Racismo

Mulheres negras dizem ter sido barradas em boate de BH 

Pelo menos oito garotas relataram casos de discriminação racial em casa noturna na zona Sul

Qua, 07/05/14 - 03h01
Lotação. Boate alega que site com fotos de negros é a maior prova de que não há discriminação | Foto: Alex de Jesus/O Tempo

Pouco mais de uma semana após o incidente envolvendo o jogador de futebol Daniel Alves, que comeu uma banana atirada contra ele durante um do jogo do Barcelona, o debate em torno do preconceito racial veio à tona novamente nas redes sociais, dessa vez em Belo Horizonte. Pelo Facebook, mulheres criaram um grupo para divulgar a discriminação sofrida na entrada da boate Swingers Lounge, no Santa Lúcia, na região Centro-Sul da capital. Indignadas porque dizem ter tido tratamento diferenciado em função da cor de sua pele, sendo barradas na entrada, algumas pretendem inclusive acionar a Justiça contra o estabelecimento. A boate, por sua vez, nega qualquer atitude discriminatória, justificando que dá prioridade aos clientes associados da casa.


A reportagem de O TEMPO conversou com oito meninas que afirmam ter passado por situações semelhantes e, para todas elas, o sentimento é de revolta. O caso mais recente aconteceu no último sábado, quando a estudante de direito Rafaele Ariel do Nascimento Santos, 21, foi com a prima comemorar o aniversário de uma amiga na Swingers. Dos 20 convidados incluídos na lista da aniversariante, apenas Rafaele e a prima, ambas negras, foram barradas pelos promoters da boate, mesmo tendo chegado cedo e enfrentado horas de filas.

“Eram 22h30 e elas me ligaram falando que tinham sido tiradas da fila por motivo de lotação. Mas eu estava lá dentro, e a boate não estava cheia. Eles explicaram que a casa reserva apenas um terço dos lugares para não-sócios, mas eu comecei a perguntar para cada pessoa que entrava se era sócio ou não e ninguém era. Foi uma desculpa furada”, contou a aniversariante Bruna Loures, 19, estudante de arquitetura.

Rafaele, uma das criadoras do grupo, se diz mais incomodada com a humilhação. “O que fica de mais gritante é que pessoas na mesma situação que a gente entraram, e nós fomos barradas”, diz. Ao divulgarem a história, veio a surpresa: “De repente, apareceu um tanto de gente falando que passou pela mesma coisa lá, e descobrimos que isso é muito mais comum que se pensa. Inclusive um segurança lá de dentro, que já trabalhou em boates de várias cidades, disse que isso sempre acontece, mas que a Swingers é a ‘mais nojenta’ com o ser humano”, afirmou Bruna.

A professora Tamires Giordana Moreira, 26, pretende acionar a Justiça. “A gente pensa que está em um país democrático, mas eles estão apenas olhando aparências. Não sei se foi racismo, mas é muita coincidência os negros não conseguirem entrar”, ponderou.

Outro lado. A Swingers informou que trabalha com reservas de 70% da lotação da casa para sócios e 30% para não sócios e, em casos de fechamento de listas, como aniversários, todas as regras são enviadas antes para o aniversariante, avisando da possibilidade de lotação.

“A gente trabalha com um sistema que, ao acusar que os 30% estão ocupados, avisa quem está na portaria para informar o pessoal da fila. É uma forma de manter os nossos clientes fiéis”, justificou o gestor do estabelecimento, Michel Lucas Tomé de Oliveira. “Mas o pessoal hoje está se autodiscriminando. É só olhar o nosso site para ver que várias pessoas negras frequentam a casa. Isso é a maior prova, não tenho o que esconder”. 


Clube
Racismo
. Terminou sem acordo a audiência de conciliação envolvendo um salva-vidas de clube da capital, que pediu indenização por danos morais após sofrer discriminação de uma sócia. 

Entenda

Racismo. O crime de racismo acontece quando a ofensa não é dirigida a uma pessoa determinada, mas sim quando há o impedimento do exercício de direitos a um grupo em razão de sua raça, cor, etnia ou religião. Na legislação brasileira, o racismo é um crime imprescritível e inafiançável.

Injúria racial. A injúria, por sua vez, acontece quando há uma ofensa a determinada pessoa em virtude de sua raça. Tanto racismo quanto injúria são crimes que envolvem a discriminação, um conceito que diz respeito à exclusão, preferência ou restrição a atividades em função da cor da pessoa.

Casos. Segundo a Secretaria de Estado de Defesa Social, 147 ocorrências de preconceito de raça ou cor foram registradas em Minas no ano passado, sendo 24 em Belo Horizonte. Dados de 2014 não foram disponibilizados até o fechamento desta edição.

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