Finanças

Esconder dívida causa insônia, descontrole alimentar e vícios

Quatro em cada dez inadimplentes têm vergonha de contar situação para amigos e parentes

Dom, 14/05/17 - 03h00

Liliane Alves, 33, engordou 7 kg. Com insônia constante, o marido dela só conseguia dormir se tomasse uma cervejinha antes. Em depressão, Janaína Ribeiro, 31, também não conseguia dormir e nem tinha vontade de sair. Nenhum dos três gosta de falar do motivo da ansiedade: dívidas. Nem Maria Teles, 28, que nunca contou ao marido sobre a bola de neve no banco, nem pretende contar jamais. São quatro histórias que ilustram os números alarmantes de um levantamento do Sistema de Proteção ao Crédito (SPC): quatro em cada dez inadimplentes têm vergonha de contar a amigos e parentes que possuem alguma dívida. Essa é uma informação que dá para esconder; já os efeitos colaterais por trás do endividamento são impossíveis de disfarçar. Segundo a pesquisa, 21,4% sentem uma vontade incontrolável de comer, 16,8% descontam em algum vício, 40% têm insônia, 66% se sentem deprimidos e 44% têm vergonha de parentes e amigos. Por isso, todos só aceitaram contar suas histórias sob a condição de anonimato. Os nomes são fictícios.

De março do ano passado para março deste ano, meio milhão de pessoas entraram para as listas de restrição ao crédito. São 59,2 milhões de nomes atualmente, o equivalente a 39% da população adulta brasileira. A economista-chefe do SPC Marcela Kawauti ressalta que, quanto mais tempo o inadimplente demorar para encarar o problema, mais sério este vai ficar. “Primeiro, é preciso destacar que ninguém fica inadimplente por má-fé. A pessoa imagina que todos estão olhando para ela, mas essa vergonha custa dinheiro. Uma dívida de R$ 1.000 no cartão de crédito, por exemplo, estará em R$ 1.880 após um ano. Depois de três anos, chegará a R$ 3.700. Melhor resolver quando</CW> é R$ 1.000”, alerta.

A economista lembra que muitos bancos oferecem chats. “É sempre melhor negociar pessoalmente, mas essa já é uma solução. O importante é buscar resolver o mais rápido possível”, ressalta. A vendedora Liliane demorou mais de um ano para ter coragem de procurar o banco. “Falar com a família estava fora de cogitação. Aos amigos, sempre dávamos desculpas para não sair porque não tínhamos dinheiro. O telefone tocava o tempo todo com cobradores. Até que um dia ensaiei o que diria à gerente, fui até lá, nervosa e suando, e consegui uma boa proposta. Deveria ter ido antes”, relata.

De acordo com a pesquisa do SPC, 42% dos inadimplentes sentem menos vontade de socializar. “Eu e meu marido ficamos desempregados ao mesmo tempo. Sempre nos apoiamos, mas às vezes rolava uma depressão. Não tinha cinema, não tinha roupa nova, não tinha passeio. Ele não conseguia dormir e começou a gastar o que nem tínhamos com bebida”, lembra.

O professor de ciências contábeis do Ibmec Bruno Araújo afirma que o primeiro passo é procurar o credor. “Não adianta adiar. Cada dia que passa, são mais juros. Procurar parentes pode ser mais complicado, porque a pessoa não deve apenas dinheiro, mas também um favor. Então, uma opção é tentar trocar a dívida por outra mais barata, o que pode ser feito com empréstimos com juros menores ou portabilidade da dívida para outro banco, que cobre taxas mais baratas. Outra possibilidade é tentar vender alguma coisa que você não usa mais”, afirma.

A economista do SPC destaca que o mais importante antes de procurar o credor é saber exatamente quanto você deve e quanto tem para negociar. “Se a pessoa está desesperada, pode aceitar qualquer proposta feita pelo banco e cair em outro problema. Então tem que saber quanto pode pagar”, alerta Marcela.

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