Artes cênicas

Força do teatro das periferias  

Mostra “Teatro na (da) Periferia” reúne Grupo Pandora , de São Paulo, e ZAP 18 para troca de experiências artística s

Qua, 14/10/15 - 03h00
Humano. Inspirados em Plínio Marcos, paulistanos do Pandora apresentam uma versão mundana de Jesus cercado por questões políticas | Foto: Luh Silva / Divulgacao

Um teatro que fala da e para a periferia sem menosprezar suas potências criativas, revelando suas questões e levantando questionamentos inerentes aos seus moradores. Essa parece ser a utopia, essa que se move em direção ao horizonte, dos grupos Pandora de Teatro, da capital paulista, e dos mineiros, residentes no bairro Serrano, regional Pampulha, da ZAP 18. A força do teatro de ambos será compartilhada com o público, a partir de hoje, quando as duas companhias apresentam seus espetáculos, promovem debates e trocas de seus processos criativos, com mediação da Cia. Cóccix, outro grupo residente na periferia da cidade. “Acredito que estar nas bordas da cidade é uma opção de ambos os grupos”, avalia Cida Falabella, coordenadora artística da ZAP 18. “Nossa ideia nunca foi invadir a periferia, mas sim dialogar e repercutir com ela”, completa.

A vinda do grupo Pandora a Belo Horizonte faz parte de um desejo de conhecer realidades parecidas com as que eles convivem no bairro Perus, região Noroeste de São Paulo. “Para nós, foi uma questão muito natural nos instalarmos nessa região. O grupo nasceu aqui e nosso trabalho sempre foi feito para cá e para os bairros vizinhos”, revela Lucas Vitorino, um dos integrantes do Pandora.

“Para nós, têm dois pontos importantes de se fazer teatro na periferia. Primeiro, evitamos esse baixo populismo de menosprezar a capacidade do público e tentar facilitar sua vida. Como se fosse possível determinar o que é o teatro da periferia e como se tivesse apenas uma maneira de fazê-lo. Depois, nós tivemos uma experiência que virou uma chave para nós. Quando fizemos nossa peça ‘Relicários de Concreto’, revelamos diversas histórias dos moradores do bairro”, pontua. Ele se refere a uma grande fábrica de cimento, sediada no bairro Perus, que funcionou até os anos 80 e que ficou marcada por sua grande produção no processo de verticalização de São Paulo e por movimentos grevistas. Fechada há quase 30 anos, atualmente existe uma discussão sobre a criação de um centro cultural no local.

Na sede da ZAP 18, o grupo apresenta seu espetáculo “Jesus-Homem”, inspirado em texto de Plínio Marcos, no qual o emblemático personagem bíblico é mostrado como um ser político, envolto em um contexto complicado. A temática da peça, segundo Vitorino – responsável pela direção –, foi capaz de atrair um público religioso, não acostumado a ir ao teatro. Se eles tiveram problemas com a temática “polêmica”? Vitorino garante que não. “Pelo contrário! Pode parecer uma blasfêmia, mas se trata de uma parábola”.

Já a ZAP 18 apresenta o espetáculo “Coletivo 4403A – Zoológico”, fruto de sua oficina de capacitação, que trata sobre o transporte público das grandes cidades brasileiras e as narrativas entrecortadas que surgem no convívio de diversas pessoas que se veem diariamente, mas não se conhecem. Com texto e direção de Gustavo Falabella Rocha, a peça é um retrato poroso de uma realidade que concerne uma grande fatia da população brasileira. Para o diretor, quando a companhia se instalou na periferia, a primeira percepção era de que existia uma aproximação perigosa dos jovens com as drogas e a violência. Hoje, eles percebem outras questões no bairro Serrano. Em especial uma miséria, que não é econômica, mas, sim cultural, de valores.

Na ou da periferia? Teatro da periferia ou feito na periferia? Essa foi a primeira questão dos integrantes ao batizarem a ZAP. Eles pensavam que poderia ser uma Zona de Arte na Periferia, mas parecia mais apropriado assumir o ponto de vista do lugar que pretendiam ocupar – com suas questões, problemas, mazelas.

Assim, passaram a ser Zona de Arte da Periferia. Porque era um olhar de dentro, feito lá mesmo, e não esse olhar do estrangeiro ou do colonizador que chega em um local desconhecido e tenta educá-lo.

Programação

“Coletivo 4403A – Zoológico” – Hoje e amanhã, às 20h30

“Jesus-Homem”, sexta e sábado, às 20h30

Troca artística entre os grupos. Sábado, das 9h30 às 12h30. Atividade gratuita.

Bate-papo sobre espaço cultural e sustentabilidade dos grupos.

Domingo, das 10h às 13h. Atividade gratuita.

Onde. ZAP 18 (Rua João Donada, 18, Serrano)

Quanto. R$ 14 e R$ 7 (meia-entrada)

---

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo mineiro, profissional e de qualidade. Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar.

Siga O TEMPO no Facebook, no Twitter e no Instagram. Ajude a aumentar a nossa comunidade.