Imensurável

‘Cultura da segurança acabou’

Liberdade, flexibilidade e conhecimento compartilhado são mais importantes do que salário

Dom, 06/11/16 - 02h00
Na Philips, ninguém tem sala, nem o presidente; isso melhora a comunicação e flexibiliza a hierarquia | Foto: Philips/Divulgação

Um cargo de confiança, salário compatível com o mercado e a segurança de estar na empresa há 18 anos não foram suficientes para manter Adriana Nascimento em seu antigo emprego. Há três meses, ela está na área de equipamentos médicos da Philips como diretora de relacionamento com o cliente e cita a possibilidade de trabalhar pelo menos uma vez por semana em casa (home office) como um dos motivos para a mudança. “Não tenho nada a reclamar da minha empresa anterior, mas segurança não é mais a única coisa que conta. Mudei para equilibrar minha vida pessoal com a profissional de forma mais estratégica”, afirma.

Para Adriana, outros valores além da flexibilidade foram motivadores, como o propósito e a proximidade com superiores. “Foi determinante o propósito do trabalho, estar em um ambiente que salva vidas. É uma combinação: você entrega valor para o cliente e para a empresa, e recebe como indivíduo. Além disso, aqui não tem hierarquia rígida. Ninguém tem sala, nem o presidente da empresa tem um local fixo. Isso ajuda muito na comunicação”, afirma.

Para a gerente de recursos humanos do GetNinjas, Marília Amêndola, Adriana representa a maioria dos profissionais. “A cultura da segurança acabou. Antes o profissional colocava a segurança em primeiro lugar. Hoje as pessoas estão mais ambiciosas, querem ser vistas, ter uma relação plena com empresa e líderes”, diz.

Segundo Luciana Caletti, CEO do Love Mondays – site que apresenta vagas de emprego com a avaliação de funcionários das empresas –, os profissionais hoje buscam identificação. “A geração mais nova quer se sentir representada pela empresa, ter um propósito no trabalho. Eles valorizam quando sentem que podem ser eles mesmos”.

O redator da Hotmart Carlúcio Vieira, 24, afirma que valoriza a liberdade e o compartilhamento. “As pessoas (na empresa) estão dispostas a compartilhar conhecimento. Então, posso melhorar. Tudo é compartilhado e colaborativo. Sinto que posso ser eu, posso me expressar”, diz Carlúcio.

Luciana Caletti afirma que muitas vezes a cultura pode ser mais importante que um salário alto. “Os benefícios diferenciados ajudam a manter o funcionário mais do que o salário”, diz. “O dinheiro deixou de ser o primeiro ponto para mudança na carreira. Como se define a estratégia, como é feito o bônus, isso motiva mais do que plano de saúde e salário”, afirma a gestora de pessoas do Apontador, Mariana Rocha.

Propósito. 58% dos entrevistados abririam mão de até 15% do salário para trabalhar em uma empresa com os mesmos valores que eles, segundo pesquisa feita pela Deloitte.

Minorias

Além do bem-estar dos funcionários, as empresas começam a pensar na inclusão social. Na semana do orgulho LGBT, ocorrida em julho em Belo Horizonte, Google, Hotmart e ThoughtWorks tiveram ações sobre diversidade sexual e de gênero. A analista de talentos Josie Ribeiro admite também a preocupação em inserir mais mulheres entre os desenvolvedores. Na Hotmart, são apenas duas entre 50 pessoas.

Polo mineiro

Para a presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos em Minas Gerais (ABRH-MG), Eliane Ramos, o fato de Belo Horizonte ser um polo de tecnologia está trazendo para a cidade uma nova relação entre empresa e funcionário. “Temos várias empresas com esse perfil, como a Sympla e a Sambatech. Elas querem atrair pessoas bem-preparadas e fazer com que gostem de estar ali”, diz Eliane. 


Regras

Legislação tem que ser respeitada

A liberdade e a flexibilidade pregadas pelas empresas não devem atrapalhar no cumprimento da legislação trabalhista, na opinião das analistas de talentos da Hotmart Natália Alves e Josie Ribeiro. “Fazemos um trabalho de conscientização com os funcionários, para mostrar que é necessário respeitar a lei”, explica Natália.

Segundo ela, na Hotmart os funcionários batem cartão, precisam fazer pelo menos uma hora de descanso, e hora extra é de no máximo duas por dia. “A gente conversa e mostra que essas exigências legais, no fundo, são boas para os funcionários. Com isso, não temos reclamação”, completa Josie.

A tecnologia é uma ferramenta para amenizar a rigidez das regras sem a necessidade de quebrá-las. “O home office é um ótimo exemplo. Mudou e aumentou as possibilidades do mercado de trabalho, no que se refere à flexibilidade para muitas pessoas, inclusive mães”, afirma a consultora de carreiras Aline Caldas.


 

 

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