Santo Antônio do Monte

Quatro morrem em explosão dentro de fábrica de fogos de artifício

Segundo o Corpo de Bombeiros, apenas um jovem ficou ferido; empresa fica no bairro Bela Vista; região é forte na produção de explosivos

Ter, 15/07/14 - 08h50
Fumaça foi vista por vários pontos da cidade | Foto: Polícia Militar/Divulgação

Os pouco mais de 27 mil habitantes de Santo Antônio do Monte, no Centro-Oeste mineiro, vivem como se estivessem em um barril de pólvora prestes a explodir. O município tem 72 fábricas de fogos de artifício e registra explosões quase todos os anos. Nesta terça, no primeiro acidente de 2014, quatro mulheres que trabalhavam na produção de bombas morreram após o barracão onde elas estavam explodir. Um quinto funcionário conseguiu sair do local e sofreu apenas ferimentos leves.

O acidente aconteceu por volta das 7h20, em um dos 150 barracões da Fogos Globo. Duas bombas estouraram dentro de uma caixa, espalhando o fogo até acontecer a explosão, momentos depois. Elenilton Gonçalves, que manuseava os explosivos, contou que gritou ao perceber o problema, para que as colegas saíssem, mas só ele conseguiu escapar a tempo.

De acordo com a coordenadora do Pronto-Socorro Municipal, Cláudia Aparecida Pompéia Agreste, o homem de 20 anos está em observação no local. Ele teve queimaduras leves e recebe soro. "Ele contou que só escutou o barulho do estalo e quando viu tudo foi para os ares. Na verdade, toda a cidade escutou. Eu estive lá e é uma cena de terror", afirmou.  

Os moradores do bairro Bela Vista, a cerca de 400 metros da fábrica, uma das poucas que não fica na zona rural, contaram que a impressão é que estavam no meio de um terremoto. “Tremia tudo”, disse um deles.

Fiscais do Ministério Público do Trabalho (MPT) e peritos da Polícia Civil estiveram no local. Eles apontaram irregularidades no armazenamento de explosivo, o que pode, segundo informações extraoficiais, ter causado o grave acidente. Outra possibilidade é de problema no manuseio dos explosivos ou, até mesmo, pregos de uma tábua que teriam se soltado e causado atrito entre duas bombas. Conforme o MPT, na maioria das fiscalizações no município são constatadas irregularidades.

A assessoria do Ministério Público do Trabalho em Minas Gerais informou que a empresa Fogos Globo foi investigada em 2001, durante uma operação na região e na época assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). A fiscalização sobre a companhia recaía principalmente em relação a área ambiental. Desde então, a empresa é fiscalizada pelo órgão.

Vítimas

O galpão ficou destruído, nem mesmo a estrutura metálica resistiu. Daiana Cristina Maciel, de 25 anos, Maria das Graças Gonçalves Siqueira, de 42, Marli Lúcia da Conceição, 39, e Maria José Campos, 26, morreram na hora – dois corpos chegaram a ficar soterrados. Uma sexta funcionária do galpão faltou ao trabalho porque estava passando mal. Em estado de choque, ela não falou sobre o acidente.

“Elenilton disse que ocorreu algum atrito entre as bombas e então tudo começou a explodir. Toda a fábrica tremeu, eu achei que minha repartição também iria explodir. Todo mundo saiu desesperado”, contou a namorada de Elenilton Gonçalves, Patrícia Alves, que também trabalha na Fogos Globo.

Investigação

Um funcionário que pediu anonimato relatou irregularidades na empresa. “Todos nós sabemos dos perigos que nós corremos, mas ficamos muitos abalados porque nossa segurança é muito pequena e tem muito mais bombas que deveria”, disse.

A Polícia Civil abriu um inquérito para apurar o caso. Segundo o delegado Lucélio Santos, que está à frente do caso, testemunhas devem ser ouvidas nos próximos dias. “O laudo da perícia deve ficar pronto em até 30 dias”. Santos disse ainda que a empresa pode ser punida caso seja comprovada alguma falha. “Se for encontrado material ilícito ou for comprovado que ali tinha mais materiais que o permitido e que isso possa ter causado a explosão, a empresa pode ser penalizada”, declarou Santos. A Fogos Globo não quis se manifestar.

Efeitos na região

A Polícia Militar informou que pelo menos dez casas vizinhas à fábrica de fogos tiveram vidros de janelas ou portas quebrados por causa da explosão na Fogos Globo. “Foi uma explosão muito grande. Eu nunca tinha visto nada parecido, tudo aqui tremia. Muitas pessoas gritaram, e o pânico foi grande na região”, relatou a aposentada Maria das Graças Santana, que teve uma das janelas de sua casa quebrada.

Empresa legalizada

Para o coordenador do Sindicato das Indústrias de Explosivos no Estado de Minas Gerais (Sindiemg), Américo Libério da Silva, o que aconteceu foi mesmo um acidente, já que empresa se encontrava dentro de todas as normas.

“Infelizmente aconteceu. Não acontece com frequência, mas tem acidentes sem vítimas. Esse foi atípico. A empresa é sindicalizada com a gente, trabalhava legalmente junto ao Exército, Ministério do Trabalho, Meio Ambiente, Corpo de Bombeiros. A empresa ainda conta com engenheiros químicos e de segurança", garantiu.

Ainda segundo Silva, a cidade de Santo Antônio do Monte é a única do Brasil com a presença do Exército especificamente para fiscalizar a atividade na região.

A reportagem de O Tempo entrou em contato com a 4ª Região Militar do Exército em Belo Horizonte, que não atendeu as ligações.

Mercado de explosivos

A produção de fogos de artifício movimenta a economia da região, e infelizmente, também registra alguns acidentes. Em setembro do ano passado, uma pessoa morreu e outras duas tiveram queimaduras graves em uma explosão em uma dessas fábricas. 

A cidade de Santo Antônio do Monte faz parte de um polo industrial pirotécnico que reúne fábricas de pólvora e fogos de artifício em seis municípios da região. Em 2012, outra explosão em uma fábrica de fogos deixou dois mortos. Ambos eram funcionários da empresa Fogos Estrela e trabalhavam no momento da explosão.

Atualizada em 16/7, às 16h49

---

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo mineiro, profissional e de qualidade. Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar.

Siga O TEMPO no Facebook, no Twitter e no Instagram. Ajude a aumentar a nossa comunidade.