Consciência Negra

Contra todas as estatísticas

Negros que superam as barreiras sociais e econômicas ainda são exceção à regra

Por Queila Ariadne
Publicado em 20 de novembro de 2018 | 03:00
 
 
Virada. Pró-reitor da UFMG, Rodrigo Jesus foi o primeiro de sua família a se formar Foto: Fred Magno

Nos últimos seis anos, o percentual de brasileiros que se declaram pardos ou pretos subiu de 53,2% para 55,7% da população. Hoje, eles são 116,3 milhões, contra 90,2 milhões de brancos. Ainda assim, 71% dos que se formam em um curso superior são brancos e ganham 79,6% a mais do que os negros. Mas nem tudo são estatísticas negativas. “Em 2000, eu conhecia todos os negros da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) pelo nome, e tinha mais estudantes de intercâmbios de países da África do que brasileiros. Hoje, a presença dos negros é muito maior”, conta o pró-reitor de assuntos estudantis, coordenador do programa Ações Afirmativas da universidade, Rodrigo Ednilson Jesus.

Atualmente com 39 anos, ele foi o primeiro a se graduar na família. “Quando eu abri mão do meu trabalho para estudar (ciências sociais), minha família ficou assustada, pois as pessoas não acreditavam que a educação era melhor do que o trabalho. Eu morava em Ibirité e gastava cerca de duas horas para chegar. Logo, comecei a participar de programas voltados para os negros”, conta Ednilson, que chegou a ocupar o cargo de coordenador nacional de relações sociais e políticas de promoção de igualdade racial do Ministério da Educação (MEC), em 2011.

Agora, se preparando para o pós-doutorado em Portugal, ele fica feliz em saber que abriu portas para outras gerações da família, que já encaram o ensino superior como algo natural. “Estamos concluindo uma pesquisa sobre trajetórias dos cotistas. Em 2009, antes da política de cotas, eram 8.000 pardos, negros e indígenas nas universidades federais e estaduais de Minas Gerais. Em 2016, subiu para 86 mil”, afirma.

Na avaliação da analista da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (Pnad Contínua) do IBGE, Adriana Beringuy, a desigualdade que começa com as restrições de acesso à educação termina com reflexos na renda. “A taxa de desocupação é de 9,4% entre os brancos e de 14,6% entre os pretos. Essa estratificação começa na escolaridade. As pessoas que não tem o mesmo acesso ao ensino superior, ocupam cargos menos especializados. Consequentemente, o rendimento é menor, pois o mercado formal remunera melhor as pessoas mais escolarizadas”, explica Adriana.

Um exemplo pode ser visto no Judiciário. Levantamento feito pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em setembro deste ano sobre o perfil da magistratura brasileira revelou que ela é majoritariamente formada por brancos. De um total de 18.168 juízes, desembargadores e ministros dos tribunais superiores, 80,3% se declararam brancos, 16,5% pardos e 1,6% pretos.