Belo Horizonte

90% dos motoristas bêbados não são detidos em blitze

Das 903 prisões no ano passado, 811 foram após acidentes e em flagrante por direção perigosa; governo diz que são feitas dez operações por dia para coibir embriaguez ao volante

Por Bernardo Miranda
Publicado em 20 de maio de 2017 | 03:00
 
 
No ano passado, cerca de 6.700 veículos foram abordados em blitze de campanha Foto: Moisés Silva - 8.8.2014

Das prisões efetuadas por embriaguez no trânsito de Belo Horizonte no ano passado, apenas 10% foram em blitze. Todas as demais ocorreram em acidentes ou em flagrantes por direção perigosa. Das 903 detenções, 92 foram nas ações da campanha “Sou pela Vida, Dirijo sem Bebida”, conforme dados do Departamento de Trânsito de Minas Gerais (Detran-MG) e da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp).

O incremento nas ações de fiscalização e os seguidos reajustes nos valores de multas aplicadas para quem dirige após ingerir bebida alcoólica não foram suficientes para brecar esse hábito. “Nós perdemos a guerra feio. As pessoas continuam bebendo e dirigindo. É quase um ato de força, de potência. Há uma associação entre beber e dirigir e a sensação de aumento de poder. Por esse prazer, as pessoas ignoram que estão colocando outras vidas em risco”, disse Elza Machado, professora do departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Ainda de acordo com Elza, a embriaguez no trânsito parte de uma cultura individualista em que as pessoas colocam sua satisfação acima de qualquer prejuízo à sociedade. “A cultura no trânsito é tão individualista que é difícil você conseguir trocar de faixa sem passar por um conflito. É esse comportamento que faz do Brasil o quinto país com o maior número de mortes no trânsito, segundo a Organização Mundial da Saúde. A maioria desses acidentes é provocada por falhas humanas que poderiam ser evitadas”, afirmou a professora da UFMG.

Para o consultor em trânsito e transportes Osias Baptista, os dados mostram que os motoristas ainda têm a sensação de que podem cometer a infração e não serão punidos. Ele explicou que é necessária uma fiscalização ainda maior e realizada de forma mais inteligente.

“Mesmo com todo o esforço, é claro o fato de que o poder público não tem condições de fazer uma fiscalização eficiente. Você anda pela cidade por vários dias e não se depara com nenhuma blitz. Essas ações têm que ser mais visíveis e não podem ser realizadas sempre nos mesmos lugares. Só assim os motoristas começam a ter medo de serem punidos”, afirmou Baptista.

Dados. Em 2014, foram 824 prisões por crime de trânsito na capital. Em 2015, passou para 919. Segundo a Sesp, são realizadas dez blitze da campanha “Sou pela Vida, Dirijo sem Bebida” diariamente em Belo Horizonte.

A pasta informou ainda que ampliou as atividades para outras 18 cidades polo do interior de Minas Gerais. A média mensal de veículos abordados em 2014 era de 5.000, e, no ano passado, 6.700.

Campanhas deveriam formar consciência 

Além de uma fiscalização mais intensa, é preciso realizar uma mudança nas campanhas educativas voltadas para combater a violência no trânsito. Essa é a análise feita por especialistas da área de saúde e de engenharia, que trabalham com o tema.

“Hoje, a campanha é voltada somente para a informação, e não para a formação de um cidadão consciente. Não adianta só informar às pessoas sobre os riscos que há quando elas cometem uma imprudência. Isso não as faz mudar seu comportamento. É preciso uma campanha de formação, seja na escola, com crianças, ou de reciclagem de motoristas, para mostrar que o trânsito mata mais do que qualquer tragédia e que essa realidade existe em função da forma individualista como ele atua no trânsito”, explicou Elza Machado, professora do departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina da UFMG.

O consultor em trânsito e transportes Osias Baptista afirma que esse problema só será solucionado se os motoristas começarem a pensar para além do medo de serem multados. “A pessoa tem que pensar que, ao dirigir embriagada, pode matar outra e, por essa razão, deve desistir de sair de casa com o carro quando for beber”, afirma.

Fórum. Na próxima segunda-feira (22), será realizado um encontro da Faculdade de Medicina da UFMG para discutir alternativas para se reduzir a violência no trânsito no Brasil.