Contagem

Audiência define como criança adotada voltará a morar com sua família biológica

Depois de viver cerca de três anos com a família adotiva, Justiça decide que menina voltará a viver com sua família biológica

Por ALINE DINIZ
Publicado em 16 de outubro de 2013 | 13:55
 
 

Acontece nesta quinta-feira (17) a audiência que vai definir como a pequena M.E, de 4 anos, vai voltar para a casa de sua família biológica. Há três anos, a menina vive com os pais adotivos e com uma irmã, em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte. Porém, a 7ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) decidiu, em abril de 2013, que a mãe e o pai biológico da garota têm condições de reassumir a sua guarda.

A família adotiva de M.E. criou uma página no Facebook para defender a causa. Muitas pessoas postaram mensagens defendendo a permanência de M.E. na casa de sua família adotiva.

"De livre e espontânea vontade, eu nunca entregaria minha filha. Não tenho nada contra os pais biológicos, mas M.E. é minha filha”, desabafou Liamar Dias de Almeida, mãe adotiva da criança. Ela e seu marido, Valbio Messias da Silva, entraram na fila de adoção e esperaram por cinco anos até a chegada da pequena. “Minha filha pediu uma irmã e entramos na fila, fizemos tudo dentro da lei”, conta Liamar. No entanto, o casal possuía apenas a guarda provisória de M.E. e aguardava o desfecho do processo de adoção.

Liamar relata, ainda, que enfrenta outro problema: como contar para a criança que ela não poderá mais viver com os pais adotivos. "Ela ainda não sabe. Há dois meses ela está fazendo terapia, não sei como contar para ela", comenta abalada.

O casal revela que se apaixonou por M.E. logo que ela chegou em casa. “Com um mês ela já me chamava de mãe, ela encantou e completou minha família. Nunca vou desistir dela”, afirma.

O advogado de Liamar e Valbio, Rômulo Mendes, informou que, em 2009, a criança foi para um abrigo depois que o Conselho Tutelar recebeu uma denúncia de maus-tratos e abandono. A Justiça tentou, segundo o defensor, a reinserção da criança em sua família biológica, mas não conseguiu. “Quando a menina tinha 2 meses, ela foi para um abrigo. Logo em seguida, a Justiça tentou uma reinserção porque a família havia melhorado, porém, a menina ficou lá menos de um mês”, explica. 

O advogado esclarece que os anos de convivência despertaram um afeto entre as partes. Ele pretende, inclusive, recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e, se necessário, ao Supremo Tribunal Federal (STF). 

Tanto a mãe quanto o defensor relataram que eles estão pensando no melhor para a criança. "Estamos preocupados com o bem estar de M.E. Não queremos que ela seja jogada como um boneco de um lado para o outro", menciona Mendes.

A família biológica de M.E. chegou a perder a guarda de outros seis filhos, que voltaram ao convívio familiar por determinação da Justiça após a família demonstrar interesse em reaver a guarda.

Sem acordo

A advogada de Maria da Penha Nunes e Robson Ribeiro Assunção - pais biológicos de M.E -, Cinthya Marta de Andrade Rodrigues, conta outra história. De acordo com a defensora, seus clientes nunca abandonaram os filhos e nunca houve maus-tratos.

Na época da denúncia, Maria da Penha estaria com depressão e, por isso, não arrumava a casa. “Robson não bebe, e Maria já está se tratando. Os outros seis filhos já estão com os pais”. Cinthya completa que as crianças foram tiradas de dentro da casa e que o casal os visitava, frequentemente, no abrigo.

Ainda conforme a advogada, existem laudos que comprovam que os pais estão aptos para receber a criança e que não há chances de conciliação. Ela revelou que, na audiência desta quinta, o que será definido é como o processo de reintegração será realizado. Segundo ela, a família biológica não fará acordo, mas permitirá que os pais adotivos continuem convivendo com a criança.

Segundo a advogada, os pais biológicos de M.E. preferem não falar sobre o assunto.

Laços afetivos

A Lei 12.010, de 2009, que regulamenta a adoção, prevê que a família biológica tem preferência com relação à guarda da criança.

Para o presidente do Instituto Brasileiro do Direito de Família (IBDFAM), Rodrigo da Cunha Pereira, a decisão do tribunal sobre a menina M.E. é a demonstração que há um engano na legislação. “Há um equívoco na lei. Ela privilegia a família biológica ao invés de considerar o melhor interesse da criança”, afirma. Para o presidente, a mudança de ambiente pode ser uma violência contra a criança.

O instituto, inclusive, está lutando para que a lei sobre adoção avance no Brasil. No dia 19 de março de 2013, o IBDFAM se reuniu com representantes do Ministério da Justiça com o objetivo de discutir a questão. “O IBDFAM sugeriu que os laços afetivos precisam ser levados em consideração”, revela.

O especialista explica que a concepção de família evolui muito. Segundo ele, os laços afetivos são muito importantes. "Somente os laços de sangue não garatem afeto", conclui.

Carta

Inconformado com a possibilidade de ter que "entregar sua filha",  Valbio Messias da Silva escreveu um e-mail pedindo para que os julgadores se sensibilizem com a história da família.

"Não sei se deixei claro no texto, mas ela foi retirada do lar com 60 dias e nunca mais viu estas pessoas, passou um ano e oito meses no abrigo e está há quase três anos em nossa casa. Recentemente, no desenrolar desse processo, os seis filhos que estavam em abrigos retornaram à família. Nossa filha é muito agarrada conosco, como não poderia deixar de ser. Somos sua família. Como vou explicar agora para uma criança de 4 anos e meio que 'a partir de agora, não sou mais seu pai, ela não é sua mãe e ela não é sua irmã'? Vocês acham que ela aceitará essa outra família?"