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Um teatro sem espetáculo

Ator e diretor francês François Kahn vem a BH lançar livro sobre seu trabalho com o mestre polonês Jerzy Grotowski

Sex, 27/01/17 - 02h00
Parateatral. Kahn vai refletir sobre pesquisa de experiência com atores, sem um produto final | Foto: Maria Duarte / Divulgação

O francês François Kahn conheceu o diretor de teatro polonês Jerzy Grotowski (1933-1999), um dos principais nomes das artes cênicas no século XX, em 1970. Mas foi só em 1973 que eles viriam a trabalhar juntos, num projeto chamado Holiday. A experiência mudou para sempre o trabalho do ator e diretor francês no teatro – por mais que o que os dois tenham feito juntos ali não fosse, exatamente, teatral.

“O que isso quer dizer? Que se tratava do processo, e não do produto. Não havia mais espetáculo nem espectador. Só pessoas participando de um mesmo projeto. Ou seja, a presença de uns diante dos outros, sem mentira, sem máscara, sem manipulação”, explica Kahn.

Esse tipo de processo ficou conhecido como para-teatral ou cultura ativa. E é sobre ele que François Kahn fala neste sábado (28), a partir das 15h, no Memorial Minas Vale. Parte da programação do Verão Arte Contemporânea, o Sarau do Memorial vai contar ainda com o lançamento do livro “Le Jardin”, que o francês escreveu a partir de suas experiências com Grotowski, e a exibição do filme “The Vigil”, registro de um dos trabalhos do polonês.

“Tentei lembrar o que aconteceu comigo de 1973 a 1985, período de minha participação direta no trabalho do Teatro Laboratório, dirigido por Grotowski”, conta Kahn, sobre seu livro. Ele ressalta, porém, que não se trata de um diário, porque nunca fez anotações. “Foi uma simples revivescência desse período, uma reevocação que esclareceu alguns elementos fundamentais do trabalho”, conta.

Um desses esclarecimentos é a resposta à aparente contradição de um trabalho teatral que não resulta num espetáculo. Segundo Kahn, as qualidades básicas do trabalho parateatral permanecem também no palco, “no sentido mais teatral que se possa pensar”. Isso porque um dos pilares de Grotowski foi o tratamento do ator como um trabalho artesanal, “nutrido pelo training psicofísico em sua totalidade, sem separar o corpo da mente”. “A simplicidade e a precisão, por exemplo, ou a capacidade de brincar com as energias do corpo, da voz, da consciência, que são a mesma base do trabalho sobre si, também são qualidades fundamentais para o ator em cena”, explica.

Para quem acha isso difícil de entender, o documentário “The Vigil” é fundamental. Dirigido por Mercedes Gregory em 1979, o filme registra um evento criado e dirigido por Jacek Zmyslowski, um dos principais parceiros do polonês. Nele, um grupo de guias liderado por Jacek e um grupo de participantes convidados entravam em uma grande sala vazia e, por várias horas, aceitavam estar presentes não como espectadores, mas em modo ativo, e agir juntos, até chegar a um certo nível de plenitude. A esse ponto, “The Vigil” acabava e cada um saía do espaço – tudo isso sem falar.

“Sob essa aparência de grande simplicidade, desenvolvia-se uma ação extremamente complexa e difícil de analisar, que levava cada pessoa a um raro nível de consciência da própria presença psicofísica e de suas relações com os outros, fora da linguagem falada e das convenções sociais”, argumenta Kahn.

 

Agenda

O quê. Sarau do Memorial
Quando. Neste sábado (28), às 15h
Onde. Memorial Minas Vale – praça da Liberdade, s/nº, Funcionários
Entrada gratuita

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