Televisão

Fanáticos por 'Chaves' lamentam o fim das exibições do clássico seriado

Se sentindo 'órfãos', aficionados agora torcem por solução de impasse entre Televisa e Grupo Chespirito

Por João Renato Faria
Publicado em 08 de agosto de 2020 | 03:00
 
 
Divulgação/Televisa

“A sensação é de estar órfão”. É assim que o coordenador de marketing Júnior Achiles, 36, descreve a última semana. Presidente do fã-clube Chaves e Sua Turma, um dos principais do país dedicado ao seriado mexicano, ele e uma legião de apaixonados pelo personagem foram surpreendidos com a notícia de que o programa não seria mais exibido na televisão a partir de 1º de agosto.

O motivo é um impasse entre a Televisa, emissora mexicana que fazia a distribuição da atração, e o Grupo Chespirito, comandado pelos herdeiros de Roberto Gómez Bolaños e que detém os direitos intelectuais de todos os trabalhos do ator e dramaturgo, que morreu em 2014. O problema não afetou só o Brasil, onde “Chaves” estava disponível no streaming Amazon Prime Video, no Multishow e no SBT – canal no qual foi transmitido por 36 anos. Todos os canais da América Latina que exibiam o programa suspenderam a atração de suas grades, sem previsão de retorno. 

A briga de bastidores prejudicou os fãs, que ficaram sem acesso aos episódios e lamentam a falta de um posicionamento claro dos envolvidos. “Estamos a ver navios, ninguém dá uma resposta clara. Pegou todo mundo de surpresa, e só soltam notas vazias, não informam se tem previsão de retorno”, critica Achiles. Para tentar reverter a situação, os fã-clubes brasileiros lançaram um abaixo-assinado pedindo o fim do impasse e a volta do programa para a televisão, que já conta com mais de 40 mil assinaturas. 

Segundo o crítico de TV Flávio Ricco, a espera pode ser curta. Há a expectativa de que o Grupo Chespirito esteja prestes a anunciar a volta da atração em uma plataforma de streaming, sendo a Netflix a mais cotada. “O ‘Chaves’ não vai simplesmente sair de cartaz. A dúvida agora é como e quando ele vai voltar”, afirma. 

Saudosismo

Enquanto a disputa não é resolvida, os aficionados estão recorrendo a DVDs e até a antiquadas fitas VHS para assistir às histórias de Chaves, Chiquinha, Quico, Seu Madruga, Dona Florinda e toda a turma da vila. “A gente não tem nem o refresco do YouTube, já que estão retirando os episódios de lá também”, lamenta a jornalista Kary Subieta, 31. A casa dela, em Araruama (RJ), é repleta de bonecos e objetos que remetem ao universo criado por Bolaños. “Eu tenho um DVD oficial, que tem várias esquetes do programa ‘Chespirito’, de onde surgiu o Chaves. Mata a saudade”, conta. 

A recepcionista Jéssica Simão Silva, 28, de Bela Vista de Minas, no Vale do Aço, tomou um susto quando soube que as exibições estariam suspensas. “Todo mundo sabe que sou fã, começaram a me marcar nas redes sociais, mandar WhatsApp. Chorei, literalmente”, diz. “Está sendo torturante. Sempre assisto a ‘Chaves’ antes de dormir. Agora estou tendo que ver ‘Pica-Pau’, pelo amor de Deus”, se exaspera. 

Simplicidade explica fenômeno

Sucesso de audiência há quase quatro décadas, “Chaves” sempre foi usado pelo SBT como uma espécie de coringa da programação, cobrindo o buraco deixado por atrações que não apresentavam bons índices. “O grande segredo é a simplicidade. Ele fala diretamente com o público, foi passando de geração a geração, e ele sempre continuou dando bons resultados”, analisa o crítico de TV Flávio Ricco. 

O jornalista, roteirista e diretor Marcos Pena destaca que, por trás dos recursos visuais simples, existe um texto primoroso. “Não é por acaso que chamavam o Bolaños de ‘Chespirito’, ou seja, pequeno Shakespeare. Você vê várias vezes, sabe o que vai acontecer e ainda assim acha bom”, conta. “O texto é muito rico. Por exemplo, o Chapolin: é um super-herói atrapalhado, que não resolvia caso nenhum, é um piadista, pouco instruído, mas cativa justamente pela sua limitação”, explica. 

Não por acaso, “Chaves” foi a inspiração para Pena criar o curta-metragem “Moleque”, lançado em 2016 e que adapta o universo de Chaves para Belo Horizonte (facebook.com/molequeoficial). O filme se desdobrou em uma trilogia multimídia, que inclui uma história em quadrinhos desenhada por Dan Arrows, e em um game, que já está em desenvolvimento. “‘Chaves’ não tem episódios novos há 30 anos e tem essa legião de fãs. É um produto cultural muito significativo”, conclui.