Região metropolitana

Funcionários da prefeitura de Sabará são demitidos em massa

Contratados devem ser substituídos por concursados; contratações são ilegais, segundo o Ministério Público de Minas Gerais, que entrou com ação civil contra o município

Por Fernanda Viegas
Publicado em 22 de julho de 2014 | 13:19
 
 
Funcionários contratados pela prefeitura de Sabará são demitidos e alunos ficam sem professores FERNANDA CARVALHO / O TEMPO

Todos os funcionários contratados da Prefeitura Municipal de Sabará, na região metropolitana de Belo Horizonte, nas áreas de saúde, educação e serviço social estão sendo demitidos em massa, segundo informou o sub-procurador geral do município, Ramon Diniz Tocafundo, nesta terça-feira (22). O número total de empregados retirados da folha de pagamento ainda não foi divulgado pela administração pública. De acordo com o Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG), todas as pessoas contratadas pela prefeitura - 2.100 pessoas - incluindo as que atuam na Câmara Municipal, devem deixar suas função, porque o processo de contratação não é legal.

Segundo Tocafundo, o MPMG entrou com uma ação civil contra o município, alegando que as contrações feitas pela administração municipal são ilegais, já que os trabalhadores deveriam ser concursados. "Essa questão já vem se arrastando desde a administração anterior", destacou.

A prefeitura, então, resolveu se adiantar e demitir os funcionários. Segundo moradores da cidade, as demissões começaram a ser anunciadas nessa segunda-feira (21). O processo ainda está em trâmite e não foi apreciado pela Justiça.

Segundo a promotora de Justiça de Defesa do Patrimônio Público de Sabará, Marise Alves da Silva, desde 2005 o Ministério Público denuncia o problema na cidade, buscando fazer com que se cumpra a Constituição Federal em relação ao ingresso do cidadão no servido público, que é através de concurso, com exceção de alguns casos, como os cargos comissionados. Na época, o MPMG entrou com uma ação e pediu a demissão dos 680 contratados. Apenas no ano passado a decisão favorável saiu e a prefeitura foi multada em R$ 1.000 por cada pessoas em situação de contratação ilegal. Contudo, a execução da decisão ainda não foi realizada, devendo acontecer este ano.

Além disso, em 2010, foi assinado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), onde a prefeitura se comprometeu a demitir todos os contratados e realizar concurso até 31 de dezembro de 2012. O acordo não foi cumprido e a administração alegou à promotoria que não tinha recursos para fazer o processo.

"Apenas em 2013 foi feito um concurso, só que poucos foram chamados. Temos recebido muitas reclamações de pessoas que passaram (nas provas) e não foram chamadas. Eles chamam os primeiros colocados e para as demais vagas contratam", explicou Marise.

Ainda de acordo com a promotora, a Câmara Municipal também recebeu uma recomendação formal do MPMG para que demitisse os funcionários contratados e nomeasse os concursados, mas nenhuma mudança foi feita.

"Ingressei também com ação de improbidade administrativa contra o prefeito, pelas contratações ilegais, com co-responsabilidade da Câmara há quatro meses, mas nem as liminares foram apreciadas pela Justiça ainda", afirmou a promotora.

Segundo Marise, cerca de 700 pessoas passaram no último concurso feito pela prefeitura e ainda aguardam para tomar posse de seus cargos. Também, a promotora informou que não foi comunicada oficialmente sobre nenhuma demissão. A assessoria da prefeitura disse apenas que ainda não há data prevista para a realização de concurso.

Demissões já começam a afetar o serviço público na cidade

As escolas municipais, nesta terça, estão com as portas abertas, mas com a falta de professores, servidores da direção dividem-se em salas de aula.

"Fui demitido ontem e hoje eu já não fui trabalhar", afirmou o professor de informática Weider Felipe Pinto, 23. De acordo com ele, o contrato que tinha com a prefeitura era de um ano. "Os alunos estão indo para a escola, mas não tem professores, porque a maioria é de contratados", completou.

