Não renovou

Petrobras corta patrocínio de 13 projetos culturais

Apoiados pela estatal, os grupos mineiros Galpão e Corpo não foram afetados pela decisão da empresa neste momento

Por Bruno Mateus
Publicado em 16 de abril de 2019 | 03:00
 
 
O contrato de patrocínio do Grupo Galpão vence no fim deste ano Uarlen Valério - 30.05.2013

O que vinha sendo especulado desde fevereiro, quando o presidente Jair Bolsonaro (PSL) prometeu rever a política de patrocínios da Petrobras para a área da cultura, nesta segunda-feira (15) virou realidade. A estatal confirmou o corte de incentivo a 13 projetos, entre eles o Festival de Cinema de Brasília, o mais antigo do país, e o AnimaMundi, maior encontro de animação da América Latina.

A lista está em um documento enviado pela estatal à deputada federal Áurea Carolina (PSOL-MG) e ao seu colega de parlamento e de partido, Ivan Valente. Ambos haviam solicitado esclarecimentos à Petrobras sobre a intenção de reavaliar os contratos.

A notícia foi lamentada por quem faz a roda da cultura girar. Embora o Grupo Galpão não tenha sido atingido pela medida, o ator e membro do conselho executivo da companhia de teatro, Beto Franco, lamenta a decisão da empresa. “É muito triste para a cultura de um modo geral. Quem perde é a população e o país, que têm em sua identidade cultural sua maior expressão. Para o desenvolvimento civilizatório é muito ruim”, afirma.

Questionada, a Petrobras afirmou que seguirá realizando apoio a projetos culturais e esclareceu que o orçamento para patrocínios “sofreu redução à luz do Plano de Resiliência divulgado no dia 8/3/2019”. A nota diz ainda que projetos vigentes nas áreas de audiovisual e artes cênicas “estão com seus desembolsos em dia”.

A estatal esclarece que a medida foi tomada com objetivo de reposicionar a marca da empresa, com intenção de maior foco nos segmentos de ciência e tecnologia e educação, principalmente infantil”.

Em Minas Gerais, o Grupo Galpão ainda conta com um patrocínio de R$ 4,2 milhões, referentes a um contrato válido por dois anos – 2018 e 2019. Para o ano que vem, em um cenário repleto de incertezas, Beto Franco acredita no diálogo. Para o artista, a Petrobras deve ponderar sobre a importância de atrelar sua marca a projetos culturais. “É um ativo que ela tem, e que deveria valorizar”, diz.

Para se ter uma ideia da perda, a Petrobras, considerada a maior patrocinadora da cultura no país, destinou, em 2018, R$ 38 milhões para o setor, valor que fará uma falta incalculável. É o que diz a advogada e gestora cultural Sheilla Piancó, da Vivas Cultura e Esporte, responsável pela gestão do Cine Theatro Brasil, da Casa Fiat de Cultura e da Academia Mineira de Letras.

“A movimentação econômica que existe em torno do setor cultural gera muitos empregos. Para cada espetáculo realizado, há técnicos envolvidos, além de profissionais da limpeza, da bilheteria, da segurança. É preciso entender a cultura também como um bem econômico”, argumenta.

Momento é de repensar atuação do poder público

Segundo a advogada e gestora cultural Sheilla Piancó, que atua no setor há 12 anos, o acesso democrático à cultura é um direito garantido pela Constituição Federal. “Ela deixa muito claro que é responsabilidade do poder público gerar meios de promoção a esses direitos culturais”, avalia. Para a especialista, medidas como essa da Petrobras visam tirar as responsabilidades do Estado na garantia desses direitos.

O pesquisador da ONG Observatório da Diversidade Cultural e gerente de apoio às ações colegiadas da Secretaria Municipal de Cultura de BH, José Júnior, afirma que o corte tem um efeito simbólico muito forte. Para ele, a Petrobras e o governo federal deixam um recado de que vão concentrar a prioridades em outros setores que não a cultura. 

Júnior enfatiza que o papel do Estado deveria ser o de financiar diretamente a cultura com uma perspectiva estratégica, e não somente incentivar projetos via renúncia fiscal. Segundo o pesquisador, o cenário a curto e médio prazo é preocupante em todas as esferas do poder público: “Em termos de disponibilidade de recursos, será um período bastante delicado”. 

José Júnior afirma que o momento exige criatividade por parte dos empreendedores culturais no sentido de repensar a atuação do Estado não só como financiador, mas também como articulador de cultura.