Vida noturna

Impostos e aluguéis levam bares e restaurantes a fecharem

Má gestão e custos elevados caracterizam o que o setor chama de “a pior crise em 20 anos

Por Janine Horta
Publicado em 15 de agosto de 2014 | 03:00
 
 
Chique, mas fechado. O Dádiva, uma das casas mais sofisticadas de Belo Horizonte, se despediu dos clientes após oito anos na praça Foto: ALEXANDRE GUZANSHE/O TEMPO

Com um elegante aviso postado em seu site, o restaurante O Dádiva, de Belo Horizonte, anuncia aos clientes que fechou as portas depois de oito anos. “O sucesso destes oito anos, os prêmios de melhor restaurante da cidade, e o reconhecimento de nossos clientes, são a prova de que fizemos certo e demos nosso melhor”, diz o aviso. Assim como aconteceu com O Dádiva, que funcionava no bairro de Lourdes, na região Centro-Sul de Belo Horizonte, outros bares, restaurantes e casas noturnas de diversas regiões da capital mineira também fecharam as portas, embora de forma não tão glamurosa.
 

Maria de Lourdes e Café de La Musique, no mesmo bairro de Lourdes, Elvis King Pub, na Savassi, O Bardô, em Santa Tereza, Belo Comidaria, no São Pedro, e Judith Café, no bairro Santa Efigênia, são alguns dos que fecharam também neste ano. No caso de O Dádiva, o chef de cozinha Eric Marty, que trabalhava lá, disse que pediu as contas antes do fechamento, pois percebeu que o restaurante iria fechar, só não sabia as razões. Já o proprietário, o empresário Alysson Lessa, que também era dono do Maria de Lourdes e do bar Tizé, não atendeu as diversas tentativas de contato da reportagem.

Planejamento. Para o presidente do Sindicato de Hotéis, Restaurantes e Bares (Sindhorb) e da Federação de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares do Estado de Minas Gerais (Fhoremg), Paulo César Pedrosa, essa é a pior crise vivida pelo setor em 20 anos, para todas as categorias do comércio. Além dos problemas econômicos pelos quais passa o país, Pedrosa explica que contribuem para o fechamento dos bares três fatores principais: os altos impostos, o preço dos aluguéis e a má gestão do negócio. “Se os empresários consultassem os sindicatos da categoria ou o Sebrae antes de abrir, para terem orientação, os empreendimentos não fechariam como hoje”, diz.Falta 

Ele explica que pesa também nas contas dos estabelecimentos um tributo devido à Prefeitura de Belo Horizonte (PBH). “Apenas para colocar mesas nas calçadas, a PBH cobra de R$ 4.000 a R$ 10 mil por ano”, afirma Pedrosa, que já teve seis bares, durante 30 anos, em várias regiões da cidade.

“Pura ilusão”. A dona do extinto Judith Café, Adriana Esteves, adorava o bar que abriu na rua Padre Marinho, no Santa Efigênia. Ela já tinha experiência com um bar em Nova Lima, e junto com o marido, pensou que seria bom negócio abrir uma nova casa em Belo Horizonte. No Judith Café ela colocou música ao vivo variada, cervejas especiais, além da normal, “cardápio de qualidade, com carne de primeira”, diz a empresária.

O tempo foi passando, e o preço de tudo subindo. Quando aumentou o custo da cerveja, Adriana não quis repassar ao consumidor, pois acabaria perdendo clientes. Somaram-se a essa alta o valor da taxa para colocar mesas na calçada, de R$ 8.000 anuais, mais o aluguel, de R$ 7.000 mensais, e o fim foi inevitável.

“Gosto de ir a bares e sonhava em ter um só para mim, onde pudesse receber os amigos e oferecer o melhor, e ainda ganhar dinheiro com isso. Pura ilusão. Não conseguia sentar na mesa com meus amigos nunca, não tinha mais vida pessoal, convivia com os problemas gerados pela bebida alcoólica, para os quais todo mundo já tinha me alertado, e no fim, com os aumentos da cerveja e da carne, passei a pagar para trabalhar”, conta Adriana. Como a empresária é também esteticista, fechou o bar e, de novo com o marido, abriu a clínica de estética Vila Algarve, no bairro Cidade Nova.

Mercado

Capital do boteco. De acordo com dados do Ministério do Turismo de dezembro de 2013, Belo Horizonte tem cerca de 14 mil bares. Equivale a um estabelecimento para cada 170 pessoas.

Clientela menor que a esperada prejudica casa

A falta de planejamento antes de abrir um negócio, apontada pelo Sindicato de Hotéis, Restaurantes e Bares (Sindhorb) como uma das causas para o fechamento de muitas casas, pode explicar o fim de O Bardô, que funcionava em Santa Tereza, na região Leste de Belo Horizonte. A reportagem tentou, mas não conseguiu falar com o dono. Mas o chef de cozinha do bar, Ricardo Caput, que hoje trabalha na 68 La Pizzeria, diz que a casa tinha um estilo “mais zona Sul”, e talvez por isso não conseguiu atrair público. “O movimento se concentrava mais em três dias na semana, e isso tornou-se insustentável”.

Já o Belo Comidaria, no bairro São Pedro, na região Centro-Sul, avisou pelo Facebook que não abriria “por problemas técnicos”, e comunicou aos funcionários o fechamento em uma reunião. Os donos não atenderam a reportagem e o telefone está desativado. No Facebook, há apenas a mensagem “Aguardem novidades”.