Um protesto é feito pelos servidores demitidos, na tarde desta terça, na praça Santa Rita. Cerca de 50 manifestantes estão no coreto da praça reclamando da decisão da prefeitura. Segundo uma moradora da cidade de 40 anos, que preferiu não ter o nome divulgado, a população está preocupada com a situação.

"Tenho filhos estudando em escolas municipais. Teve escolas que fecharam por não ter trabalhadores suficientes. Outras estão funcionando com número reduzido. Não sabemos quem está dando aula, quem está fazendo a comida das nossas crianças. E dizem que os concursados só entrarão em outubro, e como ficarão as escolas até lá?", desabafa a mulher, que mora em Sabará desde que nasceu.

Outras irregularidades

De acordo com Marise há uma cultura em Sabará de que os funcionários mais antigos não podem mais perder o cargo. Porém, como não existe "usucapião" de cargo público a promotoria não permitirá que isso continue a acontecer. "O Ministério Público vai continuar na vigilância", comunicou.

Além disso, segundo a promotora a prática de nepotismo e de apadrinhamento político é recorrente na município e serão denunciadas, assim como as irregularidades em licitações. "Vamos entrar ainda com outras ações". Segundo Marise, a prefeitura contratou a mulher do vice-prefeito para o cargo de secretária de assistência social.

A assessoria de imprensa da prefeitura se posicionou sobre uma das denúncias, por meio de nota, apenas oito dias após a reportagem ser publicada. Confira na íntegra a resposta.

No que se refere à alegação de nepotismo, o Supremo Tribunal Federal, ao editar a Súmula Vinculante nº 13, excepcionalizou os cargos políticos. Ou seja, para o STF, a nomeação de parentes do Prefeito ou Vice-Prefeito para ocupação de cargo político não configura nepotismo.

É muito importante considerar a diferenciação que os Ministros do Supremo fizeram entre cargos administrativos e cargos políticos, e claro ficou ainda que a vedação é para os primeiros. Cargos administrativos são aqueles criados por Lei do Ente Público para serem providos por concurso público ou em comissão e funções gratificadas, e para estes é absolutamente vedada à contratação de parentes da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo em comissão ou função de confiança.

Cargos Políticos são aqueles exercidos por Agentes Políticos e para estes não há vedação à nomeação de parentes. É exatamente o que ocorre no caso em discussão, vez que o cargo de Secretario Municipal é estritamente político, e não administrativo.

Logo, esclarecemos que, em decorrência da afirmação de que os secretários têm com o município um vínculo eminentemente político, não incidirão sobre estes as regras definidas na súmula vinculante nº 13.

Por isso, é possível ao prefeito nomear para o exercício das funções de secretários municipais, parentes de prefeito, vice-prefeito, vereadores e secretários. Conclui-se, portanto, que as afirmativas da reportagem estão em desacordo com a legislação vigente, não havendo qualquer caso de nepotismo no Município de Sabará/MG.

Entre a prefeitura e o Ministério Público

De acordo com Marco Antônio Xavier Santos, presidente do Sindicato dos Servidores Púbicos de Sabará, os principais lesados com as arbitrariedades da prefeitura são os contratados. Mesmo entendendo que o correto é eliminar a prática da contratação temporária, o representante sindical afirma que é preciso atentar para os danos causados aos servidores.

“Há pessoas que trabalharam na mesma função por dez, doze anos. Agora, ao serem demitidas, não têm direito sequer ao seguro-desemprego. É preciso achar um meio termo”, afirma Marco Antônio. O regime de trabalho estabelecido entre a prefeitura e os contratados - estatutário - garante apenas o recebimento de dias trabalhados, 13º salário proporcional e férias proporcionais na rescisão.  O sindicalista destaca que a incerteza afeta a estabilidade psicológica dos contratados e desestrutura toda a vida dessas pessoas.

O sindicato afirma que pediu esclarecimentos à prefeitura há duas semanas, sem sucesso, e que entrará em contato com o Ministério Público em busca de uma negociação.

Atualizada às 14h49 do dia 31 de julho de 2014