Entrevista: Solanda Steckelberg

Secretária adjunta de Cultura de MG aposta em aproximação com turismo

Com experiência de mais de duas décadas em produção cultural e gestão, Solanda retoma sua participação no eixo das políticas públicas

Dom, 21/04/19 - 03h00
Solanda Steckelberg se diz otimista | Foto: Beatriz Scarpa/Divulgação

Você já foi presidente da Fundação Clóvis Salgado, diretora executiva da Fundação Municipal de Cultura, antes de assumir, agora, o cargo de secretária adjunta de Cultura do Estado. Quais são os principais planos que você vem traçando para esta gestão? Temos três grandes desafios na gestão. O primeiro deles é planejamento, o segundo é planejamento e o terceiro é planejamento. Estamos agora fechando o planejamento global do governo, e as diretrizes de cultura estão em fase de alinhamento. A nossa ação vai se basear em três grandes linhas e potencializar a vocação cultural de Minas Gerais, fortalecendo as identidades do Estado. E fomentar as cadeias produtivas da cultura é uma delas. Nós temos uma arrecadação comprometida com os desafios da responsabilidade fiscal, mas acredito muito no potencial da cultura para angariarmos parcerias. Outra grande diretriz será o aperfeiçoamento da gestão das atividades de cultura, colocando nesse arcabouço indicadores dos impactos sociais e econômicos. É importante considerarmos a cultura como base de desenvolvimento econômico e desenvolvermos novos meios de financiamento com o setor privado e com a sociedade. Eu tenho uma experiência incrível de captação de recursos com poesias físicas via Lei Rouanet. No ano passado, só em Belo Horizonte, consegui, por meio do contato com 4.000 pessoas, reunir cerca de R$ 14 milhões, o que é um orçamento robusto diante do nosso histórico. A maioria das pessoas não sabe da possibilidade de usar esse mecanismo, aplicando até 6% do seu próprio imposto de renda em projetos culturais, e eu quero dar uma atenção maior para isso. Precisamos desenvolver novos métodos para retomarmos esse crescimento. Muitas vezes, o problema não é só falta de dinheiro, é de gestão. 

Recentemente, o deputado Coronel Sandro (PSL) apresentou um projeto na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) para acabar com a Lei Estadual de Incentivo à Cultura. O que você pensa sobre isso? O governo de Minas Gerais não tem esse posicionamento e não concorda com esse projeto de lei, e nós temos certeza de que todos os deputados terão a sensibilidade de entender que a lei contribui para gerar emprego, renda, ativos de valor agregado para Minas Gerais. Eu, pessoalmente, vejo isso como algo surreal, porque nós sabemos do efeito multiplicador da Lei de Incentivo à Cultura e tenho certeza de que ela precisa ser reforçada, fortalecida. O Legislativo tem autonomia e tem a liberdade de propor o que bem entende, mas o debate tem que ser feito com a sociedade. Nós temos que construir isso coletivamente. 

Alguns proponentes contemplados no edital 2017, na categoria Fundo Estadual de Cultura, têm reclamado de atrasos no repasse de verbas. Há uma previsão de quando isso poderá ser resolvido? Foi liberado na última quarta-feira o repasse do ano passado. Nós estávamos com essa dificuldade, mas ela já foi superada. O Fundo é importantíssimo, e, neste ano, a prospecção foi de 35%, então nós vamos ter uma projeção de recursos com uma projeção de R$ 15 milhões a R$ 20 milhões. Ou seja, um montante maior do que o do ano passado, que foi de R$ 9 milhões. Estou bem otimista, porque esse é um mecanismo importantíssimo.

Esses recursos serão liberados a partir de quando? Eu acho que na semana que vem esses repasses vão começar a ser programados. Isso é muito importante porque, no meu entendimento, é necessário que esses recursos estejam liberados o mais rápido possível, porque isso significa geração de capital de giro para a sociedade como um todo. Ele é importante não só para a área de cultura, mas para o comércio e para o setor de serviços, traz uma vitalidade para a cidade. E o governo entende e sabe da importância disso, tanto que conseguiu se organizar e priorizou a liberação desses recursos. 

No mês passado, em Ouro Preto, a igreja Nossa Senhora do Rosário sofreu um incêndio. Existe alguma iniciativa estadual a fim de prevenir acidentes em outros equipamentos de Minas Gerais? Existe um projeto desenhado inclusive pelo Instituto Estadual do Patrimônio Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG), chamado Minas para Sempre, que contempla 80 igrejas e mais 15 museus geridos pelo Estado, de prevenção contra incêndios e contra roubos. Esse projeto está em fase de captação de recursos e é uma prioridade. 

Profissionais, artistas e especialistas da área de cultura vêm chamando atenção para um desmonte da área atualmente. Você concorda com essas visões? Em nível estadual, eu posso garantir que não. Os sinais são outros. O atual governo convidou uma equipe técnica para lidar com os desafios e as oportunidades, e seguimos planejando com objetivo e metas. Em quatro semanas desde que tomei posse, e o Marcelo Matte (secretário de Cultura) também, há oito semanas, nós conseguimos reduzir o corte previsto de 50% para 21% para as pastas de Cultura e Turismo. Nós conseguimos resgatar vários orçamentos, então aqui os sinais são outros. O governador, Romeu Zema, tem escutado, e nós temos um vice-governador, Paulo Brant, muito sensível e atento à cultura. Não vamos aceitar a extinção de nenhum órgão. Não há desmonte em Minas Gerais e, evidentemente, não só agora, mas sempre precisamos fazer ajustes. Temos desafios, sim, mas isso é muito diferente de desmonte. 

Como fazer para que a sociedade reconheça a importância da cultura? Nós precisamos pensar novos caminhos, e um em que acredito é a integração entre a cultura e o turismo, que historicamente vêm perdendo lugar. Há países, como a Colômbia, que têm traçado outras estratégias, diferentes de nós, e Minas Gerais está apostando nessa possibilidade também. Nós precisamos nos desafiar a experimentar isso e, quando você tem um corpo técnico dirigente como o que temos, que tem escuta e sensibilidade para isso, me faz crer que vai acontecer. Temos que fortalecer o entendimento de cultura como política pública estratégica e precisamos construir esse diálogo aberto com a sociedade.

E a situação da rádio Inconfidência, já que existe uma preocupação dos seus funcionários com as demissões? Desde 2013, há uma legislação que orientou uma política para o fim da faixa AM, então, do ponto de vista do ajuste tecnológico, talvez haja a necessidade de também fazer ajustes de pessoas. E nós temos agora duas únicas estratégias: uma é o plano de demissão voluntária, e a outra é a realocação dessas pessoas, contando inclusive com a competência dos técnicos da rádio Inconfidência que fazem falta em outros equipamentos do Estado. Se ainda assim as pessoas não quiserem migrar, será necessário passar por um processo jurídico para que elas sejam respeitadas em todos os seus direitos. Isso não quer dizer que a Inconfidência vai acabar, o Executivo não tem poder para isso. Mas não há como manter uma cadeia de produção quando se deixa de existir a tecnologia necessária para mantê-la. E isso vem sendo avisado desde 2013, quando foi determinada a migração de AM para FM. 

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