Série

As mil reviravoltas do bom suspense

Michael C. Hall volta como pai de uma adolescente desaparecida em 'Safe'

Qua, 23/05/18 - 03h00

Depois de assistir “Safe”, que estreou na Netflix no último dia 10, você nunca mais vai olhar para seus vizinhos do mesmo jeito. Na produção original do serviço de streaming criada pelo mestre dos livros de suspense Harlan Coben, a lição que fica é: ninguém conhece ninguém. O ator Michael C. Hall volta à telinha, virando de vez a página do seu eterno “Dexter” e exibindo um surpreendente sotaque britânico. Que me desculpem os adeptos da dublagem, mas para se ter a experiência completa desta série é fundamental ouvir no idioma original. Chega a ser quase uma distração escutar o norte-americano Michael C. Hall arriscando palavras tipicamente britânicas com um sotaque consistente, mas pouco crível. Ele é Tom Delaney, um ex-militar, cirurgião, viúvo e rico que cria sozinho duas filhas, num condomínio perto de Londres cercado por muros, câmeras e vigias. Até que a mais velha, Jenny (Amy James-Kelly), desaparece.

Desesperado, e já carregando uma enorme culpa desde a morte da mulher, um ano antes, ele começa a investigar por conta própria. Acaba avançando mais que a polícia, liderada por sua namorada e vizinha Sophie Mason, papel em que Amanda Abbington está espetacular. Qualquer informação a mais seria spoiler. “Safe” segue o caminho seguro já trilhado por “Big Little Lies” ao colocar a classe média alta sob o microscópio? embora uma parte da crítica inglesa tenha considerado a série uma homenagem malfeita a Agatha Christie.

Ainda assim, “Safe” é daquelas séries que pedem uma maratona porque, a cada cena, apresenta uma reviravolta, uma informação nova sobre um personagem e a constatação de que todas as aparências? mas todas mesmo? enganam.

No frigir dos ovos, o “quem matou” é o que menos importa, e, ao mesmo tempo, torna-se a revelação mais impressionante da série, apresentada, literalmente, nos últimos minutos dos oito episódios? arte na qual Harlan Coben, com 30 livros publicados e mais de 70 milhões de exemplares vendidos no mundo todo, é mestre.

O errado que dá certo. Precisamos dar o braço a torcer. Por mais que a série seja boa para quem admira o suspense, às vezes a narrativa parece inverossímil. Por exemplo, Tom Delaney, com a ajuda do amigo médico Pete (Marc Warren) e de um hacker amador, consegue estar sempre um passo à frente da polícia.

Quando uma série se apoia fortemente na trama e nas atuações, deixando fotografia e trilha sonora, por exemplo, em segundo plano, os atores se expõem mais. É o caso de Hannah Arterton, que até o fim não consegue convencer como a policial Emma Castle. Com expressões faciais mais de psicopata que de boa moça, ela deixa o público sem saber se foi má atuação ou se suas caras e bocas eram deliberadas para confundir a audiência no meio de tanto mistério.

A família Marshall, encabeçada por Jojo (Nigel Lindsay), garante momentos cômicos à série, com suas tentativas de se livrar de um corpo, mas protagoniza uma daquelas sequências em que o espectador revira os olhos para trás, ao usar a digital do corpo congelado para desbloquear o celular do morto. Na vida real, técnicos explicam, não basta aquecer a pele para que isso funcione. O recurso é furado, mas do ponto de vista narrativo, até cai bem, como todas as reviravoltas malucas propostas por Harlan Coben e que prendem o interesse do público até o fim. Até porque séries assim devem ser encaradas muito mais como entretenimento do que levadas a sério como retratos de uma era ou de uma classe social.

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Original. Harlan Coben também é autor de “The Five”, um drama criminal em dez episódios feito originalmente para o canal Sky1, e agora no catálogo da Netflix no exterior. No Brasil, a série ainda não chegou.

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