No parque Ecológico

Festival Sensacional pode ter que distribuir repelente contra carrapatos

A recomendação da Defensoria Pública visa prevenir a febre maculosa, que fez vítimas no interior de São Paulo nas últimas semanas

Por José Vítor Camilo
Publicado em 19 de junho de 2023 | 14:49
 
 
Festival acontece no Parque Ecológico da Pampulha, onde, no passado, já ocorreram infestações do carrapato-estrela Foto: Secretaria de Meio Ambiente / divulgação

Com cinco mortes já confirmadas por febre maculosa no interior de São Paulo, a Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG) emitiu uma série de recomendações para a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) e a organização do festival Sensacional, que acontece entre esta sexta-feira (23 de junho) e o sábado (24) no Parque Ecológico da Pampulha, na capital mineira. Apesar dos organizadores do evento já terem tranquilizado o público em uma postagem tratando sobre a doença, na última semana, entre as sugestões dos defensores públicos está a distribuição gratuita de repelente ao público dos shows.

Segundo o órgão, o local é habitat de capivaras, que são o principal vetor da febre maculosa. Com isso, de forma preventiva, a DPMG emitiu o alerta para que o município e a produtora do evento possam reunir esforços para "assegurar a proteção efetiva da saúde e da vida dos consumidores". Mais cedo, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) ingressou com uma Ação Civil Pública para impedir o evento por suposto barulho acima do permitido durante a realização da festividade em 2022.

Na recomendação, a Coordenadoria Estratégica em Tutela Coletiva (Cetuc) da DPMG argumentou que o país tem registrado diversos casos da doença e, por estarmos no período seco, em que o carrapato se propaga com maior facilidade, a realização do evento com milhares de pessoas em um parque que já teve problemas com infestações no passado tornaria este risco ainda maior.

“Diante da realização do evento musical em uma área em que vivem as capivaras, a aglomeração de pessoas naqueles arredores aumenta significativamente o risco de uma potencial contaminação em massa de frequentadores do festival, expondo o sistema de saúde a uma eventual sobrecarga, além de gerar perigo à vida dos consumidores”, afirmou o defensor público Paulo César Azevedo, que assina a recomendação.

As recomendações

Além de cobrar o envio de algumas informações, a DPMG também emitiu uma série de recomendações tanto para a PBH quanto para a empresa Híbrido Comunicação, que organiza o festival.

Entre as recomendações ao município estão a instalação "com urgência" de ferramentas para controlar o acesso das capivaras ao Parque Ecológico, especialmente nas datas do festival e nos finais de semana. Também foi sugerido que o poder público aplique carrapaticida nas capivaras que ainda vivem na região.

Já organização do evento recebeu a recomendação de orientar o público com ações educativas, sobre a prevenção à doença; a indicação de roupas e vestes mais adequadas para evitar o acesso do carrapato-estrela ao corpo; disponibilização de repelentes gratuitamente na entrada do parque; orientação sobre a necessidade de monitoramento da presença de carrapatos no corpo e de sintomas da febre maculosa após o festival.

Conforme a Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG), Minas Gerais já registrou nove casos de febre maculosa neste ano, sendo que dois resultaram em morte. Já Belo Horizonte não registra casos da doença desde 2020, conforme a Prefeitura. Naquele ano, foram dois casos da enfermidade e uma morte na capital mineira. A febre maculosa é uma doença infecciosa febril aguda e de gravidade variável. Ela pode variar desde as formas clínicas leves e atípicas até formas graves, com elevada taxa de letalidade.

A recomendação dos defensores públicos foi emitida na última sexta-feira (16 de junho) e a empresa e a prefeitura tiveram um prazo de três dias corridos para responder e apresentar os documentos requisitados.

Organização diz "confiar na prefeitura"

Procurada pela reportagem de O TEMPO, o festival Sensacional alegou por nota que o evento se destaca nacionalmente por seu "cuidado e respeito ao público e ao meio ambiente" e completou informando que confia na Fundação Municipal de Parques e Zoobotânica e na Secretaria Municipal de Saúde de BH.

"A organização do festival confia na capacidade técnica da Fundação Municipal de Parques e Zoobotânica e da Secretaria Municipal de Saúde, e no trabalho de excelência que vem sendo desenvolvido pela Prefeitura de Belo Horizonte no Parque e na região da Pampulha como um todo há muitos anos", disse a nota.

Em seguida, a Híbrido Comunicação completou que o Parque Ecológico da Pampulha é um local seguro e constantemente monitorado, inclusive com a aplicação de carrapaticida, impedimento de acesso de animais por meio de barreiras estruturais, além de manejo planejado das áreas de mata e gramado para impedir infestações.

