Consumidor

Inflação faz carne de boi sumir de prato-feito vendido em BH

Tradicional combinação entre arroz, feijão, batata frita e bife acebolado está cada vez mais rara e restaurantes substituírem a carne de boi por porções de frango, porco e omelete

Sáb, 22/01/22 - 03h00

Ir ao supermercado fazer as compras do mês custa cada vez mais caro no Brasil. Com uma inflação que encerrou 2021 em torno dos 10%, o peso dos alimentos no orçamento também reflete no preço do popular prato-feito. Em Belo Horizonte, a já conhecida combinação entre arroz, feijão, salada, batatinhas fritas e bife de boi acebolado é cada vez mais rara. Diante da alta do preço da carne bovina, os donos de restaurantes substituem a “estrela” da refeição por porções de porco, frango, peixe ou até mesmo omelete. 

Em casos mais críticos, a alta do preço dos itens que compõem o PF também é repassada ao consumidor. Na rua dos Guajajaras, no centro da capital mineira, o dono do Bar e Restaurante do Tardelli, Diego Matias Campos, precisou reajustar o valor do prato-feito. “Meu prato era R$ 14 e foi para R$ 16. Geralmente, trabalhamos com frango, linguiça e carne de porco. Também temos com a carne de boi, mas o preço é mais alto, e o pessoal prefere sem porque fica mais em conta”, diz.

Na mesma rua, o Raulzito Lanches também sentiu a alta no preço dos alimentos. “Trabalho com frango, pernil, espaguete à bolonhesa, omelete e tilápia. Boi, infelizmente, tivemos que cortar do cardápio. Ficou inviável. Nosso prato pequeno é R$ 15, e o grande, R$ 17. No peixe, cobramos R$ 2 a mais”, explica Adilson Xavier da Silva, proprietário do estabelecimento.

Segundo Silva, os legumes também aumentaram, especialmente no fim de ano. O mesmo vale para itens essenciais da cozinha, como o óleo. A batata, por exemplo, deixou de ser frita para chegar ao cliente somente cozida. “A parte de verduras e legumes do sacolão varia bastante. O preço sempre foi assim. Ultimamente, por conta das enchentes na Grande BH, alguns fornecedores ficarão até sem entregar”, diz.

De acordo com o economista Matheus Peçanha, da Fundação Getulio Vargas, a alta dos alimentos passa por três fatores: fenômenos temporais, a alta do dólar e a enorme exportação de carne bovina para a China. “Tivemos o efeito La Niña (fenômeno que causa resfriamento das águas do oceano Pacífico, o que interfere nas chuvas, por exemplo) no ano passado, o que provocou uma seca. Além disso, com o câmbio desse jeito, o produtor se sente incentivado a vender pra fora”, explica.

Quanto à carne de boi, Peçanha destaca que o preço chegou a cair quando a China embargou a compra do produto por questões sanitárias no fim de 2021. Com a retomada em dezembro, o custo voltou a aumentar para o brasileiro: “A demanda chinesa pela carne brasileira aumentou bastante. Isso acaba aumentando o preço doméstico, porque reduz a disponibilidade interna”.

Donos de restaurantes evitam repassar aumentos para clientes 

Apesar de reconhecer a alta no preço dos alimentos explicada pelo economista da FGV, Eduardo Gonçalves, dono do Restaurante Bem Mineiro, na rua Espírito Santo, preferiu não repassar o custo ao cliente para segurar as pontas. “Meu marmitex é R$ 15,50, e a marmitinha, R$ 13,50. Não podemos passar o reajuste porque senão a gente perde muito cliente. A situação não está boa.

Estamos segurando o preço com um prato bem satisfatório”, diz o empresário. A estratégia, ao menos no momento em que a reportagem visitou o estabelecimento, dava certo: salão lotado e entregas sem parar.

Com apenas três meses à frente do Café Bahia, na rua dos Tupis, William Cândido da Silva, 42, sente a alta das carnes e dos legumes. O TEMPO visitou o estabelecimento de 80 anos de história, e, no dia, eram duas opções de PFs: um com frango e outro com pernil. “Meu prato-feito aqui sai a R$ 19,90. Realmente, está difícil trabalhar com boi. Depende muito da semana e do mês. Estou com frango com quiabo hoje, mas ele está R$ 19 o quilo. Se continuar, não dá pra servir também”, lamenta o gerente. 

Marmita para não pesar no bolso

Na outra ponta da alta do prato-feito, o cliente também sai prejudicado nessa história. Quem tem costume de almoçar fora de casa começa a mudar o cotidiano e levar comida de casa. 

Ruth Santana, 25, trabalha como secretária em uma imobiliária e prefere a marmita ao PF quando possível. “Depois da pandemia, a inflação subiu. Consequentemente, tudo do supermercado subiu, as coisas básicas. O PF aumentou. Quando eu comia aqui (na rua dos Guajajaras, no centro da capital) era R$ 12. Agora, já está R$ 15. Normalmente, eu trago de casa, porque o bolso não aguenta”, explica a jovem. 

O gerente de vendas Kennedy Campos Braga, 26, também sentiu a mudança no PF. “Costumava almoçar todos os dias (fora), mas agora trago de casa três, quatro vezes por semana. Está bem puxado, principalmente porque a carne de boi sumiu do cardápio. Antigamente, você comprava por R$ 13, hoje só na casa dos R$ 18 (para comer bife bovino)”, afirma.

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