Outra postura

Com novas propostas, igrejas atraem cada vez mais jovens

Instituições atualizam o discurso e apostam no diálogo para se aproximarem dos fiéis

Por Rafaela Mansur
Publicado em 20 de agosto de 2017 | 03:00
 
 
Fiéis. Jovens da Lagoinha Savassi são a maioria das 2.000 pessoas que frequentam o templo toda semana Foto: fotos Fred Magno

Quem passa pelo número 6.342 da avenida do Contorno, na Savassi, na região Centro-Sul de Belo Horizonte, pode pensar que ali existe uma balada alternativa, com frequentadores tatuados, barbudos e dreadlocks no cabelo. Mas, dentro do espaço de paredes pretas e com globos de luz, antigo endereço de sete boates, funciona, na verdade, a igreja Lagoinha Savassi, que recebe até 2.000 pessoas por semana, a maioria jovens. Eles são atraídos por uma proposta de igreja diferente e, assim como a tradicional, também baseada em um dos principais ensinamentos de Jesus Cristo: amar a todos. Igrejas como essa, que apresentam um discurso mais atual e novas formas de lidar com questões polêmicas, como a homossexualidade, atraem fiéis mais jovens, desinteressados por determinados rituais, que se mantêm em algumas instituições.

Filiada à Igreja Batista da Lagoinha, a Lagoinha Savassi foi fundada no fim de 2014, com as portas abertas para quem quisesse entrar. Todas as tribos têm espaço no templo, onde há projetos direcionados a diferentes grupos, como o de cultura urbana, voltado para fãs do skate, do rap e do grafite. “O líder traz exemplos de cada contexto para que o Evangelho seja mais palpável”, explica o pastor Victor Arliete, 20. Existem ainda projetos destinados ao público LGBT, aos nerds e aos atletas.

Os cultos também são diferentes: além de oração e pregação, há um intervalo para que as pessoas se conheçam. Os que visitam o local pela primeira vez são recebidos com um abraço ou uma conversa. “A igreja é tão receptiva que, depois de uma semana, parece que a pessoa está aqui há um ano”, diz o pastor.

Para a Igreja, a homossexualidade e o sexo antes do casamento são pecados, como nos templos convencionais. A diferença está na forma de lidar com isso – todos são acolhidos. “Nós, simplesmente, fazemos aquilo que Jesus fazia: não julgar, condenar ou apontar erros. Não concordamos com o pecado, mas amamos o pecador”, conclui Victor.

Católica. Em uma sala na Paróquia São Sebastião, no bairro Betânia, na região Oeste da capital, cerca de 70 jovens reúnem-se todas as noites de quinta-feira para participar do projeto Crescimento Espiritual, criado em 2011. Nos encontros, os fiéis recebem frequentadores de outras igrejas e têm momentos de louvor e diálogo. Novamente, é a acolhida que conclama os jovens, na opinião do coordenador do grupo, o engenheiro mecânico Saimon Castanheira, 32, para quem o projeto foi a porta de entrada de muitas pessoas para a igreja. “Aqui todos são bem-vindos”, diz.

Para o coordenador da Pastoral da Juventude da Igreja São João Batista, no bairro Salgado Filho, na mesma região, o fisioterapeuta e militar Patrick Roberto Avelino, 38, a igreja tem que “mudar sua mentalidade”. “O jovem só vai estar na igreja quando ela abrir as portas com uma linguagem atual”, salienta.

 

FOTO: Fred Magno
Lorena Moura diz que conheceu “Jesus alegre” em projeto de igreja

Projetos despertam a curiosidade

A assistente de vendas Tamara Andrade, 22, cresceu em um lar cristão, mas, depois de um tempo, deixou de gostar: tudo parecia se resumir a regras demais, para gente mais velha, segundo ela.

“Quando eu vim para a Lagoinha Savassi, descobri como colocar Deus nas coisas. Antes, sempre que estava dentro da igreja, ficava longe dos amigos. Hoje, eu consigo apresentar para eles uma igreja legal, em que todos cabem, um Deus gente boa”, conta.

Ela conheceu e passou a frequentar a igreja a partir do Movimento Cores, direcionado às pessoas LGBT. Depois de muito ouvir que precisava se “afastar do mal”, lá ela descobriu que também é amada. “Eu achava que, por ser homossexual, não seria digna de entrar no céu. Quando entrei aqui, descobri que Deus ama também os homossexuais. É uma questão de amor mesmo”, diz. “Ver a naturalidade com que as coisas são tratadas aqui é legal. Descobri um Deus que me ama independentemente de qualquer coisa, é um Deus que nunca vai me desprezar, que nunca vai me jogar para escanteio. Ele vai me acolher e me mostrar as coisas boas”, conta.

Para a jornalista Lorena Moura, 26, que frequenta o projeto Crescimento Espiritual da paróquia São Sebastião desde 2013, os encontros são um momento de intimidade com Deus, e, por meio de testemunhos, ela consegue dar mais valor ao que tem. “Esses movimentos são importantes porque despertam a curiosidade do jovem. Isso porque, para alguém que não conhece, ir à missa pode ser muito repetitivo. Aqui a gente conhece um Jesus alegre, jovem, que pode brincar”, relata. 

 

Internet é importante aliada de templos

importante das igrejas na aproximação com os jovens. É por meio da internet que muitos deles descobrem os templos, informam-se sobre a proposta de cada um, têm acesso a horários de missas e cultos e interagem com os frequentadores.

O projeto Jovem Fanuel, da paróquia Nossa Senhora Rainha, no Belvedere, na região Centro-Sul da capital, faz sucesso nas redes sociais. Criado há cerca de 15 anos, o projeto tem vários grupos. O perfil do Perseverança, por exemplo, dedicado a fiéis de 10 a 15 anos, tem mais de 2.500 seguidores no Instagram. “Eu acho que o que mais atrai os jovens são os retiros e os acampamentos, com várias dinâmicas e palestras. Os louvores também são animados e nos fazem extravasar o peso que carregamos”, conta a estudante Rafaela Rodrigues, 14.

Na Lagoinha Savassi, um diretor de criação faz a divulgação do trabalho do templo. “Não somos uma igreja totalmente voltada para as redes sociais, mas, hoje, a maioria das pessoas conhece lugares pela internet”, diz.

 

Irreverência

Novas propostas. Algumas igrejas têm apresentado ideias que vêm atraindo jovens país afora. Uma delas é a Bola de Neve Church, que possui uma prancha como púlpito – em BH, há uma unidade no Buritis, na região Oeste. Em diversas cidades do Brasil, como Rio de Janeiro e Curitiba, existe a Igreja no Cinema (INC), que, como o nome adianta, realiza cultos dentro do cinema.