"Essas ações (da PBH) têm garantido a segurança dos visitantes do local nos últimos anos, sem nenhum caso suspeito registrado no parque, que tem registrado números de visitações crescentes a cada mês", finalizou a organizadora do show.

Posicionamento

Em nota, a Prefeitura de Belo Horizonte afirmou que "recebeu o documento e irá apresentar as considerações referentes às recomendações feitas pela Defensoria Pública".

Leia a nota

A Prefeitura de Belo Horizonte informa que recebeu o documento e irá apresentar as considerações referentes às recomendações feitas pela Defensoria Pública.

Atualmente, não há registros da doença em Belo Horizonte. No entanto, isso não dispensa a adoção das medidas preventivas. A Secretaria Municipal de Saúde vai reforçar as ações educativas na região e no Parque Ecológico, com a distribuição de material informativo sobre as medidas preventivas. Outras informações sobre a prevenção, além de recomendações importantes, podem ser verificadas no portal da PBH.

O município possui uma vigilância epidemiológica continuada e sistemática para a prevenção e redução de riscos de ocorrência da febre maculosa e anualmente também é realizado controle vetorial em equídeos (banhos carrapaticidas em cavalos). Assim como equídeos, canídeos e outros mamíferos, as capivaras – presentes na região da Lagoa da Pampulha – podem carregar carrapatos do tipo estrela, que são os hospedeiros primários da bactéria causadora da febre maculosa. Para controlar a população das capivaras foi necessário restringir a reprodução desses animais por meio de um trabalho iniciado em 2017. Elas foram esterilizadas, microchipadas e passaram por um censo, que contabilizou 56 animais na Lagoa da Pampulha. Já em 2022, após atualização, eram 12 capivaras.

Após a esterilização, o ambiente continuou sob monitoramento, com manutenção da vegetação baixa e instalação de placas de instrução aos turistas e munícipes. Concluído esse trabalho é natural que a população de capivaras diminua com o passar do tempo. Algumas morrem por idade, em disputas por território com outros animais da mesma espécie ou em outras dinâmicas comuns da interação com a fauna existente no local. Uma vez que a Lagoa da Pampulha é um ambiente relativamente isolado pela urbanização ao redor, outras capivaras não chegaram ao local e a população se manteve estável, sem reprodução e, com isso, diminuindo naturalmente, como era esperado.

Já a Fundação de Parques Municipais e Zoobotânica informa que o Parque Ecológico da Pampulha está em funcionamento normal desde sua reabertura pós-pandemia e, até o momento, não houve registro oficial da presença de carrapatos contaminados pela bactéria da febre maculosa em parques de administração municipal.

Mesmo antes do início dos trabalhos para castração de capivaras na região da Pampulha, foram adotadas medidas específicas que contribuíram para garantir a segurança dos visitantes do Parque Ecológico da Pampulha, a principal delas foi o cercamento, ainda em 2013, da área limite do parque, impedindo o acesso de capivaras à área social/ de convívio e uso público. Portanto, desde então as capivaras não acessam mais a área de visitação. Nos demais parques também é feito controle para evitar a presença de animais domésticos de vida livre ou silvestres não nativos da área que possam contribuir para infestações de carrapatos.

Além disso, desde 2017, em alinhamento e apoio às políticas sanitárias estabelecidas pela Secretaria Municipal de Saúde, se for identificada a necessidade, são realizadas campanhas educativas preventivas nos parques, com distribuição de material informativo, sinalização dos espaços com informes de medidas de segurança a serem adotadas, entre outras ações.

As medidas já adotadas para prevenção de incêndios também contribuem para um ambiente menos propício para a proliferação de carrapatos, tais como a manutenção dos gramados dos parques sempre em níveis baixos, por meio de podas e irrigação regulares. Vale lembrar que as roçadas constantes são feitas não somente nos gramados, mas também nas áreas de capim.

No caso de o usuário identificar a presença de algum carrapato dentro dos parques, ele deve informar, se possível no mesmo momento da identificação, à administração da unidade, para imediato acionamento do Centro de Controle de Zoonoses. O usuário também pode ligar para o telefone 156 e informar o ocorrido, solicitando vistoria no local.

É importante ressaltar que a população deve se prevenir ao visitar quaisquer tipos de áreas verdes, inclusive particulares como chácaras, sítios e fazendas, além de parques municipais, estaduais e nacionais. Até mesmo após praticar atividades físicas ao livre no ambiente urbano é importante manter-se atento à presença de carrapatos nos calçados ou roupa.