aqueles de alto custo.

Esse fornecimento, afirma, deve ocorrer apenas em caráter excepcional, observados cinco critérios: comprovação de que o paciente não tem condições de arcar com os custos; que a Conitec (comissão que avalia a incorporação de remédios no SUS), não tenha apresentado “expressa recusa” em incluir o medicamento; que não haja tratamento semelhante disponível no SUS; que o remédio tenha comprovação de segurança e eficácia e que a União seja também demandada a custear os medicamentos, e não apenas Estados e municípios.

Visão de governo

O ministro da Saúde, Ricardo Barros, defendeu que o julgamento levasse em conta não apenas o cidadão que precisa de medicamentos, mas o que paga impostos. “O governo é só o meio dessa relação”, afirmou Barros.

De acordo com Barros, as decisões da Justiça obrigando a oferta de medicamentos devem fazer com que o governo federal, Estados e municípios destinem somente este ano R$ 7 bilhões. “Esse não é dinheiro novo. As ações obrigam gestores a deslocarem recursos de atividades programadas, como vacinação”, disse.


Defesa

Para procurador, é preciso critério

Brasília. Dois casos motivaram a análise do Supremo. O primeiro é de uma paciente do Rio Grande do Norte com hipertensão arterial pulmonar. Em 2007, ela recorreu à Justiça para ter acesso a um medicamento de alto custo não disponível no SUS. Obrigado a custear o remédio, o Estado recorreu ao STF.

O segundo caso é de uma paciente de Minas com doença renal crônica que recorreu ao Supremo para o Estado custear o acesso a um remédio sem registro na Anvisa. Para o procurador do Rio Grande do Sul Tanus Salim, que representou os Estados na primeira sessão de julgamento, se o pedido não for atendido, Estados esperam que haja ao menos critérios.

“E aí poderia verificar vários fatores: se é o único tratamento disponível, se tem certificação quanto à segurança e comprovação de eficácia e se há possibilidade de conservação e estocagem.”

Portadores de doenças raras fazem campanha

Rio de Janeiro. Grupos representantes de pessoas com doenças raras chegam nessa quarta-feira (28) ao Supremo Tribunal Federal (STF) com mais de 280 mil assinaturas coletadas em uma petição no site Change.org, que teve como divulgadores personalidades como Marina Ruy Barbosa, Bruno Gagliasso e Jean Wyllys. A petição, com título “Supremo Tribunal Federal: permita que todos recebam os medicamentos para viver!”, pede financiamento público para ambos os casos. Doenças raras afetam 13 milhões de brasileiros, que nem sempre encontram seus medicamentos no SUS. Ao mesmo tempo, muitas das pessoas não têm condições de pagar pelo tratamento. Para alguns casos, já existem remédios eficazes autorizados por órgãos de saúde de outros países, mas que ainda não receberam a autorização da Anvisa e, portanto, não podem ser ofertados no Brasil.

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SUS

Pacientes com Aids terão novo tratamento

BRASÍLIA. O SUS passará a ofertar, a partir de janeiro de 2017, um novo medicamento contra HIV/Aids para usuários que iniciam o tratamento e aqueles que têm resistência a outros antirretrovirais. A decisão incorpora o antirretroviral dolutegravir na chamada “primeira linha” de tratamento, ou seja, para novos pacientes.

Além disso, o remédio também passa a ser ofertado na “terceira linha”, direcionada a pacientes que não responderam aos tratamentos anteriores. Segundo a diretora do departamento de HIV/Aids do Ministério da Saúde, Adele Benzaken, a previsão é que 100 mil portadores do vírus HIV recebam o novo tratamento a partir do ano que vem.

A incorporação muda o atual modelo disponibilizado a novos pacientes no SUS, composto pelos medicamentos tenofovir, lamivudina e efavirenz disponibilizados em um só comprimido – conhecido como “3 em 1”.

Com a mudança, o dolutegravir passará a ser indicado no lugar do efavirenz, associado à pílula do agora “2 em 1”: lamivudina e tenofovir.

A oferta do novo antirretroviral para novos pacientes no SUS ocorre diante da atualização do protocolo clínico de diretrizes para o manejo da infecção para o HIV e recomendações da Organização Mundial de Saúde.