História

Campeão da Libertadores de 76 vende pizza no Parque Municipal

Vanderlei Lázaro, que jogou no Cruzeiro entre 1969 e 1978, relembra trajetória com gratidão

Dom, 23/06/19 - 03h00
Nova habilidade. Vanderlei Lázaro ajuda mulher a preparar as pizzas que vende no Parque Municipal; ela tem carrinho de pipoca no local | Foto: Mariela Guimarães

Ouça a notícia

O domingo costumava ser dia de decisão para Vanderlei Lázaro, 72. Entre 1969 e 1978, o ex-lateral esquerdo do Cruzeiro entrou em campo mais de 500 vezes para defender o time do coração – ele conquistou inclusive a Libertadores de 1976. Atualmente, o primeiro dia da semana dele não envolve mais viagens ou pressão do fim de campeonato, mas continua sendo de labuta: o ex-atleta agora vende pizzas no Parque Municipal, no centro da capital.

“Estou lá desde 1982. Comecei vendendo sorvete e, há 15 anos, passei para as pizzas”, conta Vanderlei Lázaro, que cobra R$ 6 por unidade. Quem prepara os petiscos – nos sabores calabresa, bacon, muçarela e à moda – é a mulher dele, Soraia Pitangui, que ele conheceu no Parque Municipal. “Vendia sorvete, e ela tinha um carrinho de pipoca. A gente se conheceu assim”, lembra.

O jeito tranquilo de Vanderlei Lázaro hoje contrasta com o da época em que ele vestia a camisa celeste. A movimentação corrida entre ataque e defesa, típica de um lateral, foi substituída por uma posição fixa – que os boleiros chamam de “banheira” –, em frente a um dos brinquedos que fazem a alegria da criançada no Parque Municipal. Os chutes a gol, os desarmes e os cruzamentos em partidas contra grandes times como o Santos de Pelé e o Atlético de Reinaldo deram lugar a gestos mansos e tímidos até mesmo quando ele leva suas pizzas para o forno.

A saída definitiva dos gramados foi aos 34 anos. Vanderlei Lázaro diz que não lidou com a mudança de maneira tranquila. Sem estudo para seguir na área como treinador físico, o ídolo celeste tentou administrar bares assim que parou de jogar. “Montei um boteco perto de casa e, depois, no Parque Fernão Dias. Mas não sabia mexer direito com comércio. Não deu certo”, lamenta.

Após algum tempo, com o apoio da Associação de Garantia ao Atleta Profissional, Vanderlei Lázaro conseguiu uma credencial para trabalhar no Parque Municipal e não arredou mais o pé da área verde no centro de BH.

Apesar de os salários dos jogadores da época de Vanderlei Lázaro não se assemelharem aos que recebem estrelas como Messi e Cristiano Ronaldo hoje, ele sentiu um baque no bolso ao trocar os gramados pelo parque, mas diz que conseguiu superar isso: “Eu já estava acostumado a passar dificuldade. Sempre faltava uma coisa ou outra (na infância e na juventude)”.

É por isso que Vanderlei Lázaro comemora como um título a residência que comprou enquanto era jogador. “Só tenho a agradecer. Graças ao Cruzeiro, consegui comprar minha casa”, contou à reportagem na varanda do imóvel, que fica no bairro Nova Suíça, na região Oeste da capital.

A conquista da Libertadores de 1976 também rendeu frutos para os pais do craque. “A cada jogo que a gente vencia, ganhava um prêmio. Como fomos até a final, consegui mobiliar a casa de meus pais”, diz, emocionado.

História

O ex-jogador só lamenta a falta da companhia dos colegas do futebol. As viagens com o time lhe renderam boas histórias, mas também alguns momentos de desespero. Em 1976, a caminho da Índia, o avião em que estavam os jogadores do clube foi atingido por um raio. “Lá de cima, a gente via o pessoal jogando espuma na pista para o avião pousar. Foi desesperador”, recorda-se.

Atualmente, o campeão da Libertadores acompanha o time do coração só pela TV. Vanderlei Lázaro diz que não gosta mais de ir ao campo porque “as coisas mudaram demais”. Sobre a performance atual do plantel celeste, o ex-jogador não poupa críticas. “Neste ano, a gente não passa nem perto de ganhar (o Brasileirão). Temos que tomar cuidado é para não cair”, finaliza.

Torcedor vibrou com Vanderlei

Quando Vanderlei Lázaro estreou no Cruzeiro, em 1969, o contador Ivair Pereira, 60, tinha 10 anos. Cruzeirense fanático, ele acompanhou a evolução da carreira do lateral.

Ele conta que Vanderlei era muito querido pela torcida, mas que ficou marcado no fim da carreira pelo pênalti que perdeu na final da Libertadores de 1977, impedindo o bicampeonato celeste. “A imprensa pegou muito no pé dele, e a torcida seguiu a onda”, relembra.

Atleta deve planejar aposentadoria

A vida de ex-atleta requer planejamento. Essa é a análise do presidente do Sindicato de Atletas de São Paulo, Rinaldo Martorelli. Ex-goleiro e hoje advogado e administrador, ele considera que é preciso estudar ou se preparar de alguma forma para a aposentadoria precoce.

Martorelli orienta fazer alguma faculdade e diferentes cursos. Para ele, começar um pequeno empreendimento pode ser uma saída.

“Um filósofo francês falava que o atleta morre duas vezes. A primeira é quando ele precisa mudar de atividade. É um abalo. Preparar-se para a aposentadoria é essencial”, diz o especialista.

---

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo mineiro, profissional e de qualidade. Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar.

Siga O TEMPO no Facebook, no Twitter e no Instagram. Ajude a aumentar a nossa comunidade.