Barreiras

Da metralhadora ao 'Lalá' de Conka

uma iniciativa em que a arma de dimensão fálica foi substituída por imagens que colocam o sexo da mulher em primeiro plano não foi igualmente bem recebida nas redes sociais

Dom, 24/09/17 - 03h00

Dois videoclipes protagonizados por mulheres obtiveram reações diametralmente opostas nas redes sociais. Lançado em dezembro de 2015, “Metralhadora”, da banda baiana Vingadora, ocupa a quinta colocação entre os brasileiros mais vistos no YouTube, com mais de 250 milhões de acessos. A música se tornou um hit do carnaval de 2016.

“A ideia do clipe veio após uma reunião com o nosso empresário, pensamos em algo que deixasse a coreografia mais evidente, envolvida em um cenário nada habitual, que é o campo de guerra”, explica a vocalista Tays Reis. No referido clipe, as onomatopeias do refrão são reproduzidas com gestos onde as mulheres carregam armas imaginárias e as apontam para os inimigos, que, nesse caso, são todos homens, numa verdadeira guerra de gêneros.

“A inspiração veio da própria letra da música, feita em homenagem a uma parede de som, chamada de ‘paredão metralhadora’, que reúne equipamentos como corneta, médio, grave, características que usamos na música”, diz.

São os primeiros versos da canção que entoam: “paredão zangado/ grave tá batendo/ médio tá no talo, corneta tá doendo”. “O clipe retrata a imagem de um paredão utilizado como arma para uma disputa musical, que traz a figura da mulher como guerreira, assim quebrando barreiras e mostrando toda nossa força”, defende Tays. “Vingadora é uma banda que vende dança, eu gosto disso, faz parte de mim”, diz.

Oral. Por outro lado, uma iniciativa em que a arma de dimensão fálica (no caso, a metralhadora) foi substituída por imagens que colocam o sexo da mulher em primeiro plano, ainda que por metáforas como frutas e flores, não foi igualmente bem recebida nas redes sociais.

O clipe de “Lalá”, da rapper curitibana Karol Conka soma, hoje, pouco mais de 4 milhões de visualizações. Colocado na rede em junho deste ano, ele despertou reações que culminaram com sua censura no YouTube. “Isso não me abala, só prova que o prazer da mulher é um tabu, é como se vagina e prazer não combinassem. É importante falarmos sobre o assunto para mantermos as pessoas informadas e evitar decepções. Imagine que leve seria o mundo se todos gozassem de verdade”, sugere Karol.

Para compor a música, ela afirma ter se inspirado em vivências pessoais e histórias de amigas que tiveram más experiências ao receber sexo oral. Enquanto entoa os versos “moleque mimado bolado que agora chora/ só porque eu mandei ajoelhar/ fazer um lalá por várias horas”, homens ajoelhados têm as respectivas cabeças levadas para frente.

Noutro momento, a própria rapper imita com a mão o órgão sexual feminino e repete os movimentos de língua descritos. O alto número de denúncias foi usado como justificativa para retirar o vídeo do ar, decisão revista posteriormente. “Procurei ser didática, direta e sutil ao mesmo tempo”, defende Karol.
Apesar da polêmica, nem só de pedras padeceu a canção. “Muitas mulheres me agradeceram e se sentiram representadas. Muitos homens também, pois diziam fazer corretamente, de acordo com o que diz a música, e alguns se mostraram frustrados ao perceberem que não sabem fazer, se identificando com trechos da canção”, conta a artista.

“Thriller”, de Jackson, mudou os paradigmas

Em 1984 o mundo perdeu, de uma só vez, o cineasta François Truffaut, o cantor Marvin Gaye, o ator Richard Burton e os escritores Truman Capote e Pedro Nava, mas ganhou, para sempre, o clipe de “Thriller”, hit de Michael Jackson, já em seu trono de rei do pop, e que teve a direção do cineasta John Landis.

“Antes dele os clipes tinham cara de programa de TV, era uma banda tocando e só. ‘Thriller’ muda tudo, condensa a linguagem pop, mistura comédia e terror dos anos 80 com qualidade cinematográfica”, assegura o produtor musical Daniel Ferro.

Crítico musical, Antônio Carlos Miguel é outro a apontar a produção como responsável pela mudança paradigmática no gênero. “Jackson se cercou de grandes realizadores e deixou todas as pontas bem amarradas, com apelo visual, dramático, e, claro, da própria música”, diz.

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