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Ao subversivo João das Neves

Rufo Herrera, Titane, Túlio Mourão, Glicério Rosário e Frei Chico participam do tributo

Por Raphael Vidigal
Publicado em 15 de fevereiro de 2019 | 03:00
 
 
João das Neves e Titane tiveram uma filha, Maria Íris Eliane Gouvea/divulgação

Quando Titane, 58, subir ao palco neste domingo para homenagear João das Neves (1934-2018), ainda não terão se passado seis meses da morte do dramaturgo, com quem a cantora mineira foi casada por mais de 20 anos. “Como é tudo muito recente, as sensações são embaralhadas, não sei se quem vai estar em cena é a intérprete, a pessoa ou a mulher. Acho que vai ser uma mistura de tudo um pouco”, admite Titane.

Batizada com o nome de “Voa Menino Voa”, a iniciativa surgiu a convite do Verão Arte Contemporânea (VAC). Mais exatamente da diretora Ione Medeiros, do compositor Rufo Herrera e da pianista Berenice Menegale, todos ligados à Fundação de Educação Artística, responsável pela vinda do dramaturgo carioca para Minas Gerais no início dos anos 90, quando ele fixou residência em Lagoa Santa, na região metropolitana da capital.

“Eles queriam um artista rigoroso e com a sensibilidade necessária para entender a situação”, afiança Titane. À época, a associação cultural e ecológica do parque Lagoa do Nado encampava um movimento pela preservação da área verde, que era cobiçada pela especulação imobiliária, com pretensões de construir um conjunto habitacional. Titane fazia parte dessa “juventude bastante aguerrida”, e foi ali que ela teve o primeiro contato pessoal com quem viria a ser seu amor.

Às margens do lago, João encenou uma adaptação do livro “Primeiras Estórias”, de Guimarães Rosa. “É significativo para mim que o convite tenha partido dessas pessoas, porque me remonta a um tempo da minha vida em que eu estava em formação. Foi nessa época que comecei a trabalhar com o João, e, logo depois, nos apaixonamos nas coxias”, conta.

Convidados. Todos os convidados presentes à homenagem têm uma intensa ligação afetiva com o diretor teatral, que, durante a ditadura militar, participou da fundação do Grupo Opinião. Essa escolha está em consonância com a própria condição afetiva do legado artístico e pessoal de João, artista que sempre demonstrou profundo sentimento e empatia pelos oprimidos.

Entre os participantes está Maria Íris Neves, filha de Titane com João. Ela será a responsável por dar voz a “Neves”, tributo em forma de canção feito por Sávio Henrique, o Savoca (irmão de Titane), que traz uma dedicatória especial: “Para o sempre subversivo João das Neves”. “A mensagem mais forte e atual que o João deixou, na minha opinião, é a de que o teatro, como a vida, é uma construção coletiva, ninguém se salva sozinho”, observa Titane.

Canção. Pouco depois de ser criada por João, a companhia Os Duendes assumiu a administração do Teatro Arthur Azevedo, na periferia do Rio. Mas não durou muito tempo. Naquele mesmo ano de 1960, o dramaturgo e seus pares foram expulsos pelo governador Carlos Lacerda (1914-1977), acusados de subversão.

Em 2015, ao ser tema de uma mostra, João pichou as paredes com a frase “Viva o MST”. Vivendo no Acre na década de 80, ele conviveu com tribos indígenas e dedicou espetáculo ao ambientalista Chico Mendes (1944-1988). A canção “Tererê”, do índio Kanatyo Pataxó, era uma das preferidas de João e será cantada por Titane. “Ela traz um espírito de perseverança, de que a vida vale a pena”, finaliza.

Serviço. “Voa Menino Voa”, domingo (17), às 20h, no CCBB (praça da Liberdade, 450, Funcionários). R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia)