Mercado

Só trocar presidente não basta 

Agência de risco diz que é preciso fazer ajuste fiscal para Brasil conseguir grau de investimento

Sex, 02/09/16 - 03h00
Novos rumos. Moody’s alerta que a saída de Dilma e a efetivação de Temer não bastam para aumentar a confiança dos investidores | Foto: Edilson Rodrigues / Agência Senado

São Paulo. A agência de classificação de risco Moody’s afirmou ontem que o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff retira uma incerteza que pesava sobre a economia brasileira, mas alertou que o presidente Michel Temer pode enfrentar desafios para aprovar as reformas econômicas. Segundo a Moody’s, a simples troca de presidente não é suficiente para o país ter uma classificação menor nas agências de rating. O Brasil perdeu o grau de investimento de todas as grandes agências.

Segundo relatório da Moody’s, embora as propostas de Temer para sanear as contas do governo tenham animado o mercado e aumentado a confiança empresarial, uma melhora tangível nas contas fiscais do Brasil ainda precisa se materializar. “O governo teve relativo sucesso ao passar algumas reformas no Congresso, mas os detalhes de propostas de reformas-chave, como a da Previdência Social, ainda precisam ser delineados”, disse Samar Maziad, vice-presidente e analista sênior da Moody’s.

Além disso, a aprovação das reformas pelo Congresso exigirá consenso político, o que está longe de ser garantido. Essas reformas, afirma a agência, são necessárias para melhorar o perfil de crédito do país. A Moody’s foi a última das grandes agências de classificação de risco a retirar o selo de bom pagador do Brasil. Atualmente, o Brasil tem nota Ba2, com perspectiva negativa – o que significa que novos rebaixamentos podem ocorrer.

A Moody’s lembra que Temer propôs uma série de reformas, incluindo uma proposta de emenda à Constituição que limita o crescimento dos gastos públicos. Para a agência, o governo terá dificuldades de cumprir a proposta sem uma reforma da Previdência, pois os pagamentos de benefícios respondem atualmente por cerca de 40% das despesas federais.

Sem um aumento da idade mínima para a aposentadoria e a desindexação dos benefícios ao salário mínimo, outras despesas do governo terão de ser drasticamente reduzidas para garantir que o gasto público total seja consistente com o teto, afirma a Moody’s em nota. Por outro lado, caso as reformas sejam aprovadas, elas podem ajudar o governo a estabilizar o endividamento, o que ajudaria a melhorar a nota de crédito brasileira.

Editorial do “NYT”. O jornal norte-americano “The New York Times” dedicou um editorial ontem para comentar o impeachment de Dilma Rousseff. Entre outros temas, o texto destaca que, desde que Temer assumiu o cargo, em maio, a economia do Brasil “melhorou modestamente” em meio às expectativas do mercado por reformas, incluindo privatizações e uma agenda de ajuste fiscal.

“Enquanto o equilíbrio do Orçamento vai exigir cortes dolorosos, Temer deve ser judicioso ao reescalonar os programas sociais que deram popularidade ao Partido dos Trabalhadores”, afirma o editorial.

Relatório

Para FMI, há sinais de melhora

Nova York, EUA. As perspectivas para a economia brasileira apresentaram certa melhora nos meses recentes, afirma o Fundo Monetário Internacional (FMI) em documento preparatório para a reunião do G-20, o grupo dos países ricos do mundo, que será realizada na China com a presença do presidente Michel Temer. O relatório do FMI destaca que as exportações brasileiras e a produção industrial têm reagido positivamente à queda do dólar no país e à melhora dos índices de confiança de consumidores e empresários no Brasil, que começa a se recuperar de suas baixas históricas.

Economista do FMI, Helge Berger disse que países que estavam com situação muito negativa nos últimos trimestres e anos, como Brasil e Rússia, estão mostrando uma estabilização ou mesmo um “leve movimento” de melhora. Em julho, pela primeira vez desde 2012, o FMI não rebaixou as previsões de crescimento da economia brasileira.

O documento do FMI evita tocar na questão política brasileira e ressalta que o desempenho dos principais países emergentes tem mostrado diferenças importantes. Enquanto o Brasil e a Rússia seguem em recessão, a Índia continua com forte expansão do Produto Interno Bruto (PIB), e na Turquia uma tentativa frustrada de golpe militar ajuda a aumentar a incerteza sobre os rumos do país.

O crescimento mundial continua registrando expansão modesta, mesmo com juros muito baixos ou negativos nos países desenvolvidos, ressalta o relatório. Os Estados Unidos, a maior economia do mundo, devem crescer menos do que se esperava no começo de 2016, e a expansão do Japão e da zona do euro mostrou moderação. Já o Reino Unido deve enfrentar forte desaceleração.

O balanço de riscos para os rumos da atividade econômica mundial “continua pendendo para a piora”, segundo o FMI. O documento cita que potenciais ameaças para a expansão mundial incluem a inflação muito baixa em países desenvolvidos, mudanças na economia da China, além de questões geopolíticas.

Bovespa se descola do cenário interno após o impeachment

Brasília. A Bovespa recuperou ontem parte da queda da véspera e terminou o dia em alta de 0,58% aos 58.236,26 pontos. A alta foi amparada principalmente em ações como Petrobras e Vale, que operaram descoladas de seus referenciais no exterior. O cenário político interno foi importante fonte de incertezas, mas teve pouca influência nos negócios, um dia após o impeachment de Dilma.

Com o presidente Michel Temer a caminho da reunião do G-20, na China, as atenções voltaram-se ao cenário internacional, onde persistem as discussões em torno dos juros nos Estados Unidos. Após cinco meses consecutivos de expansão, o índice dos gerentes de compras (PMI) do setor industrial dos EUA caiu e também afetou o mercado.