Discussão

Uma parábola sobre limites

Juliana Lembi reflete sobre questionamentos morais da minissérie e sobre atos da controversa Ma Anand Sheela

Qua, 18/07/18 - 03h00
Juliana e os irmãos Way estão trabalhando em três novas séries | Foto: arquivo pessoal

Um dos principais motivos por trás do fenômeno boca a boca em que “Wild Wild Country” se tornou são os eventos inacreditáveis, quase inverossímeis, que surgem a cada episódio. O que parece ser a mera história de uma seita, de repente, envolve orgias, uma milícia armada, envenenamento de uma cidade inteira, espionagem e uma perseguição intercontinental.

Tudo isso chocou os diretores Chapman e Maclain Way e a produtora Juliana Lembi tanto quanto o público. Mas a mineira admite que o momento que a deixou mais surpresa e perturbada na história foi outro. “É quando a Sheela leva moradores de rua para lá e, depois, põe todos para fora simplesmente porque não puderam votar. Aquilo foi muito forte para mim”, revela.

De fato, a inescrutável Ma Anand Sheela se tornou a grande controvérsia e o grande destaque da minissérie – mais que o próprio Osho. Com suas expressões deliciosas e suas decisões bizarras e assustadoras, a braço direito do guru se tornou um meme e uma das principais personas da cultura pop em 2018. Uma mulher tão complexa e difícil que a própria Juliana, que conviveu com ela durante as entrevistas, acha complicado falar sobre ela.

“É difícil dar um referendo sobre uma pessoa. O que pudemos mostrar sobre a Sheela está na série”, suspira a produtora. A mineira reconhece que a idealizadora do Rajneeshpuram teve decisões controversas e questionáveis, mas como mulher, imigrante e latina nos EUA, ela sente uma grande empatia por Sheela, que, numa idade tão nova, se viu assumindo o controle de uma empresa global. “Acho impressionante a força dessa mulher. Mas também acho que, naqueles eventos, faltou uma compreensão dela sobre o ser humano, e acho justo que ela tenha servido parte da sua sentença”, reflete.

Juliana questiona ainda a natureza única da relação entre Sheela e seus asseclas e o Bhagwan, que eles consideravam um deus. Ela e os diretores chegaram a fazer uma série de inferências – muitas das quais não conseguiram provar e, por isso, não estão na série. Junto com essas dúvidas, existe muito material interessante que acabou ficando de fora – o que não significa, necessariamente, que possa haver uma nova temporada no futuro. “Talvez pudéssemos mostrar o que acontece com o Osho depois do Rajneeshpuram, as questões sobre a morte dele, se a Netflix quiser um dia. Mas não sei se existe esse interesse e se vamos fazer porque temos três outras séries em pré-produção”, comenta a produtora.

E um dos motivos que ela cita para não seguir esse caminho é que o que interessava a ela e aos irmãos Way em “Wild Wild Country” nunca foi contar a história do Osho, mas sim explorar os limites da democracia por meio daqueles eventos. Para Juliana, a minissérie questiona ainda os limites do respeito e da empatia, da espiritualidade e até onde se pode ir por acreditar que algo é maior que você. “Até queria ter, mas não sei se saí com respostas para essas questões. E é isso que faz um trabalho interessante, nossa natureza humana tão mutável: o fato de que um mais um necessariamente não te leva a dois”, filosofa.

Reação

Ma Anand Sheela mandou uma mensagem aos produtores após ver a série. “Ela ficou chocada como os dois lados ainda não concordavam e ficou agradecida ao universo ‘por ter me dado força quando fui atacada dos dois lados’”, diz Juliana.

---

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo mineiro, profissional e de qualidade. Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar.

Siga O TEMPO no Facebook, no Twitter e no Instagram. Ajude a aumentar a nossa comunidade.