Cinema

Shyamalan volta à boa forma 

Após quatro fracassos seguidos e uma passagem pela TV, cineasta parece iniciar recuperação com “A Visita”

Sex, 04/09/15 - 03h00

Los Angeles, EUA. “Sei lá, cara. Estava ruim da cabeça”. M. Night Shyamalan, analisando há pouco tempo as escolhas feitas na carreira que deram errado, foi quem disse essas palavras para, em seguida, cair na gargalhada. “Brincadeira!”. Mas a meiguice em seus olhos o traiu: havia um quê de verdade ali.

Ao contrário de seus primeiros quatro trabalhos, todos de muito sucesso – começando com “O Sexto Sentido”, em 1999 –, os quatro últimos foram uma série de fracassos. “A Dama na Água”, “Fim dos Tempos”, “O Último Mestre do Ar” e “Depois da Terra” mancharam feio sua reputação entre os cinéfilos. O cara que inventou essas porcarias quer que a gente compre ingresso para vê-lo de novo?

Mas é aqui que entra a jogada que ninguém tinha antecipado: Shyamalan, aos 45 anos, mais humilde e maduro, passou a limpo sua vida profissional, mudou várias coisas – e o resultado é um suspense cômico extravagante chamado “A Visita”, que tem tudo para ser uma recuperação cinematográfica surpreendente, ou pelo menos o início de uma.

Depois de impiedosamente criticado, há dois anos, por “Depois da Terra”, aventura de pai e filho no espaço sideral estrelada por pai e filho na vida real, Will e Jaden Smith, Shyamalan foi para a TV, integrando a equipe responsável por “Wayward Pines”, série de mistério da Fox que conquistou o público (mesmo que não todos os críticos) neste verão graças à sua excentricidade. Uma segunda temporada já está sendo negociada.

“Como a televisão tem menos recursos, deu para ver quanta ‘gordura’ eu carregava, quantos maus hábitos trazia comigo. E a sensação de aos poucos me desvencilhar de tudo isso foi ótima”. (Donald De Line, um dos produtores executivos da série, disse que Shyamalan se mostrou “positivo, cheio de energia e boa vontade” e nem um pouco “mandão e cheio de vontades”, como afirmaram alguns executivos.)

Em termos do trabalho, Shyamalan fez mudanças drásticas, distanciando-se de projetos mastodônticos como “O Último Mestre do Ar” e “Depois da Terra” – filmes que, ao contrário de seus sucessos iniciais (“Sinais”, “A Vila”, “Corpo Fechado”), não foram baseados em suas próprias histórias. “A Visita”, que ele escreveu, produziu e dirigiu, chegará aos cinemas dos EUA em 11 de setembro. Shyamalan também pôs quase US$ 5 milhões do próprio bolso para realizá-lo.

“Pode ter sido uma grande besteira, mas só fez aumentar o risco. Só havia uma saída para mim. Tinha que fazer um ótimo filme. Tinha que fazer dar certo”, disse ele durante a entrevista no Hotel Bel-Air.

Com uma de suas marcas registradas – o final surpreendente –, “A Visita” conta a história de dois adolescentes em visita aos avós de comportamento estranho, ou Nana, interpretada por Deanna Dunagan, que arranha as paredes à noite, e Pop-Pop (Peter McRobbie), que guarda um segredo no galpão, entre outros lugares. E tem feito um sucesso inesperado com o público nas exibições prévias.

“Admito que não esperava nada, mas foi um dos melhores filmes de terror que já vi. E engraçado também”, confessa Alexa Hernandez, que assistiu à novidade, em julho, na Comic-Con Internacional de San Diego. Depois de conferir o longa, William Bibbiani, crítico do CraveOnline, escreveu no Twitter: “Fazia muito, muito, MUITO tempo que M. Night Shyamalan não criava um filme tão bom”.

Shyamalan aprendeu a duras penas que ser um diretor “auteur” – projetando o que lhe ia na mente, sem levar em consideração as correntes culturais e a venda de ingressos – talvez seja o caminho mais ingrato a se percorrer em Hollywood. É possível se manter assim, mas geralmente resulta em longos períodos de estiagem nas bilheterias. Woody Allen talvez seja o melhor exemplo: ele faz o que bem entende, trabalhando fora do esquema de estúdio, e o público tem a liberdade de gostar ou não.

Sentado no banco do pátio do hotel de pernas cruzadas, Shyamalan falou abertamente sobre o fato de ter se prendido demais aos próprios devaneios. E insistiu em afirmar que aprendeu com seus erros, traçando uma comparação com a nova biografia de David McCullough sobre os irmãos Wright, que, por acaso, levava consigo.

“As centenas de fracassos por que passaram, para eles, não eram fiascos. Eles caíam e diziam: ‘Ótimo, pelo menos agora sei o que deu errado’”.

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