‘Armadilhas’

Minas ganha 12 barragens de rejeitos de mineração por ano  

De acordo com inventário da Feam, de 2008 a 2014, o número de estruturas aumentou 20%

Seg, 16/11/15 - 03h00
Mariana. Vista aérea da barragem de Germano, que tem nível de segurança abaixo do recomendado | Foto: douglas magno - 11.10.2015

Minas Gerais recebeu, em média, 12 novas barragens de rejeitos de mineração por ano (uma por mês), entre 2008 e 2014, passando de 373 para 450 estruturas do tipo, de acordo com dados da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam). A maioria delas é “molhada”, quando os resíduos do minério são acumulados com 60% de água e 40% de areia (e outros rejeitos) – como a do Fundão e Santarém, da mineradora Samarco, que se romperam em Mariana, na região Central do Estado, há 11 dias, deixando ao menos 11 mortos. Mais baratas, as barragens molhadas se tornaram armadilhas que ameaçam povoados, vidas e memórias e fazem com que especialistas repensem alternativas mais seguras e compatíveis com o volume de produção.

“Até este ‘acidente’, eu falaria que as barragens, principalmente as da Samarco, são construídas com as melhores práticas de segurança. Está todo mundo sem saber o que falar. Agora, teremos que criar novos parâmetros”, afirmou o engenheiro de minas Hernani Mota de Lima, professor da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop).

Antes, quando ainda se tinha minério rico a ser explorado – com mais de 60% de ferro –, a produção de rejeitos era pouca porque o material era extraído e enviado diretamente ao mercado, sem precisar de separação ou beneficiamento. Com o aumento da demanda, no fim da década de 70, a Samarco começou, de forma pioneira, a extrair minério com pouca concentração de ferro (45%), chamado itabirito, que tem grande prevalência em Minas. Para aumentar o teor de ferro ao ponto de ser exportado, foi preciso muita tecnologia, e passou-se, então, a utilizar a água para separar o minério da sílica (areia).

“O preço do minério passou a subir muito, e compensou lavrar (extrair) com baixo teor de ferro. Para aumentar esse teor, eles retiram a sílica (areia) do minério, gerando mais rejeitos”, explicou o geólogo Eduardo Marques, professor da Universidade Federal de Viçosa (UFV).

O “boom mineral” ocorreu em meados de 2006, com a tonelada de minério custando US$ 100. Segundo o engenheiro civil Marcílio Pereira, da área de meio ambiente, essa fórmula de extração adotada se revelou um sucesso, porém as estruturas de contenção de rejeitos começaram a ficar altas demais e fora do limite. “A preocupação inicial era aproveitar o itabirito. Mas o erro foi insistir 40 anos em uma técnica ultrapassada e não evoluir para processos a seco”, defendeu o engenheiro.

Modernas. De acordo com especialistas, as barragens secas ou em pasta, que são mais estáveis, são tendências na atualidade – a água é um dos principais agentes desestabilizadores de uma barragem. Porém, secar os rejeitos, assim como se faz com o minério, inviabilizaria a produção, conforme Lima. “Filtrar o minério concentrado é caro, mas é preciso tirar o máximo de água para exportar. Os custos não pagam a filtragem do rejeito, que é disposto próximo à usina de concentração na forma aquosa”, disse o engenheiro de minas. Ele conta que as mineradoras já estudam técnicas mais baratas para investir em barragens secas .

A Feam não informou quantas das 450 barragens de mineração são molhadas. A reportagem tentou repercutir o assunto com a Samarco, mas não tinha obtido retorno até a última sexta-feira. 

Tragédia deve mudar parâmetros

No futuro, nas aulas de engenharia, provavelmente professores e alunos vão dizer: “Essa tecnologia (de extração de minério) existe hoje (futuro) graças às mortes ocorridas na tragédia de Mariana”. A previsão futurista é do engenheiro de minas Hernani Lima, que acredita em grandes mudanças na mineração após o rompimento das barragens do Fundão e Santarém, na região Central de Minas Gerais.

O que se espera é que esse desastre ambiental/social realmente altere os padrões de segurança em barragens e também mude os paradigmas de fiscalização, a ponto de essas estruturas não serem mais um perigo para as populações. “Se rompeu é porque a gente precisa rever os nossos projetos. Esse vai ser o único ganho no final”, acrescentou o engenheiro Eduardo Marques. 

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